Título: EMBAIXADORES DE VENEZUELA E PERU BATEM BOCA NA OEA
Autor:
Fonte: O Globo, 05/05/2006, O Mundo, p. 32

Lima adverte sobre intromissão em eleições no continente

WASHINGTON. O governo peruano alertou a Organização dos Estados Americanos (OEA) de que se essa entidade não tomar providências urgentes, os demais países da América Latina que têm eleições este ano ¿não estarão livres de surpreendentes, insólitas e indesejadas intromissões como as que se produziram no Peru¿.

¿ A democracia pode entrar novamente em sérias dificuldades se forem permitidas, ou se prosperarem, atitudes como as que motivam a presente intervenção ¿ acrescentou o embaixador do Peru na OEA, Fernando de la Flor, referindo-se ao que definiu como intromissões do presidente Hugo Chávez, da Venezuela, no processo eleitoral peruano.

Esse alerta do diplomata, feito em meio a uma enérgica denúncia das atitudes do vizinho, provocou uma irada resposta do embaixador venezuelano na OEA, Jorge Valero:

¿ O nosso governo tem o direito e o dever de responder às agressões que se lançam contra o nosso processo revolucionário e nosso presidente ¿ disse ele, numa acalorada sessão do Conselho Permanente da OEA, em que ambos os diplomatas argumentaram com dedo em riste.

O habitual clima de serenidade das reuniões daquele grupo foi rompido por uma ríspida troca de palavras entre ambos:

¿ Permitam-se falar de forma clara e firme. Como diria um ilustre pensador peruano do século passado, a gravidade dos fatos exige que rompamos o pacto infame de falar à meia voz ¿ disse De la Flor.

Ele definiu como ¿uma intromissão externa flagrante e sem antecedentes¿, além de ¿inaceitável¿, o fato de Chávez ter declarado publicamente que se os eleitores peruanos escolherem o candidato Alan García no segundo turno das eleições ¿ em vez do seu preferido, Ollanta Humala ¿ a Venezuela romperia relações com o Peru.

¿ É fundamental denunciar a participação direta, flagrante e sem atenuantes de um chefe de Estado de um país alheio ao Peru. A obrigação dos Estados não é a de se imiscuir direta ou indiretamente nos assuntos internos ou externos de outro, com o propósito de modificar a vontade deste último e conseguir subordinar o exercício de seus direitos soberanos ¿ disse o diplomata.

Furioso com a denúncia, o seu colega venezuelano disse que o Peru estava tentando ¿dar uma dimensão multilateral a um assunto de caráter estritamente bilateral¿. Ele reconheceu tacitamente a interferência de Chávez, mas a justificou:

¿ O governo bolivariano só respondeu, de maneira firme e categórica, quando a dignidade do povo venezuelano e as suas instituições democráticas foram agredidas ¿ disse ele.

Valero lembrou em seguida que Chávez foi definido ¿como um sem-vergonha e um elemento desestabilizador na região¿. E que políticos peruanos afirmaram que o presidente venezuelano era uma ameaça à região.

Ao procurar apaziguar, José Miguel Insulza, o secretário-geral, acabou dando a impressão de que a OEA não tem condições de mediar desavenças entre vizinhos, embora tenha sido criada também para isso.

Ele disse que estava ¿seriamente preocupado com o aumento da tensão nas relações bilaterais de vários países membros da OEA¿. Mas evitou entrar no mérito do conflito entre Peru e Venezuela, aparentemente por não contar com ferramentas para isso. Insulza propôs apenas que fosse estudada a criação e a implementação de algo que seja capaz de resolver problemas bilaterais:

¿ Devemos refletir sobre um mecanismo através do qual possamos solucionar as controvérsias entre nossos países ¿ disse ele.