Título: VOCAÇÕES
Autor: D. EUGENIO SALES
Fonte: O Globo, 06/05/2006, Opiniao, p. 7

No 4º Domingo de Páscoa, em toda a Igreja se celebra o Dia Mundial de Oração pelas Vocações. Este é o 43º ano. O povo de Deus é convidado a refletir sobre o tema da vocação no Ministério da Igreja.

São Paulo diz que ¿Deus nos escolheu antes da constituição do mundo (...) predestinou-nos para sermos seus filhos adotivos por meio de Jesus Cristo (Ef 1,3-5)¿. Em sua mensagem, o Papa Bento XVI comenta: ¿A perspectiva é verdadeiramente fascinante: somos chamados a viver como irmãos e irmãs de Jesus, a sentirmo-nos filhos e filhas do mesmo Pai.¿ Para entender esse chamado do Pai não é necessário ser perfeito. Adverte o Papa que a autoconsciência do seu pecado permitiu que o filho pródigo (cf. Lc 15,11-32) empreendesse o caminho do regresso e que experimentasse, assim, a reconciliação com o Pai. A fragilidade e os limites humanos não representam um obstáculo, ao contrário, contribuem para nos tornar cada vez mais conscientes de que temos necessidade da graça redentora de Cristo. Sobre o assunto assim se expressa São Paulo: ¿Prefiro gloriar-me das minhas fraquezas, para que habite em mim a força de Cristo (2 Cor 12,9).¿

Nesse amor do Pai está a explicação do surgimento das vocações na Igreja. Desde seu início aos nossos dias, há cristãos que consagram toda sua existência à causa do Reino.

O Concílio Vaticano II ensina que ¿os seguidores de Cristo, chamados por Deus e justificados no Senhor (...) são feitos, pelo batismo da fé, verdadeiramente filhos e participantes da natureza divina e, por conseguinte, realmente santos¿ (¿Lumen Gentium¿, 40). No decorrer dos séculos, a vida da Igreja tem sido marcada pela presença do chamado de Deus, para que não faltem os que, abandonando qualquer outra ocupação, dediquem-se totalmente à celebração dos sagrados ministérios, à pregação do Evangelho e à pastoral.

Na exortação apostólica ¿Pastores dabo vobis¿ afirma: ¿O sacerdote tem como referência fundamental a relação com Jesus Cristo Cabeça e Pastor. Ele, de fato, participa de modo específico e autorizado na `consagração e unção¿ e na `missão¿ de Cristo (cf. Lc 4,18-19) (nº 16)¿. As preces, no Dia Mundial de Oração pelas Vocações sacerdotais e religiosas, têm por objetivo fortalecer a vida cristã. O sacerdote não é um líder político ou social. A correção das injustiças, nesse campo, decorre de uma existência segundo os ensinamentos de Jesus. Ao se encontrar com os bispos de Gana, África, a 23 de abril de 2006, o Papa Bento XVI disse: ¿O sacerdócio não deve ser considerado como um caminho para melhorar o nível social ou de vida.¿

Havendo trabalho vocacional, não faltam vocações em número suficiente para prover às necessidades da Igreja. No dia 1º de maio, o cardeal D. Eusébio Scheid, arcebispo do Rio de Janeiro, celebrou o 25º aniversário de sua ordenação episcopal. Entre as celebrações houve a ordenação de 25 diáconos para servir à Arquidiocese. Há anos, na Quinta-feira Santa, por ocasião da Bênção dos Santos Óleos, quando ainda era o arcebispo do Rio, propus, ao clero presente, a intensificação do trabalho vocacional já existente e coloquei como meta atingir a ordenação a cada ano de uma média de 10 a 15 presbíteros. O objetivo foi não somente alcançado, mas ultrapassado. Em 24 de junho de 1995 ordenei para a arquidiocese, de uma só vez, 22 presbíteros. As exigências da Igreja foram observadas e a perseverança no sagrado ministério é satisfatória.

O número de ordenações sacerdotais vem se mantendo sempre acima da meta proposta.

Não há falta de vocações. Um trabalho vocacional nesse campo, fundamentado na oração, surte sempre efeito. Deus supre às necessidades de sua Igreja. O que ocorre é a existência de ouvidos surdos ao chamado, esquecimento em divulgar o convite de Jesus para servir e desobediência às diretrizes dadas pelo sucessor de Pedro.

A celebração do Dia Mundial de Oração pelas Vocações, este ano, tem por lema ¿Vocação no Ministério da Igreja¿. Em um mundo onde predomina uma luta indiscriminada pelo prazer, pelo dinheiro, ainda há quem livremente decida abraçar o celibato e renunciar a muitas aspirações humanas, mesmo lícitas aos demais fiéis. Querem, assim, servir de sinal de uma outra realidade. E, desembaraçados de cuidados temporais, podem se dedicar, em tempo integral, ao Reino de Deus. Certamente serão incompreendidos e, como sua vida é uma exprobação para alguns, recebem insultos e calúnias. Após a oração e o auxílio do Alto, uma grande e significativa fonte de vocações e perseverança, sem dúvida, é o exemplo dos que se consagram ao serviço de Deus de modo verdadeiramente evangélico.

D. EUGENIO SALES é cardeal-arcebispo emérito da Arquidiocese do Rio.

No mundo onde predomina uma luta pelo prazer, ainda há quem opte pelo celibato