Título: PARTO DIFÍCIL NA REDE PÚBLICA
Autor: Daniel Engelbrecht
Fonte: O Globo, 09/05/2006, Rio, p. 16

Relatório mostra problemas em maternidades; uma delas tinha ratos e baratas na cozinha

Enquanto mães e bebês repousam em macas nos corredores da Maternidade Alexander Fleming, em Marechal Hermes, e outras permanecem internadas em cadeiras na Carmela Dutra, no Lins de Vasconcelos, 16 leitos estavam vagos quarta-feira passada na Maternidade Oswaldo Nazareth, na Praça Quinze. A falta de integração da rede municipal, que se repete em nível estadual e federal, foi um dos problemas constatados pela Comissão de Saúde da Câmara de Vereadores, numa série de vistorias realizadas nos últimos dois meses em 14 unidades públicas. O mesmo trabalho foi realizado pelo vereador Carlos Eduardo (PPS) há um ano, dando origem a uma denúncia enviada ao Ministério Público estadual.

¿ Um ano depois, o que constatamos é que, no geral, a situação piorou. Algumas maternidades tiveram melhoras pontuais, mas a maioria encontra-se em estado caótico. Muito ainda precisa ser feito, principalmente pela prefeitura e pelo governo do estado ¿ afirma o vereador.

O relatório feito a partir das vistorias, intitulado ¿O difícil direito de nascer¿, aponta a superlotação, as deficiências de recursos humanos e de equipamentos e a falta de integração entre as maternidades como os principais problemas. O documento será entregue esta semana ao Ministério Público.

Partos teriam sido feitos até na escada

A superlotação em algumas maternidades chama a atenção porque, segundo o vereador, existem unidades funcionando com leitos vagos. Ele cita como maternidades que estão constantemente superlotadas a Carmela Dutra, a Alexander Fleming, a Fernando Magalhães, em São Cristóvão, e a do Hospital Rocha Faria, em Campo Grande, enquanto outras, como a Oswaldo Nazareth e as dos hospitais Pedro II, em Santa Cruz, e do Andaraí têm leitos vagos.

Na Maternidade Alexander Fleming foram encontrados ratos e baratas na cozinha e vazamento de esgoto perto de um bebedouro. Na Carmela Dutra, Carlos Eduardo descobriu grávidas fazendo revezamento de leitos durante a noite devido à superlotação. Nas maternidades dos hospitais estaduais Albert Schweitzer, em Realengo, e Pedro II, o vereador recebeu denúncias de membros do corpo clínico de que partos teriam sido feitos nas escadas. Num deles, no ano passado, um bebê teria caído de cabeça no chão.

Outro dado grave é a falta de pagamento, pelo governo estadual, dos leitos de UTI neonatal contratados na iniciativa privada como parte de um termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado com o Ministério Público estadual em 2000. Segundo o vereador, só restam 30 desses leitos.

¿ O TAC previa a contratação de 200 leitos. Foram contratados 70, o que aliviou um pouco a superlotação da rede pública até meados de 2003. Entretanto, por falta de pagamento, a iniciativa privada vem retirando os leitos que alugava ¿ observa Carlos Eduardo.

Estado nega falta de pagamento

A Secretaria estadual de Saúde contesta a afirmação. Segundo o órgão, o número de leitos de UTI neonatal contratados diminuiu porque houve queda na demanda. O órgão acrescenta que honrou seus compromissos com as clínicas particulares e que são os municípios, responsáveis por parte do pagamento, que estão devendo.

Quanto aos problemas na rede estadual, o superintende de Saúde, Ismar Bahia, concorda com alguns pontos, mas faz ressalvas. Segundo ele, a superlotação na maternidade do Hospital Rocha Faria se deve ao fato de a Secretaria municipal de Saúde não ter qualquer unidade na Zona Oeste para diluir a demanda. Já os problemas de manutenção em aparelhos são isolados, afirmou.

Bahia diz ainda que partos feitos nas escadas dos hospitais Albert Schweitzer e Pedro II são raros, assim como a recusa a receber pacientes. O superintendente nega que haja problemas nos elevadores das duas unidades, que, de acordo com ele, estão sendo modernizados. Sem dar um número exato, ele acrescenta que a taxa de ocupação da maternidade do Pedro II é bem superior a 40%, como consta no relatório. A secretaria reconhece o déficit de profissionais, principalmente anestesistas, e informa que está preparando uma proposta de concurso público.

Na rede municipal, a coordenadora da Área Técnica de Saúde da Mulher, Criança e Adolescente, Maria Auxiliadora Mendes Gomes, diz que os relatórios do vereador apontam algumas dificuldades reconhecidas pela prefeitura, principalmente em relação à superlotação das maternidades, mas têm também uma série de informações inverídicas. Ela cita como exemplos dois pontos: um sobre a obsolescência do ultra-som da Maternidade Fernando Magalhães e outro sobre a existência de leitos vagos na Oswaldo Nazareth.

¿ Há seis meses a Fernando Magalhães recebeu dois equipamentos novos. Já a Oswaldo Nazareth não tem ociosidade de leitos ¿ garante. ¿ De maio de 2005 para cá, a situação melhorou, ao contrário do que diz o vereador.

Auxiliadora afirma que alguns problemas apontados já foram solucionados e outros estão prestes a ser, como a deficiência de recursos humanos e de equipamentos.

¿ Os problemas de pessoal estão restritos a algumas funções e serão minimizados com o retorno de funcionários municipais que estão em unidades federais. Também não reconheço grave deficiência de recursos tecnológicos. Vários equipamentos foram adquiridos e outros estão em processo de aquisição ¿ afirma.

As sete maternidades municipais fazem mais de 35 mil partos por ano ¿ 50% da rede do Sistema Único de Saúde ¿ e prestam 70% dos atendimentos nos casos de gravidez de risco.