Título: Amorim: nacionalização foi `atitude adolescente¿
Autor: Henrique Gomes Batista
Fonte: O Globo, 10/05/2006, Economia, p. 29

Chanceler afirma que Brasil nunca usará `política do porrete¿ e critica uso do Exército pelo governo Evo Morales

BRASÍLIA. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou ontem no Senado que a decisão do governo Evo Morales de nacionalizar as atividades da Petrobras na Bolívia foi uma ¿atitude de adolescente¿. Ainda assim defendeu uma solução negociada para a crise com o país vizinho, que considerou instável. O chanceler disse que as discussões serão longas e difíceis, mas que esse é o melhor caminho pois bravatas poderiam provocar uma reação irracional da Bolívia.

¿ A política brasileira nunca será a do porrete, e sim a da boa vizinhança. Temos de lembrar que a Bolívia é um parceiro estratégico, é a nossa maior fronteira terrestre, faz divisa com quatro estados ¿ afirmou Amorim, fazendo uma referência à ¿política do porrete¿ de Theodore Roosevelt, presidente americano no início do século passado.

Ele disse que a integração com a Bolívia ocorrerá ¿ou por bem, por meio de comércio, tecnologia e cooperação, ou por mal, com guerrilha, narcotráfico e contrabando¿. Amorim disse ainda que a nacionalização era esperada desde 2004, quando foi aprovada em referendo, e que provavelmente qualquer presidente faria isso, talvez de outra forma, sem recorrer ao Exército ¿ que ele criticou.

Amorim lembrou que nos últimos três anos a Bolívia teve quatro presidentes. Ele ressaltou que a política de gás e petróleo foi fato central nessas trocas e que volta a dominar, às vésperas da Assembléia Constituinte naquele país.

¿ Se entrássemos em uma escalada de retaliações, estaríamos despertando ações irracionais ¿ disse Amorim, ressaltando que não há risco de desabastecimento e que serão negociados a nacionalização das atividades da Petrobras na Bolívia e o contrato de fornecimento de gás. ¿ Há três pontos favoráveis à negociação: a garantia do fornecimento, a abertura para as negociações e a possibilidade de indenização prevista na legislação boliviana.

O chanceler acredita que o Brasil será indenizado pela nacionalização de seus ativos e que a possibilidade de aumento no preço do gás será negociada ou resolvida separadamente, nem que seja na Corte Arbitral de Nova York.

Amorim também explicou que o Brasil está acompanhando os proprietários de terra brasileiros na Bolívia. Segundo ele, há agricultores que plantam 40% da soja e representam 60% das exportações bolivianas deste grão; e, na fronteira, pequenos extrativistas e posseiros. Na província de Pando há cerca de 2 mil a 5 mil brasileiros.

¿ Pelo que sabemos, a reforma agrária boliviana deve atingir as terras improdutivas e as que não estão com a legalidade em dia, ou seja, não vai atingir os que plantam soja ¿ disse, reafirmando que esses brasileiros terão todo o apoio.

Senadores criticam Lula e temem novas crises

Com relação aos demais, Amorim lembrou que o Brasil está tendo uma postura positiva com os cerca de 70 mil bolivianos em situação irregular no Brasil e espera reciprocidade. Ele preferiu não falar sobre o que o Brasil deve fazer caso os brasileiros da fronteira sejam expulsos da Bolívia.

Apesar da defesa da negociação, os senadores criticaram a posição do governo. Jefferson Perez (PDT-AM) defendeu um voto de censura a Lula, afirmando que ele agiu com tibieza no caso. Amorim afirmou que muitos dos que defendem uma resposta enérgica do governo hoje tiveram reação dúbia na negociação da Alca, por exemplo, numa referência ao governo Fernando Henrique.

Os senadores da oposição disseram temer que a Bolívia tente reaver o Acre (comprado pelo Brasil) ou que o Paraguai pare de fornecer ao Brasil energia elétrica, hipóteses descartadas por Amorim. Mas ele lembrou que os problemas externos devem aumentar, já que a economia brasileira está se globalizando, sobretudo com o avanço de empresas nacionais em outros países.

PETROBRAS RESISTE À NOMEAÇÃO FEITA PELA BOLÍVIA, na página 30