Título: VARIG: DÍVIDA FICA COM COMPRADOR, DIZ PARECER
Autor: Geralda Doca, Mirelle de França, Erica Ribeiro
Fonte: O Globo, 11/05/2006, Economia, p. 38

Procuradoria-Geral da Fazenda alerta sobre débito com cofres públicos. BNDES anuncia empréstimo-ponte

BRASÍLIA e RIO. Um parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) que ficou pronto ontem ¿ um dia após a aprovação do plano de recuperação da Varig pela assembléia de credores ¿ alerta que há risco de sucessão de dívidas nas duas propostas de venda da companhia a serem submetidas a leilão. Segundo uma alta fonte do órgão, isso significa que o comprador da Varig será responsabilizado por débitos com os cofres públicos no futuro.

Essa é uma das principais preocupações dos potenciais investidores, sobretudo as companhias aéreas concorrentes nacionais. A avaliação da PGFN, que decidiu se antecipar à consulta de prováveis investidores, já foi informada ao juiz da 8ª Vara Empresarial do Rio, Luiz Roberto Ayoub, que cuida do processo de recuperação judicial, e poderá inviabilizar o leilão de venda de ativos da Varig, a ser realizado dentro de 60 dias.

Um integrante do órgão explicou que as propostas aprovadas não estão de acordo com a Lei de Falências, que prevê a venda de uma unidade produtiva, uma filial ou mesmo parte dos ativos e não a divisão da empresa em uma parte boa e outra podre, que herdará os passivos.

¿ O que eles propuseram é vender falsos ativos, como horários de vôo e os espaços em aeroportos, que não pertencem à companhia ¿ explicou a fonte da PGFN.

Segundo essa fonte, empresas que tentaram a mesma saída, como a Rede Ferroviária Federal (RFFSA), estão sendo derrotadas na Justiça. Mesmo que o plano da Varig vá adiante, a PGFN promete executar os débitos relativos ao Fisco e ao INSS, que correspondem à metade do passivo de R$7 bilhões da companhia.

Antes da divulgação desse parecer, o BNDES informou que poderá desembolsar até US$166,6 milhões aos investidores interessados em emprestar recursos à Varig até o leilão. O financiamento do BNDES pode cobrir até dois terços do valor de um empréstimo-ponte de US$250 milhões: o restante terá de sair do próprio bolso do investidor ou dos interessados em injetar capital de giro na Varig. Se mais de um atender às condições, o financiamento será dividido. O banco vai receber propostas até segunda-feira.

Marcelo Gomes, diretor da consultoria Alvarez & Marsal, empresa responsável pela reestruturação da Varig, disse ontem que, dentro do cronograma divulgado pelo BNDES, espera-se saber já na terça-feira quantos serão os qualificados.

¿ Hoje (ontem), enviamos ao BNDES os nomes das empresas interessadas em obter o empréstimo-ponte. São mais de dez e este número poderá ser ainda maior, o que mostra o interesse do mercado na operação ¿ disse Gomes. ¿ A expectativa é que o crédito esteja no caixa da companhia até o fim da próxima semana.

Dilma apóia idéia de obrigar BR a flexibilizar cobranças

Os recursos são necessários para o capital de giro da Varig até o leilão. Ontem, ela correu o risco de não levantar vôo depois de meio-dia, e o problema pode se repetir hoje. Como a companhia não pagou o suficiente para ter combustível durante todo o dia, foi informada pela BR Distribuidora de que o abastecimento seria cortado caso a situação não fosse regularizada. A Varig entregou um cheque para garantir o fornecimento do querosene até o meio-dia de hoje. O restante ainda depende de caixa.

Já a Infraero enviou ontem intimação para que a companhia quite em 24 horas a dívida de R$8,5 milhões referente a tarifas de embarque. E o Banco do Brasil avisou que não voltará a descontar recebíveis da companhia (venda de bilhetes).

Ao todo, a Varig deve aos fornecedores públicos R$693 milhões em valores atrasados, que foram repactuados no plano de recuperação. De despesas correntes, por dia a Varig tem que pagar só à BR entre R$1,8 milhão e R$2 milhões.

Com isso, a Justiça do Rio voltou a cogitar a possibilidade de obrigar a BR, principalmente, a flexibilizar as condições de pagamento para a empresa, o que tem o apoio da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Integrantes do próprio governo e especialistas do setor vêem com descrença os modelos de venda.

¿ É preciso analisar com cuidado se o modelo é atraente para o mercado. O ônus com a obrigação de contratar funcionários e dar continuidade aos contratos de leasing é enorme ¿ disse o o advogado Geraldo Vieira, especialista em aviação civil.