Título: GASODUTO NO BRASIL SEM PETROBRAS
Autor: Soraua Aggege, Deborak Berlinck e Eliane Oliveira
Fonte: O Globo, 13/05/2006, Economia, p. 36

Amorim rebate comentário de ministro: sem empresa, obra não existe

LA PAZ, VIENA e RIO. O ministro boliviano de Hidrocarbonetos, Andrés Soliz Rada, causou mal-estar ontem ao afirmar que a Bolívia não vai participar do projeto do Gasoduto do Sul ¿ impulsionado principalmente por Brasil, Venezuela e Argentina ¿ se a estatal brasileira Petrobras fizer parte dele. Isso porque, segundo Soliz, a Petrobras seria uma empresa transnacional. Ele afirmou que, enquanto a estatal brasileira ¿tiver como sócios majoritários essas grandes multinacionais¿, o governo Evo Morales não permitirá a participação da Bolívia.

¿ Para que o Gasoduto do Sul funcione é preciso que seja executado por empresas estatais. Há um grave problema com a Petrobras, porque 60% de suas ações estão em mãos de transnacionais. Vamos investir enormes somas de dinheiro para beneficiar as sócias transnacionais da Petrobras? ¿ disse Soliz ontem no Congresso boliviano.

Em Viena, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, disse que, sem a participação da Petrobras, não existirá o Gasoduto do Sul, que sairia da Venezuela e chegaria à Argentina passando pelo Brasil.

¿ Se a Petrobras não participar, não haverá Gasoduto do Sul. Ou dará uma volta tão grande, que será o Gasoduto do Oeste ¿ ironizou Amorim.

O chanceler voltou a falar da indignação brasileira com as declarações de Morales contra a Petrobras. Segundo ele, se os contratos forem ilegais porque não foram aprovados pelo Congresso, é um problema exclusivo da Bolívia:

¿ Isso não é responsabilidade da Petrobras. Não é a Petrobras que tem de mandar contrato para o Congresso da Bolívia. A responsabilidade era dos governantes bolivianos, que estavam lá. Se eles fizeram alguma coisa errada, eles que respondam por crime de responsabilidade, não a Petrobras.

Amorim ressaltou ainda que há confusão quanto às indenizações das empresas petrolíferas. Ele supõe, por declarações de outros integrantes do governo boliviano, que está vetada a possibilidade de indenização pelo direito de exploração do gás, e não pelos equipamentos e instalações das empresas.

As declarações de Soliz também surpreenderam o mercado brasileiro. Segundo analistas, não tem cabimento afirmar que 60% da Petrobras estão nas mãos de investidores estrangeiros. Eles explicam que a União tem 55,7% das ações ordinárias, o que faz da companhia uma empresa estatal do governo brasileiro. A participação de estrangeiros na Petrobras, segundo dados da própria empresa, é de 30,3% (ações ordinárias) e 39,8% (capital total).

O analista Luiz Caetano, do Banif Primus, considerou descabidos os comentários. Segundo ele, embora parte do capital total da empresa esteja nas mãos do mercado (entre estrangeiros e brasileiros), esses investidores não têm ingerência nem poder de decisão sobre a estatal:

¿ Quem tem o controle da Petrobras é quem tem a maior parte das ações ordinárias e com direito a voto. E isso quem tem é o governo federal.

Para o analista Luiz Otavio Nunes, da Agora Senior Corretora de Valores, o comentário foi ¿uma estupidez¿. Segundo ele, toda empresa com ações negociadas no mercado pode ter estrangeiros como investidores, sem que isso signifique alteração no controle, que, no caso da Petrobras, é do governo federal.