Título: PF IDENTIFICA BRAÇO DE `SANGUESSUGAS¿ NO RIO
Autor: Alan Gripp
Fonte: O Globo, 14/05/2006, O País, p. 10

Emendas de R$2,3 milhões dos deputados José Divino e Paulo Baltazar abasteceram entidade criada em 2003

BRASÍLIA. A Polícia Federal acredita ter identificado o braço no Rio de Janeiro do esquema de corrupção que começou a ser desmontado na Operação Sanguessuga. As investigações revelam que integrantes da quadrilha que fraudava licitações em vários pontos do país atuavam no estado em parceria com o Instituto Brasileiro de Cultura e Educação (Ibrae), uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), que tem estrutura similar à de uma ONG. A entidade foi criada para desenvolver projetos de educação, mas levantamento feito pelo GLOBO mostra que o Ibrae recebeu recursos até para a compra de ambulâncias.

O dinheiro que abastece a entidade foi conseguido por de emendas ao Orçamento de 2005 de dois deputados fluminenses citados no escândalo: José Divino (PRB) e Paulo Baltazar (PSB). Juntos, os dois já arrecadaram R$2,3 milhões para o Ibrae e conseguiram empenhar (compromisso de pagamento) outros R$2,4 milhões. Grande parte desse dinheiro se refere a outra emenda de Divino, pastor evangélico, de R$2,3 milhões. E novamente nada tem a ver com educação: está na fila de pagamento do Fundo Nacional de Saúde, com a vaga descrição ¿aquisição de equipamento e material permanente¿.

Esquema implantado em sete municípios fluminenses

O Ibrae entrou na mira da PF após aparecer em diversas ligações grampeadas com autorização judicial. Nas escutas feitas pela PF, fica claro que a máfia comandada pelos donos da empresa Planam, com sede no estado de Mato Grosso, usou os serviços do Ibrae para implantar o esquema em pelo menos sete municípios do Rio: Nova Iguaçu, Volta Redonda, São Gonçalo, Belford Roxo, São João de Meriti, Mendes e Miracema.

Nas conversas, os donos da Planam, Luiz Antônio Vedoin e Ronildo Medeiros, incriminam um dos diretores do Ibrae, identificado apenas como Nilton. O relatório da PF diz que ¿Ronildo e Luiz Antônio não deixam dúvidas a respeito do envolvimento de Nilton no favorecimento aos seus negócios¿ e diz que esse favorecimento ocorre mediante pagamento de propina. ¿Tais pagamentos não são eventuais, constituindo-se, na verdade, numa rotina no relacionamento dos três¿, diz o relatório.

Em outro diálogo, os donos da Planam, presos semana retrasada pela PF, dizem que Nilton é o dono ¿de fato¿ do Ibrae. Num dos trechos, Ronildo chega a dizer que está devendo a Nilton ¿a metade de Nova Iguaçu e Volta Redonda¿. Luiz Antônio, então, diz que se Ronildo não pagar o que deve a Nilton não vai mais conseguir ¿vender ao Ibrae¿. E citam uma emenda de R$2,3 milhões, que coincide com a proposta feita por Divino.

O Ibrae foi criado em 2003 e já no ano seguinte conquistou os deputados. A Oscip recebeu, em 2004, mais de R$3 milhões em emendas, que começaram a ser pagas em 2005. No dia 1º de novembro daquele ano, o instituto recebeu R$240 mil do Fundo Nacional de Saúde. No mês seguinte, em 5 de dezembro, outro depósito no mesmo valor, como mostram ordens de pagamento às quais O GLOBO teve acesso.

O dinheiro, fruto de uma emenda de Divino, foi usado para comprar ambulâncias. A compra de unidades móveis com preços superfaturados foi a principal fonte de recursos do esquema, segundo a PF. A Planam pagava por emendas, montava empresas de fachada para simular concorrência e embolsava parte dos recursos.

Outra emenda destinada ao Ibrae, no valor de R$43,5 mil, cujos recursos também já foram liberados, chama atenção por ter como objetivo financiar um projeto voltado para a educação de pessoas portadoras de necessidades especiais. No site do Ibrae, este tipo de projeto não é relacionado entre as atividades desenvolvidas pelo instituto.

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