Título: PARENTES DAS VÍTIMAS TEMEM REPRESÁLIA
Autor:
Fonte: O Globo, 15/05/2006, O País, p. 3

Temos que reagir. Eles têm armas, nós também¿, diz investigador da polícia

SÃO PAULO. O agente penitenciário Antônio Bonilha falava indignado sobre o assassinato do irmão, Amauri Bonilha, e da cunhada, Cecília Maria da Silva, também carcereiros, durante o enterro do casal no cemitério do Araçá, ontem de manhã, quanto foi bruscamente repreendido pela esposa:

¿ Você está dando entrevista? Não se esqueça de que o sistema continua sendo muito perigoso. Fique aí, colocando a cara na TV, para ver o que acontece.

Bonilha imediatamente encerrou a entrevista e saiu da mira das câmeras de TV.

O episódio ilustra a sensação de medo entre parentes, amigos e colegas dos agentes penitenciários e policiais mortos desde sexta-feira.

¿Com certeza, muita gente não gostava deles, assim como não gosta de mim. Sempre foi perigoso trabalhar no sistema, mas agora está muito pior¿ disse Antônio.

Seu irmão, de 49 anos, e a cunhada, de 43, estavam no bar de um dos filhos de Amauri, na Vila Maria, por volta da 1h de sábado, quando o local foi invadido por criminosos que abriram fogo. Além do casal morto, o ataque deixou um freguês do bar ferido.

Chefe dos investigadores quer vingar colegas

O medo também predominou no enterro de Daniela de Souza Mendes, 23 anos. Ela foi metralhada juntamente com o namorado, o policial civil Paulo José da Silva, de 35, na madrugada de sábado. Eles levavam três vizinhos (entre eles uma grávida de oito meses) para o hospital de Santo Amaro, quando foram interceptados por quatro homens armados com metralhadoras em duas motos. Os outros três ocupantes do Santana de Paulo ficaram levemente feridos.

Durante o enterro de Daniela, no cemitério Parque das Cerejeiras, sua família se esquivava das câmeras, com medo de ser reconhecida pelos criminosos. A mãe dela chegou a desmaiar durante o sepultamento. Segundo amigos, Daniela desconfiava de que estava sendo seguida nos últimos dias e chegou a falar sobre o assunto com o namorado, que desconversou.

¿ Com certeza, os assassinos sabiam que ele era policial e o seguiram¿ disse o investigador João Tibério, colega de Paulo no 85º Distrito Policial.

No enterro de Paulo, o medo deu lugar à revolta. Ele foi sepultado no mausoléu dos heróis da Polícia Civil, no cemitério de Campo Grande. Segundo a Associação dos Funcionários da Polícia Civil do Estado de São Paulo, o enterro, que custou R$2 mil, foi pago por amigos. Paulo ganhava cerca de R$1.200 mensais.

Antes do sepultamento, a irmã do policial, Célia Maria Parra, fez um desabafo:

¿ Cadê os defensores dos direitos humanos para consolar nossa família? Bandido pode tudo. Cidadão não pode nada.

A mãe de Paulo, Maria Bernardo da Silva, de 60 anos, chegou a passar mal e foi socorrida por amigos. Os dois filhos do policial, um menino de 7 anos e uma menina de 1, foram levados pelas mães ao cemitério. O som do choro só foi abafado pela homenagem feita pelos colegas de Paulo no 85º DP. Eles descarregaram suas pistolas 9mm, disparando para o chão, e prometeram vingança:

¿Temos que reagir. É isso que a sociedade espera. Eles têm armas, nós também. Agora vamos medir forças¿ disse o chefe dos investigadores do 85º DP, Oscar Dias.