Título: `O PCC É UM PERIGO PARA A SOBERANIA¿
Autor: Elenilce Bottari e Fábio Gusmao
Fonte: O Globo, 16/05/2006, O País, p. 10

Inspetora vê diferenças entre ações da maior facção criminosa de SP e as das quadrilhas do Rio

A inspetora Marina Maggessi, da Delegacia de Repressão a Entorpecentes do Rio de Janeiro (DRE-RJ), diz não acreditar que as facções criminosas do Rio repitam a situação enfrentada por São Paulo. Para ela, diferentemente da organização paulista, as do Rio se dedicam quase exclusivamente à venda de drogas e evitam confrontos que prejudiquem o negócio. A inspetora critica as autoridades de São Paulo pela forma como tratam os presos do estado.

Há diferença entre as facções criminosas do Rio e de São Paulo? O que ocorreu em São Paulo poderia se repetir no Rio?

MARINA MAGGESSI:As facções são completamente diferentes. Aliás, o Rio é diferente de todos os estados brasileiros. Enquanto a organização criminosa de São Paulo seqüestra e assalta bancos, as facções do Rio estão interessadas em vender drogas. O lucro, neste caso, é inversamente proporcional à violência. A paulista, além de ser facção de penitenciária, é extremamente politizada. Eles tiveram até candidato a deputado federal. Já os três comandos do Rio têm outra característica. O discurso em São Paulo é voltado para a massa carcerária. No Rio, o discurso é para fora. Querem arrumar dinheiro. No Rio, se eles fizerem manifestações dessas, a polícia sufoca a favela deles. Aconteceu recentemente: com uma ação forte, os caras capitularam e devolveram fuzis. E a facção paulista, onde combatê-la? Na cadeia? Mas eles já estão presos. Fora da cadeia, onde ela está?

A senhora tem conhecimento de um acordo entre facções criminosas paulistas e cariocas que teria aberto caminho para a venda de crack no Rio?

MARINA: Não tem pacto para vender crack no Rio. Essa droga é trazida por matutos comuns, juntamente com outras drogas. Chega na Mangueira, que fica com a cocaína e distribui o crack para as favelas mais pobres, para consumo interno. Até nisso somos diferentes. O Marcola, apontado como chefe deles, tem sangue de boliviano. É muito perigoso. Tem tendência de guerrilha. Dizem que uma de suas reivindicações é ver a Copa do Mundo pela TV. Já os nossos comandos são torcidas organizadas. Os chefes não têm dentes, usam menos de 30 palavras no vocabulário, são limitados. O Primeiro Comando da Capital (PCC) de São Paulo é um perigo para a soberania nacional.

As diferenças, pelo que a senhora descreve, são profundas.

MARINA: Em termos. Em São Paulo, mataram cerca de 40 policiais no mesmo dia. Mas, no Rio, de três a quatro policiais são mortos por dia. Estamos sendo assassinados só por sermos policiais. Caçam policial no Rio há muito tempo. Há 15 anos somos assassinados sumariamente, sem defesa. Qualquer bandido, de qualquer facção, se encontrar policial, mata.

Como enfrentar essa facção criminosa de São Paulo?

MARINA: É preciso olhar para as condições do preso. No Brasil, quem é de direita defende a redução da maioridade penal, leis mais duras. A esquerda quer acabar com o caveirão, quer direitos humanos. Não se chega a um equilíbrio. O princípio de autoridade fica comprometido. Só quem vai para a favela é a polícia. Com o Movimento Afroreggae, a favela está fazendo um movimento na nossa direção.

É verdade que as facções do Rio teriam cedido armas para a rebelião de São Paulo?

MARINA: Eles têm grana e não precisam de armas do Rio, que tem uma das principais facções sem armas, quebrada, a ponto de invadir quartéis em busca de armas. Eles se perderam no consumo. As pessoas que lideram hoje são criadas na cocaína.

São Paulo supera o Rio no movimento de drogas?

MARINA: São Paulo é o grande entreposto. Tudo chega lá e segue de lá para outros lugares. É a maior rota da América Latina. Mas o PCC não tem nada com isso. É facção carcerária. No Rio, 90% da droga chegam pela Via Dutra, em pouca quantidade.