Título: DESLIGAR AS ANTENAS NÃO RESOLVE
Autor: Lino Rodrigues, Alan Gripp e Monica Tavares
Fonte: O Globo, 16/05/2006, O País, p. 15

Para especialistas, medida não é 100% eficaz; e corrupção é maior problema

O pedido emergencial para que as operadoras de telefonia celular desligassem as antenas próximas aos presídios rebelados em São Paulo a fim de impedir a comunicação entre presos foi visto por especialistas em telecomunicações e em segurança pública como ¿empurrar o problema para debaixo do tapete¿, pois a questão maior é a corrupção.

O professor em telecomunicações da UFRJ Marcelo Pontes explicou que desligar uma rádio-base próxima a um presídio não garante que os presos não consigam se comunicar. Segundo Marcelo, os aparelhos hoje são potentes e automaticamente irão buscar outra freqüência para operar. Ele disse que o desligamento das torres perto de presídios poderá pôr em colapso a telefonia de São Paulo:

¿ Não é um problema de comunicação, mas de segurança. Estamos há 30 anos desenvolvendo sistemas para falar com qualidade cada vez melhor. Ao desligar a antena próxima ao presídio, o celular vai buscar uma rádio-base mais distante, sobrecarregando o sistema. Vai dificultar a comunicação, mas não garante 100% de bloqueio. Não seria mais fácil impedir a entrada deles nos presídios?

Segundo Pontes, num momento de exceção como este, a solução seria tirar a cobertura das áreas, mas não resolveria totalmente o problema.

¿ No Rio, os traficantes passaram a usar um radioamador para burlar o bloqueio. O que possibilita aos traficantes se comunicarem de dentro para fora dos presídios é a corrupção. Se não for por celular, encontrarão outras formas.

Segundo o especialista, os bloqueadores podem ser mais eficazes se o estado aumentar a área de influência deles:

¿ Quanto mais problemas você for gerar para o vizinho, melhor o bloqueio, porque evitará que os presos consigam falar quando estiverem em um ponto mais próximo às paredes dos presídios. Mas a medida, certamente, traz prejuízos para a população vizinha. E isto é um problema para a Anatel.

Jurista alerta para risco de invasão de privacidade

O vice-presidente do Tribunal de Ética da OAB-RJ, Ubiratan Cavalcanti, lembra que quando o bloqueio de celulares atinge o presídio, isto é um assunto do estado, mas quando atinge pessoas de fora do presídio, o caso é de invasão de privacidade. Segundo Cavalcanti, as pessoas têm direito à comunicação e pagam tributos para isto. Ele criticou a tese de que os advogados seriam os responsáveis pela entrega de celulares a bandidos.

¿ Não podemos aceitar que se pretenda atribuir a responsabilidade da falha da administração do estado aos celulares e aos advogados. O advogado passa por detector. No Rio, em trabalho com a Secretaria de Administração Penitenciária, expulsamos os advogados envolvidos com o crime. Está na hora de São Paulo fazer o mesmo.

Para o coordenador do Centro de Estudos da Criminalidade e Segurança Pública da UFMG, Cláudio Beato, o aumento do número de roubos de celulares no Rio está ligado à realidade dos presídios:

¿ Criou-se uma demanda. Os celulares roubados vão abastecer os presídios. Não adianta pensar em fechar antenas. Entram celular, armas, drogas. Não há controle.