Título: A contribuição da coincidência
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 20/05/2006, O globo, p. 2

Esta foi uma semana duplamente adversa para o candidato tucano Geraldo Alckmin. A crise de segurança em São Paulo o atingiu (embora também a Lula) e criou seqüelas com setores do PFL, que por sua vez escolheu o candidato a vice que não era de sua preferência. Na terça-feira será anunciada mais uma pesquisa CNT/Sensus que, segundo rumores, mostrará maior distanciamento de Lula, apesar de tudo o que pesa contra o PT e o governo. Este quadro deve produzir nova onda de angústia entre aliados do candidato tucano.

Novas reuniões devem acontecer em busca de estratégias para virar o jogo. Para os mais angustiados, o pior é que não há muito o que fazer. Alckmin tem percorrido o país como candidato, bate em Lula e no governo o quanto quer. Agora terá o desejado vice nordestino, falta ver o que ele pode agregar na região.

Há muito caminho a andar, há uma grande parcela de eleitores indefinidos e está aberta a temporada de caça aos ¿lulistas eventuais¿, que é como o Aécio Neves define os 30% que votaram em Lula uma ou duas vezes, não em todas as eleições que ele disputou. Estes são os 30% empedernidos, assim existe outro terço que não vota mesmo no petista. Alckmin vive dizendo que a campanha começa mesmo é com o horário eleitoral, em agosto, ¿quando o horário da novela é alterado¿.

Mesmo assim, alguns aliados acham que já era tempo de ele estar apertando Lula. Há queixas do comportamento da cúpula tucana, que por uma série de coincidências estava toda em Nova York enquanto o mundo explodia em São Paulo e o PFL escolhia o vice menos palatável. Ontem houve queixas também do prefeito Cesar Maia, que em seu ex-blog falou com entusiasmo maior que o admitido a aliados sobre a eventual candidatura do senador Pedro Simon pelo PMDB.

Atributos pessoais contam mas tudo isso tem muito a ver, diz o deputado Francisco Dornelles (PP-RJ), com a mistura entre reeleição e eleições coincidentes para presidente e governador.

¿ Tanto os eleitores quanto os partidos dão mais importância à eleição estadual. Além de favorecer quem está no cargo, relega a segundo plano a eleição do presidente, sujeitando-a à logica regional. Uma reforma política terá que acabar com a coincidência ¿ diz, apontando outras situações anômalas.

1. A verticalização desorganiza a disputa e só existe porque há coincidência.

2. Só quatro entre 19 partidos terão candidatos a presidente este ano. O maior deles, o PMDB, não terá candidato próprio nem fará coligações oficiais, subordinado à lógica local.

3. Lula está com dificuldades para escolher seu vice porque os partidos estão dando prioridade às eleições estaduais. Ciro Gomes é desejado mas o PSB o quer puxando votos para deputado.

4. A lei exige que governadores deixem o cargo com antecedência para disputar a Presidência. Se precisam sair em abril, os partidos têm que decidir sem uma avaliação mais precisa do seu potencial.

A coincidência traz mesmo estes e outros inconvenientes. Desfazê-la é que são elas. O único jeito seria com a eleição de governadores que teriam, excepcionalmente, seis anos de mandato. Mas como a fila é grande, ninguém topa.