Título: A ALTERNATIVA SIMON
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 20/05/2006, O País, p. 4

Pode ser que acabe não dando em nada, mas está em andamento em setores do PMDB uma nova tentativa de fazer decolar uma candidatura própria, com força política interna suficiente para superar o bloqueio que caciques do calibre dos senadores Renan Calheiros e José Sarney montaram para garantir que essa possibilidade não se concretize.

Desta vez, a aposta desse grupo é no senador Pedro Simon, que tem muito mais prestígio no partido do que o ex-governador Garotinho e o ex-presidente Itamar Franco, e tem a mesma vantagem que Itamar tinha sobre Garotinho: é um politico contra quem não existe qualquer acusação, nem mesmo insinuação possível, de envolvimento em corrupção.

Ao contrário, Simon tem a imagem do politico combativo, sempre cobrando medidas contra a corrupção. Ficou marcado pela atuação no depoimento do ex-ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros sobre as privatizações na telefonia, quando, com seu jeito teatral de gestos largos e olhos arregalados, montou uma armadilha verbal para o ministro que acabou lhe tirando as condições de continuar no cargo.

Dali para a frente, todos os depoimentos de autoridades no Congresso, ou mesmo nas CPIs, são seguidos com atenção na expectativa de que Simon consiga o mesmo efeito mais uma vez. E bem que ele tem tentado, produzindo bons momentos nas intervenções nas CPIs, embora não seja membro efetivo de nenhuma delas. O PFL trabalha com a informação de que em torno de 40% dos eleitores procuram uma alternativa à polarização Lula/Alckmin, e que haveria espaço para o crescimento de uma candidatura com forte base regional e de perfil social e democrático, perfis em que se enquadram tanto o ex- presidente Itamar Franco quanto o senador Pedro Simon.

Como Itamar entrou nessa disputa com Garotinho muito mais para atrapalhá-lo, e garantir uma vaga para disputar o Senado por Minas, caberia a Simon assumir esse papel. Por enquanto, até saber com certeza em que terreno está pisando, Pedro Simon continua candidato mesmo à vaga do Senado no Rio Grande do Sul, à qual é considerado imbatível. Embora não pretenda assumir a posição de pré-candidato à Presidência sem as garantias de que o partido está disposto a realizar a convenção em junho, Simon já começa a se movimentar com mais vigor.

Ontem, em discurso no Senado, distribuiu culpas para todos os lados por conta dos ataques terroristas dos últimos dias em São Paulo: culpou a corrupção generalizada, a impunidade e a má distribuição de renda. E voltou a defender a realização no Brasil de uma Operação Mãos Limpas, nos moldes da campanha na Itália que colocou parlamentares, empresários e até juízes e ex-ministros na cadeia.

Assim como o governador de São Paulo, o senador Simon também culpou as elites brasileiras ¿porque agem com descaso diante da miséria e da fome, que ao contrário do que anuncia a propaganda do governo, continua atingindo milhões de brasileiros¿. E fez as críticas com conhecimento de causa: ele é autor de diversos projetos de lei sobre o combate à corrupção e ao crime organizado, tendo inclusive criado, no governo de Itamar Franco, do qual foi líder no Senado, uma comissão formada pelos presidentes dos tribunais superiores e do Congresso, pelo procurador-geral da República, pelo chefe da Casa Civil e pelo ministro da Justiça para discutir o tema e tomar providências.

Essa comissão foi desfeita no primeiro dia do primeiro mandato do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, criando um atrito com Itamar. O fato é que já se espalhou no partido a idéia de que é possível ter um candidato próprio com chances de vitória. Devido às divisões internas, há muito tempo o PMDB desistiu de ter um papel central direto no jogo eleitoral brasileiro, para se transformar em um instrumento de poder regional. Já é lugar comum dizer-se que o PMDB não consegue eleger o presidente da República, mas nenhum presidente da República consegue governar sem o apoio do PMDB.

Mas o cenário político mostra um quadro bastante favorável a uma candidatura alternativa, que quebre a polarização entre PT e PSDB. O presidente Lula, cada vez mais isolado em termos partidários, aparece como favorito por conta do carisma pessoal, e se encaminha para a campanha de reeleição com uma estrutura política fragilizada, uma candidatura muito vulnerável, embora pessoalmente popular.

A tal ponto que está com dificuldade para montar a chapa dos seus sonhos, que seria ou com um representante do PMDB, ou com o ex-ministro Ciro Gomes pelo PSB. Nem PMDB nem PSB parecem dispostos, por razões semelhantes, a se unirem definitivamente ao PT, apesar de as chances de reeleição de Lula serem imensas hoje.

A mesma pregação contra a centralização de poder em São Paulo que torna o governador de Minas Aécio Neves um líder com forte apelo em outros estados, serve para o senador gaúcho Pedro Simon. Com o fim do primeiro mandato do presidente Lula, teremos tido 12 anos de governos paulistas, podendo ir a 16: Fernando Henrique de 1994 a 2002; Lula de 2002 a 2006 ou 2010; ou Geraldo Alckmin de 2006 a 2010.

A entrada no páreo do senador Pedro Simon poderia ser uma alternativa para quem não está satisfeito com as opções oferecidas. No momento, a articulação a favor de Simon procura o apoio dos dois candidatos alijados pelas manobras dos governistas do PMDB. Se Garotinho e Itamar derem seus apoios políticos a ele, sem se sentirem preteridos, é possível que a candidatura ganhe fôlego.

Garotinho, em depressão, está trancado em casa e reluta em abrir mão oficialmente de sua candidatura. Itamar pode vir a ser beneficiado pela impossibilidade de Ciro Gomes ser o vice de Lula. Nesse caso, José Alencar continuaria na chapa, e o PT poderia apoiar Itamar para o Senado.