Título: MÉDICA ATINGE TOPO DA MONTANHA
Autor: Rogério Daflon e Sanny Bertoldo
Fonte: O Globo, 20/05/2006, Esportes, p. 49

Ana Elisa se torna primeira brasileira a alcançar o cume

A trágica morte de Vítor Negrete, ontem, encobriu um feito importante no montanhismo. Entre a noite de 18 de maio e a madrugada de ontem, a cirurgiã plástica Ana Elisa Boscarioli, de 40 anos, tornou-se a primeira mulher brasileira a atingir o topo do Everest, como informou o website .

Ana Elisa, que usou garrafas de oxigênio para completar o percurso, conseguiu seu objetivo ao acompanhar um grupo de uma agência de montanhismo neozelandesa.

¿ É um feito histórico para o nosso montanhismo. Mas lamento que ele tenha sido obtido quando tivemos a notícia da morte de Vítor ¿ disse o brasileiro Irivan Burda, que, no dia 2 de junho passado, alcançara o topo do Everest, junto com Vítor e Waldemar Niclevicz.

Alpinista recorda encontro com Vítor no alto da montanha

Irivan recordou que, ano passado, Vítor Negrete atingiu o topo do Everest com auxílio de duas garrafas de oxigênio. Ele e Waldemar tiveram um encontro fraternal com o colega. Irivan contou que ele fora extremamente solidário.

¿ Quando alcancei o topo, ele estava chegando. Tinha uma garrafa cheia de oxigênio, e outra, até a metade. Eu só tinha uma, com um quarto de oxigênio. Eu estava preocupado com isso, e ele trocou sua garrafa pela metade pela minha de um quarto ¿ recordou Irivan, explicando que ficou sem uma garrafa de oxigênio porque a pessoa que iria lhe entregar a mesma sofrera uma queda e tivera de voltar, bem antes da chegada ao cume.

O alpinista disse que Vítor tinha ótima forma física, era forte e, até por se preocupar com segurança, sempre se mostrava preocupado com as condições climáticas.

¿ Ele se informava sobre a velocidade do vento, sobre a temperatura, era detalhista ¿ afirmou.

Para o cardiologista Ricardo Vivacqua, a empreitada à qual o alpinista se propôs a realizar tem riscos que podem ser minimizados com algumas providências. A primeira é fazer um exame de sangue para pesquisar o traço falcêmico. Através dele, percebe-se se o indivíduo tem a hemácia falciforme. Se for o caso, o atleta nem deve tentar fazer qualquer escalada em grandes alturas. Feito isso, é necessário ter um excepcional preparo físico para enfrentar uma previsível hipóxia (baixo teor de oxigênio).

¿ Hipóxia é a conseqüência da redução da pressão parcial de oxigênio do ar respirado, a redução de oxigênio no sangue. Causa a aceleração da respiração e da pulsação, levando uma pessoa a ter náusea e tontura ¿ explicou o médico.

O médico ressalta ainda que a preparação é algo fundamental. Ele foi médico da seleção brasileira nas Copas de 1982 e 1986.

Na primeira, para condicionar o time para as eliminatórias em La Paz, na Bolívia, Vivácqua fez uma espécie de escalonamento. Primeiro, o elenco treinou em Bogotá, a 2.240m de altitude, depois em Quito, a 2.900m, para só então ir para La Paz. O mesmo ocorreu para a Copa de 1986, no México. Antes de o time estrear na Cidade do México, a 2.240m, ele fez treino intento numa altitude maior: na cidade mexicana de Toluca, a 2.600m. Por fim, o cardiologista afirmou que se o risco da escalada for grande, deve-se ter em mente o limite do corpo.

¿ Numa escalada com esse grau de dificuldade, é bom que o alpinista sempre tenha consciência de seus limites ¿ alertou.