Título: POLÍCIA AINDA DESCONHECE ORGANIZAÇÃO DE FACÇÃO
Autor: Soraya Aggege
Fonte: O Globo, 21/05/2006, O País, p. 8

Livro-caixa revela que organização faturou R$9 milhões ano passado, mas delegado admite que cifra pode ser parcial

SÃO PAULO. Responsável pelas investigações sobre a facção criminosa que ordenou os ataques em São Paulo, o delegado Rui Ferraz afirma que o real poder de fogo e de articulação dessa organização ainda é desconhecido das autoridades. Ferraz, que depôs na CPI do Tráfico de Armas, cita números estarrecedores: a facção arrecadou R$9 milhões em 2005 (R$750 mil por mês), mas a cifra pode ser maior.

Os dados são de um livro-caixa da facção apreendido pela polícia paulista, mas podem fazer referência apenas a uma parte dos negócios. O livro pertencia a um tesoureiro da facção, que tem pelo menos mais três pessoas exercendo a mesma função. Em 2001, a facção tinha acumulado R$80 milhões com assaltos a banco e a aviões de carga. O depoimento sigiloso de Ferraz acabou sendo vendido para a facção por um funcionário terceirizado da Câmara dos Deputados e posteriormente divulgado.

Cerca de 120 mil dos 140 mil presos paulistas integram a facção. Do lado de fora das prisões, são mais de dez mil comparsas. Além de dispor de 1.200 celulares, os criminosos montaram centrais telefônicas e de recados pelo país. Nas prisões, as armas chegam até por Sedex. Recentemente, foram mandados anonimamente 60 televisores novos para as cadeias. Até a formação de advogados foi patrocinada pela facção nos últimos seis anos, com o pagamento de cursos universitários.

Atuação diversificada

As áreas de atuação são múltiplas. Cerca de 70% dos seqüestros com extorsão feitos no estado são ordenados pela facção. Há sociedades no tráfico de drogas, nos assaltos a bancos e nos arrastões em condomínios de luxo. A facção recebe um percentual, como se fosse um pedágio, dos criminosos. Em troca, ajuda nos planos, além de fornecer informações e contatos para a prática dos crimes. Quem não pagar o pedágio, morre. Dentro ou fora das prisões, segundo a polícia.

¿ Mas a facção paulista é extremamente limitada. O problema é que ela conta com a simpatia de milhares que estão nas ruas. Não é uma organização que tem tentáculos no Brasil inteiro, tem sim conexões, contatos, simpatizantes. O que é o traficante, por exemplo? É um comerciante. E para vender, ele precisa ter contatos. Não é a facção que está arquitetando tudo. É o comércio deles que estimula essas ligações pelo Brasil inteiro. São pessoas integrantes da facção com interesses próprios que se aproveitam disso. Isso, na verdade é mais antigo que a facção ¿ afirma o delegado Ferraz.

Bases na capital e no interior

O número de bases da facção fora dos presídios também é grande. A polícia já identificou seis delas na cidade de São Paulo (um no centro e uma em cada região da cidade) e outros seis na região metropolitana de São Paulo, em regiões como Osasco. Há ainda vários ¿QGs¿ no interior e em cidades maiores, como Campinas, assim como em cidades menores, como em Avaré e Hortolândia.