Título: USINAS APOSTAM NA PRODUÇÃO DO BIODIESEL
Autor: Monica Tavares
Fonte: O Globo, 21/05/2006, Economia, p. 38

Projetos garantirão 1,3 bilhão de litros de combustível feito a partir de óleos vegetais. BNDES analisa pedidos

BRASÍLIA. O mercado de biodiesel está em ebulição. Na quinta-feira, a Petrobras anunciou um novo combustível, o H-Bio, um diesel com 10% de mistura de óleos vegetais que começa a ser produzido no ano que vem. Mas além do investimento da estatal em combustíveis alternativos, a iniciativa privada também está jogando suas fichas na produção de combustível a partir de óleos vegetais.

A Refinaria de Manguinhos, na Baixada Fluminense, é um exemplo. Um dos maiores expoentes da potente indústria brasileira do petróleo, Manguinhos está se preparando para aderir ao biodiesel. Atualmente, são cinco as usinas em produção e sete aquelas que aguardam apenas autorização da Agência Nacional do Petróleo (ANP) para começar a funcionar, num investimento de cerca de R$300 milhões. Outros 31 projetos estão sendo analisados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, dos quais cinco já entraram com pedidos de financiamento no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e um, no Banco do Brasil.

Esses novos projetos garantirão cerca de 1,3 bilhão de litros de biodiesel, suficientes para mais do que atender a toda a demanda de 800 milhões de litros no caso da mistura de 2% ao diesel fóssil (obrigatória a partir de 2008). Esses investimentos chegam a US$130 milhões (R$278 milhões).

Refinaria está reformando sua base de produção

Lançado há pouco mais de um ano, o Programa Nacional do Biodiesel deslancha a uma velocidade superior à imaginada pelo próprio governo federal. O coordenador do programa, Arnoldo de Campos, conta que os investidores nas usinas de processamento de biodiesel são tanto médias e grandes empresas quanto cooperativas. Entre eles estão grupos do setor de soja, como a Granol e a Caramuru. Nas áreas de petróleo, energia, fertilizantes e química, as companhias também demonstram interesse nesse tipo de projeto.

As usinas são semelhantes às instalações de bases de processamento de álcool (etanol). Manguinhos, por exemplo, está fazendo algumas reformas na sua base para se adaptar à produção de biodiesel e aposta nesse campo de atuação como forma de recuperar a empresa, já que no mercado de petróleo ela enfrenta muitas dificuldades. Isso porque, além das boas instalações, Manguinhos tem um bom posicionamento no mercado consumidor e tecnologia.

Os primeiros testes de refino de biodiesel começam a ser feitos pela Refinaria de Manguinhos. No início serão processadas entre 2.500 e três mil toneladas por mês do óleo. Há, no entanto, condições técnicas de aumentar a produção em 50%. O diretor de Assuntos Corporativos da empresa, Marcus Vasconcellos, afirmou que a companhia está investindo US$2 milhões para a adaptação de suas instalações.

¿ Com a alta da cotação internacional do petróleo, sem repasse dos custos para os preços, Manguinhos teve que procurar outras alternativas de negócio ¿ afirma o executivo.

A Refinaria de Manguinhos fez um contrato comercial com a empresa Ponte de Ferro Participações Indústria e Comércio de Biodiesel Ltda. O diretor e um dos sócios da Ponte de Ferro, Sergio Galdieri, disse que a empresa tem como controladores grupos das área de frigorífico, agricultura, indústria e construção civil. Ela comprou, em um dos leilões realizados pelo governo, 50 milhões de litros.

A empresa vai atuar em toda a cadeia produtiva do biodiesel e tem uma planta de 20 mil hectares onde produz sebo bovino e girassol. Os investimentos em biodiesel do grupo chegam a R$30 milhões. A empresa está pedindo enquadramento no BNDES para conseguir financiamento para a atividade entre R$16 milhões e R$18 milhões.

A Ponte de Ferro está instalando uma usina em Estrela do Oeste, em São Paulo, que somente deverá ficar pronta no início de 2007. Com isso, ela contratou Manguinhos e a Indústria Química de Taubaté, no fim de 2006, para processar o biodiesel. O contrato com a refinaria é de processamento de 30 milhões de litros, e com a Indústria Química de Taubaté, de 20 milhões de litros.

Conquista do mercado externo está nos planos

Segundo Vasconcellos, da Refinaria de Manguinhos, não há mudança na concepção do equipamento para o processamento do biodiesel. Foram feitas adaptações em alguns periféricos. Os técnicos de Manguinhos também estão avaliando um outro processo de refino de biodiesel. A nova tecnologia permitiria um aumento de produção, entre 40 mil toneladas/ano e 100 mil toneladas/ano. Para isso, seria necessária uma planta específica de biodiesel.

Campos, do Programa Nacional do Biodiesel, disse que o mercado assegurado para o produto é o interno, que está estabelecido e tem um cronograma para a entrada do combustível. Para ele, o mercado externo se apresenta neste momento como uma possibilidade muito grande ¿ e não muito distante. Ele disse que União Européia, por exemplo, tem como diretriz substituir pelo menos 5,75% dos combustíveis fósseis por renováveis:

¿ Tanto o álcool quanto o biodiesel passam a ser fundamentais para a União Européia cumprir esta meta. E ela não tem a menor condição de abastecimento próprio. Já recebemos investidores espanhóis, portugueses, alemães e japoneses que têm interesse em produzir biodiesel ou óleo no Brasil e levá-lo para a Europa.

Para viabilizara expansão do setor de biodiesel, o BNDES tem linhas de financiamento para toda a cadeia produtiva ¿ agricultura, indústria e transporte. Valores acima de R$10 milhões são financiados diretamente pelo BNDES. Abaixo deste valor os agentes financeiros são o Banco do Brasil e Banco da Amazônia (Basa) e bancos regionais.

O financiamento oferecido pelo BNDES prevê correção pela Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) mais uma taxa de juros dependendo do porte do investidor. Se ele for uma grande empresa, ela é de 3% ao ano. Já se a empresa tiver o selo social, a taxa cai para 2%. Para os pequenos, é de 2% ao ano, mas com o selo é reduzida para 1%.

O financiamento do BNDES leva em torno de seis meses a um ano para ser liberado. A empresa candidata ao financiamento demora cerca de 60 dias para apresentar todos os documentos requeridos pelo banco. Depois disso, o BNDES tem 60 dias para avaliar a papelada. O prazo da contratação está em torno de 60 dias.

Até agora, uma operação está em fase de aprovação pelo banco e outras cinco estão enquadradas ¿ primeiro filtro usado pelo banco para verificar se a empresa está apta a receber o empréstimo. Para viabilizar os seis projetos, serão necessários financiamentos de R$217 milhões, segundo o gerente Ricardo Cunha. No total, eles vão significar uma produção de 100 mil toneladas de biodiesel.

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