Título: Velho hábito cede a novos tempos
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 21/05/2006, O Mundo, p. 41

PARIS. A França dos restaurantes e bares esfumaçados não existe mais. O país de filósofos como Albert Camus ou do cantor-ícone Serge Gainsbourg fumando cigarros sem filtro Gauloises e Gitanes também acabou. A fábrica destes cigarros que marcaram época fechou em setembro no ano passado, depois de uma queda de 11% nas vendas na França. Mudou-se para a Espanha. Os tempos mudaram.

Fumantes inveterados no passado, os franceses começam a ceder às estatísticas de saúde pública e ao mote da campanha internacional contra o tabagismo. Mas persiste um certo romantismo em relação ao fumo. Bar, para muitos franceses, tem de ter fumaça.

¿ Não vamos conseguir nunca banir o cigarro. Haverá greve, revolução. Não se encaixa com a nossa maneira de viver. Um restaurante sem cigarro é bom. Mas um bistrô, um café , sem um pouquinho de fumaça, me deixa triste. Não tem alma ¿ filosofa Valerie Martineau, que nunca fumou.

Dos 11 irmãos e irmãs de Valerie, cinco fumavam. Hoje, ninguém mais fuma.

O parisiense Christophe Olivier, dois filhos, não fuma cigarro, mas sim charuto, de vez em quando. Mas ele também acha que bar sem cigarro não tem graça. Para Olivier, não foram só as leis que mudaram, para apertar o cerco, a atitude do fumante francês também mudou: ele conhece muitos que, quando convidados em casa de amigo, vão fumar no corredor.

O consumo de tabaco na França só começou a diminuir quando o governo resolveu agir. Em 2003, com o Plano Câncer, o governo embarcou numa agressiva campanha de taxação de produtos de tabaco, com proibição de publicidade e de fumar em lugares públicos. A estratégia começou a funcionar. A partir de 2003, em um ano o preço do cigarro subiu 40%, causando uma queda nas vendas de 33,5%. Para conquistar o público, o governo começou a usar o dinheiro dos impostos de cigarro para financiar programas de saúde pública e segurança social.