Título: POLÍCIA PAULISTA INVESTIGA PARTICIPAÇÃO DE POLICIAIS NA EXECUÇÃO DE 12 JOVENS
Autor: Ricardo Galhardo
Fonte: O Globo, 23/05/2006, O País, p. 4

Rapazes foram mortos em cinco ações na periferia; testemunhas acusam PMs

SÃO PAULO. A Ouvidoria de Polícia de São Paulo instaurou procedimentos para apurar a participação de policiais nas execuções de 12 jovens moradores da periferia com idades entre 17 e 29 anos. Os jovens, todos sem passagens pela polícia, foram mortos em cinco ações de supostos grupos de extermínio entre os dias 14 e 17. Testemunhas dos crimes e parentes das vítimas apontam policiais militares como autores dos assassinatos.

¿ Nos cinco casos os assassinos estavam vestidos de ninjas e, em pelo menos um, usavam armamento pesado. É coisa de gente organizada ¿ disse o ouvidor Antonio Funari Filho.

A ouvidoria vai investigar uma fotografia publicada na edição de quinta-feira do jornal ¿Diário de S.Paulo¿ na qual policiais civis aparecem com camisetas do esquadrão da morte num evento na Assembléia Legislativa de São Paulo ocorrido na véspera.

A primeira chacina aconteceu às 18h de domingo, em São Mateus, na Zona Leste. O segurança Eduardo de Paula Silva estava numa esquina com os amigos Fernando da Silva Rodella, Robson de Souza, Ivan Ramos Ferreira de Moura, Edílson Pedro de Souza e Danilo Lopes Rissi quando ouviu os gritos de ¿mãos para a cabeça¿. Os cinco atenderam a ordem. Em vez de revista, receberam tiros à queima-roupa na cabeça. Pouco antes, testemunhas viram um carro da PM passando pelo local.

Às 11h do mesmo dia, o policial militar José de Souza, de 48 anos, fora assassinado por integrantes de facções num ponto de ônibus. Testemunhas acreditam em represália da PM. Segundo as testemunhas, os encapuzados saíram a pé. A calçada foi lavada e as balas retiradas, prejudicando o trabalho da perícia.

Ferido na cabeça, Eduardo se fingiu de morto e foi levado também pela PM para o hospital. Com medo de que os assassinos voltem, a família faz vigília na porta do hospital. No dia seguinte, também em São Mateus, o cabeleireiro Lindomar Lino da Silva, de 29, foi morto quando andava pela rua. O principal suspeito é um PM que já cumpriu pena por homicídio.

Em Guarulhos, Bruno Henrique de Souza, de 17 anos, e Diego Andrade Santos, de 18, foram mortos na porta da casa por volta das 22h30m. Bruno foi atingido no tórax e na coluna cervical. Diego levou um disparo na cabeça. Três encapuzados desceram de um carro atirando. Quando um vizinho tentou ver o que acontecia, os encapuzados atiraram. Um helicóptero da polícia sobrevoava o local na hora.

Na Zona Norte, amigos do motorista Ricardo Faustino, de 22 anos, atearam fogo a um ônibus em protesto contra seu assassinato. Ele estava em uma escadaria na Avenida Antonelo Messina, Jardim Filhos da Terra, quando seis encapuzados chegaram. Depois de matarem Faustino, saíram atirando. Testemunhas viram os seis tirarem máscaras e casacos e entrarem no veículo da Força Tática da PM número M-3074.

Outras três pessoas morreram numa chacina no Parque Bristol, na Zona Sul. Dois homens encapuzados usando jaquetas pretas desceram de um Vectra escuro e abriram fogo contra Fernando Elza, de 22 anos, Fabrício de Lima Andrade, de 18; Edivaldo Soares Andrade, de 24, e Israel Alves de Souza, de 25. Ferido no tórax, Fernando ainda conseguiu pegar um ônibus até o hospital da Vila Mariana, onde foi socorrido.

PM diz que vai apurar participação em chacinas

Segundo o ouvidor, os cinco casos levantam a suspeita da ação de grupos de extermínio em São Paulo. Na quarta-feira da semana passada, policiais civis foram fotografados na Assembléia Legislativa usando camisetas com a inscrição Escuderie Detetive Le Cocq - Esquadrão da Morte - Brasil. Criada no Espírito Santo no fim dos anos 60, sob a proteção da ditadura militar, a escuderia era formada por policiais. Em novembro de 2004 o juiz federal Alexandre Miguel, de Vitória, decidiu pela extinção da escuderia e pela proibição do uso de seus símbolos.

A Polícia Militar disse que vai apurar a suposta participação de integrantes da corporação em execuções. Segundo o capitão Marcel Soffner, da assessoria de imprensa da PM, se for comprovada a participação de policiais nas chacinas, eles serão punidos.