Título: CRESCE O TRABALHO INFANTIL FEMININO NO CAMPO
Autor: Flávia Oliveira e Letícia Lins
Fonte: O Globo, 23/05/2006, Economia, p. 29

Segundo IBGE, ocupação rural entre meninas e adolescentes de 10 a 17 anos aumentou nas cinco regiões do país

RIO e IGARASSU (PE). O trabalho infantil caiu à metade na média brasileira nos nove anos que separam os dois últimos censos demográficos. Mas, desagregadas, as estatísticas oficiais expõem o drama que se agravou entre as meninas e mulheres adolescentes que vivem no campo. Em oposição à tendência nacional, fortemente influenciada pelas áreas urbanas, a ocupação rural feminina na faixa etária de dez a 17 anos cresceu nas cinco regiões do país entre 1991 e 2000. No primeiro ano, 8,5% das meninas do Nordeste já trabalhavam; em 2000, a proporção passou a 12,3%. No Norte, o trabalho infantil feminino rural dobrou: de 5,2% para 11,3% no mesmo período. Já no Sudeste passou de 21,4% para 22,7%.

As informações saíram do banco de dados do Sistema Nacional de Informações de Gênero (Snig), que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) lançou ontem. Resultado de uma parceria com a Secretaria Especial de Política para as Mulheres e com o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem), o programa reúne informações dos dois últimos censos sobre gênero e raça em cada município, estado ou região do país. Será, na opinião da ministra Nilcéa Freire, titular da Secretaria de Mulheres, ferramenta poderosa na criação de políticas públicas para as mulheres brasileiras.

Uma das responsáveis pelo sistema, Cristiane Soares, economista do IBGE, diz que o aumento do trabalho infantil no campo é reflexo da ampliação da participação das mulheres no mercado de trabalho. Tradicionalmente, as atividades rurais são associadas à ocupação masculina. Tanto que a proporção de meninos e homens adolescentes que tralham nas áreas rurais do Nordeste beira um terço.

¿ A ocupação feminina se intensificou, e as meninas e adolescentes das áreas rurais fizeram o mesmo movimento ¿ resume Cristiane.

Agricultura familiar absorve mão-de-obra infantil

Em Pernambuco, por exemplo, nem é preciso ir ao agreste para encontrar meninos e meninas trabalhando nas casas de farinha, como são conhecidas as pequenas fábricas familiares ou comunitárias onde se processa a mandioca. Mas na área rural de Igarassu, a 30 quilômetros da capital pernambucana, é fácil confirmar que as adolescentes, agora, trabalham mais.

A agricultora Maria José da Conceição, de 44 anos, tem dez filhos. Simone, de 17, e Claudete, de 16, já trabalham. Simone Justino de Souza está na escola, mas arruma tempo para ajudar os pais na colheita e na venda das hortaliças produzidas pela família na feira municipal. Claudete, a mais nova, deixou o sítio onde morava com os pais e os irmãos para trabalhar como empregada doméstica.

A agricultura familiar e o emprego doméstico são as formas habituais de absorver a mão-de-obra infantil, tanto feminina quanto masculina, no Nordeste brasileiro. Isso porque, nos últimos anos, a fiscalização trabalhista aumentou muito nos engenhos e nas usinas de cana da Zona da Mata pernambucana.