Título: O RIO PEDE SOCORRO
Autor: Celso Guedes
Fonte: O Globo, 25/05/2006, Opinião, p. 7

Há muito assistimos aturdidos ao avanço da criminalidade em todo o país, que não se intimida em protagonizar ações audaciosas de desrespeito às autoridades e instituições. Até mesmo instalações das Forças Armadas são invadidas.

A gigantesca operação militar a que assistimos recentemente no Rio de Janeiro, com o coroamento da recuperação de armamento furtado, foi a resposta que somente uma autoridade responsável como o comandante do Comando Militar do Leste, general Domingos Curado, com poder e legitimidade para tal, poderia assumir.

As contra-reações não surpreenderam e até já estavam estimadas: clamores orquestrados na porta do antigo Ministério da Guerra; insultos orais e acenos obscenos para fustigar as tropas; mulheres e crianças posicionadas em áreas de tiro; insinuações de acordos com a criminalidade e o questionamento sobre a autenticidade do armamento recuperado.

O Rio pede socorro. É inadiável o reconhecimento de que, além de ações policiais, a segurança pública exige intervenções econômicas, políticas e sociais que promovam a redução dos níveis de miséria que motivam o avassalador processo de degradação da cidade, desvalorizando a vida e banalizando o crime.

Não pode o Poder Judiciário fluminense se omitir no processo de restauração dos valores e da ordem pública. Longe disso. O Rio de Janeiro sempre representou a vanguarda nas grandes decisões nacionais e não é tempo de abdicar da importante missão de diminuir o fosso social que se abriu em nossa sociedade.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, além de cumprir sua missão jurisdicional, que representa o processamento de mais de 1 milhão de demandas anuais, tem atuado junto às comunidades carentes, notoriamente com a oferta de trabalho terceirizado de menores oriundos de movimentos sociais e pela disseminação da Justiça através de suas unidades itinerantes. Mas temos consciência de que é pouco.

O Tribunal de Justiça, de mãos dadas com outros órgãos do Poder Executivo Fluminense, pode e deve participar de uma "ocupação social", atuando nas comunidades carentes, fazendo chegar a "Justiça para todos".

Sem dúvida não estaremos mudando tudo. Muito há o que se fazer e o comum não se faz apenas com polícia e tribunais. A verdadeira justiça social sempre dependerá de múltiplos fatores, mas teremos cumprido nosso papel como cidadãos, já que a cidadania não se obtém apenas pelos direitos adquiridos, mas, principalmente, pela participação no desenvolvimento da sociedade.

Vamos dar um choque de cidadania no Rio de Janeiro. Vamos ocupar socialmente as comunidades carentes, levando não apenas os serviços do Estado, mas a solidariedade de irmãos. Vamos dar a essas comunidades o que mais falta: serviços públicos, assistência social, atenção, carinho. Só assim nossa cidade poderá voltar a ser maravilhosa.

CELSO GUEDES é vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.

O tribunal deve participar de uma "ocupação social", das comunidades carentes da capital