Título: Novas regras eleitorais podem esbarrar no STF
Autor: Isabel Braga
Fonte: O Globo, 25/05/2006, O País, p. 10

TSE regulamenta lei proibindo showmícios, outdoors e brindes, mas mudanças podem não valer para este ano

BRASÍLIA. A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de proibir showmícios, veiculação de propaganda em outdoors e a distribuição de brindes e camisetas nas eleições deste ano já suscita dúvidas entre os candidatos. O próprio presidente do tribunal, ministro Marco Aurélio de Mello, admite que a validade ou não das mudanças poderá ser decidida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o ministro, ao considerar válidos quase todos os pontos da lei para estas eleições, o tribunal adotou uma posição menos ortodoxa. Os que se sentirem lesados poderão recorrer ao STF alegando, por exemplo, o descumprimento do princípio da anualidade - que determina que qualquer mudança nas regras devem ser feitas, no mínimo, um ano das eleições.

A lei regulamentada anteontem à noite pelo TSE foi aprovada em abril pelo Congresso Nacional e sancionada no último dia 10 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Podem entrar com ações diretas de inconstitucionalidade no Supremo contra as normas os partidos políticos, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), governadores e até o presidente da República. Apesar de admitir que cabe recurso ao STF, Marco Aurélio não acredita que isso será feito.

- Pode parar no Supremo, pois temos o controle constitucional. Mas não imagino (que ocorra) porque a sociedade aplaude avanços e a lei implicou em avanços.

Em menos de 24 horas,cinco consultas ao TSE

Ontem à noite, menos de 24 horas depois da decisão do TSE que aceitou quase todas as mudanças na legislação aprovadas pelo Congresso, cinco consultas de parlamentares já tinham chegado ao tribunal. Nessas consultas, os parlamentares querem saber: se é permitida a instalação de telões em comícios; a retransmissão de shows gravados em DVDs; o uso de trios elétricos em comícios; e se os eleitores podem confeccionar camisetas do candidato que apóiam. Também querem saber se é permitido incluir o nome e o número de candidato em porta-títulos eleitorais. As consultas foram feitas pelo senador Cesar Borges (PFL-BA) e os deputados Jair Bolsonaro (PP-RJ) e José Carlos Araújo (PFL-BA).

Sobre a regulamentação de anteontem, Marco Aurélio explicou que o tribunal adotou uma interpretação mais flexível. As normas referentes ao processo eleitoral só podem ser mudadas por lei até um ano antes das eleições. Diferentemente de decisões anteriores, pesou mais o clamor da opinião pública em favor de regras que coíbam o abuso do poder econômico nas campanhas. Embora tenha sido voto vencido em muitos dos entendimento, Marco Aurélio considera positivo o resultado.

- O tribunal deixou de lado a ortodoxia. Evoluiu para atender ao interesse público e a necessidade de lisura nas eleições. A lei é aplicada a partir de interpretações. Por isso é feita por homens e não por máquinas. Não podemos criar normas, mas se há duas interpretações e uma delas atende melhor ao interesse público, convém adotá-la - justificou Marco Aurélio.

O corregedor-eleitoral, ministro Cesar Asfor Rocha, votou a favor de as mudanças vigorarem já este ano. Ele também considerou que o tribunal agiu em sintonia com a sociedade:

- O resultado está em sintonia com a aspiração da sociedade de ter eleições menos influenciadas pelo abuso do poder econômico. Dificulta o caixa dois e torna as eleições mais limpas - disse o corregedor.

No Congresso, a decisão do TSE foi comemorada pela maioria dos líderes. O líder do PT, Henrique Fontana (RS), afirmou que houve avanços importantes, mas insuficientes.

- Não adianta só proibir camiseta, o processo é contaminado pela exorbitância dos valores das campanhas. Quantos Delúbios, Ricardos Sérgios e PC Farias vamos ter que assistir ainda para de fato coibir o abuso de poder econômico nas campanhas? - questionou o petista.

Decisão comemorada no Congresso

O líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), gostou da medida:

- A redução dos custos ajuda a combater a corrupção e o caixa dois. Se o candidato tem menor necessidade de gastos, a probabilidade de se envolver com recursos ilegais é menor - diz o pefelista.

O líder do PSB, Alexandre Cardoso (RJ), acredita que as novas regras eleitorais permitirão redução dos gastos não declarados das campanhas. Segundo levantamento que fez com declarações de prefeitos e vereadores na eleição de 2004, apenas 10% do valor gasto na campanha é realmente declarado. Calcula que, com a proibição do uso e distribuição de camisetas e brindes, de outdoors e a criminalização da boca-de-urna, será possível baixar de 90% para 30% a 35% os valores não declarados nas campanhas a deputado estadual e federal.

- O maior gasto dos candidatos proporcionais (deputados) concentra-se nos três últimos dias de campanha, com a contratação de pessoas, distribuição de camisetas, locomoção, lanche. Mas as medidas serão um choque para esta campanha. Nas próximas teremos que avançar e aprovar a reforma política, porque certamente encontrarão mecanismos para burlar estas regras - disse o líder do PSB.

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