Título: CONGRESSO SE RECUSA A INVESTIGAR SUSPEITOS
Autor: Jailton de Carvalho
Fonte: O Globo, 25/05/2006, O País, p. 15

Apuração sobre parlamentares envolvidos será transferida para a Procuradoria Geral da República

BRASÍLIA. Diante da forte pressão dos deputados do baixo clero, os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), lavaram as mãos e transferiram para a Procuradoria Geral da República a investigação sobre os parlamentares acusados de envolvimento com a máfia das ambulâncias. Numa reunião com o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, os dois acertaram que o Senado e a Câmara só voltarão a investigar parlamentares após a análise prévia do caso pela Procuradoria Geral.

Só serão investigados agora pela Corregedoria da Câmara os 16 parlamentares mais citados nas conversas dos chefes da organização. Uma comissão de sindicância já está analisando esses casos.

- O Ministério Público pode fazer essa investigação inicial melhor que o Parlamento - disse Calheiros.

A decisão, na prática, enterra os planos dos deputados Raul Jungmann (PPS-PE) e Fernando Gabeira (PV-RJ) de criar a CPI dos Sanguessugas. Sobrecarregado, o MP pode levar um longo período nas investigações sobre o envolvimento dos parlamentares com a máfia da ambulância. Com a proximidade da Copa do Mundo e das campanhas eleitorais, dificilmente a Câmara levará adiante a proposta de uma investigação interna ampla.

Do encontro entre Calheiros, Rebelo e Antônio Fernando participaram os corregedores da Câmara, Ciro Nogueira (PP-PI), e do Senado, Romeu Tuma (PFL-SP). Ficou acertado que a Procuradoria Geral fará uma análise preliminar das informações obtidas pela Polícia Federal na primeira etapa das investigações. Até então, a tarefa estava a cargo das Corregedorias.

Processo dependeráde autorização do STF

Se considerar os indícios consistentes, o procurador-geral deve pedir ao Supremo Tribunal Federal autorização para abrir inquérito contra os parlamentares. A partir daí, enviará o resultado às Corregedorias da Câmara e do Senado. Com base nesses dados, as Corregedorias retomariam as investigações, abandonadas desde sexta-feira passada, e poderiam ou não pedir ao Conselho de Ética a cassação do mandato dos suspeitos. Como o caminho é longo, muitos dos acusados poderão já estar reeleitos.

Em geral, as investigações do MP sobre pessoas com foro privilegiado são longas. Os acusados de envolvimento no mensalão só foram denunciados ao STF um ano depois do início das apurações. Aldo alega que os parlamentares não ficarão de braços cruzados. De acordo com ele, as Corregedorias vão acompanhar as investigações e dar continuidade às sindicâncias sobre os assessores parlamentares acusados de envolvimento com a quadrilha.

- As corregedorias não vão ficar paradas - disse.

Segundo a ex-assessora especial do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino, os sanguessugas fizeram contatos, em muitos casos, com pelo menos 283 parlamentares. Ex-funcionária da Planam, uma das empresas envolvidas, Maria da Penha é apontada pela polícia como uma peça-chave no esquema dos sanguessugas. A quadrilha é acusada de subornar parlamentares para direcionar emendas e, com isso, financiar a compra de ambulâncias e equipamentos hospitalares superfaturados. (Jailton de Carvalho)

Parlamentares criticam decisão

Com medida, investigação não deverá terminar antes das eleições

BRASÍLIA. A decisão dos presidentes da Câmara e do Senado de transferir a investigação para a Procuradoria Geral da República foi duramente criticada por deputados que apoiaram a criação de uma CPI para apurar o caso e por integrantes do Conselho de Ética. O deputado Raul Jungmann (PPS-PE) acusou o presidente da Câmara, Aldo Rebelo, de terceirizar a apuração na Câmara:

- Estão terceirizando responsabilidades. E se o Congresso não instalar a CPI, estará incorrendo em crime de omissão.

Jungmann afirmou que se os acusados não forem julgados até as eleições de outubro, "o país estará no pior dos mundos":

- Ninguém é culpado, ninguém é inocente. São todos suspeitos. Será o beijo da morte.

Antônio Carlos Biscaia (PT-SP) disse temer que a investigação do Ministério Público demore muito tempo e que os envolvidos não sejam julgados antes das eleições:

- O melhor caminho seria a CPI e depois o envio dos casos ao Conselho de Ética. A CPI iria durar apenas 90 dias. Não que não se tenha confiança no Ministério Público, mas as conclusões podem chegar tarde.

Fernando Gabeira (PV-RJ), que também defende a CPI, fez um duro ataque aos parlamentares envolvidos no escândalo.

- A Câmara abdicou de investigar. Não vai haver tempo hábil para saber quem é inocente e quem é culpado. A relação de forças no futuro no Congresso é favorável aos bandidos.

Para José Carlos Araújo (PL-BA), do Conselho de Ética, Aldo acertou ao transferir o caso para o Ministério Público.