Título: MAIS UMA AJUDA AOS AGRICULTORES
Autor: Regina Alvarez/Martha Beck
Fonte: O Globo, 26/05/2006, Economia, p. 21

Pacote de R$75 bi do governo prevê crédito a produtores e prorrogação de dívidas

Em meio a uma das maiores crises do agronegócio no Brasil e a uma onda de protestos, o governo anunciou ontem um megapacote de R$75 bilhões para ajudar os produtores. Destes, R$60 bilhões serão destinados à comercialização, ao custeio e a investimentos da safra 2006-2007. O governo também vai refinanciar R$10 bilhões em dívidas e adotar medidas estruturais para evitar futuras crises no setor, que incluem desoneração de Imposto de Renda (IR) para compra de matéria-prima a ser utilizada em produtos destinados à exportação. Uma série de pontos ainda está em estudo ou depende de aprovação do Congresso. Foi a terceira iniciativa do governo Lula para o setor este ano: em abril foram R$14,6 bilhões e este mês, R$1,4 bilhão.

- O governo reconhece o fato de que a crise é muito grande e por isso está anunciando um conjunto de medidas que minimizem ao máximo seus efeitos - disse o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues.

Entre as medidas estruturais está a criação de um fundo contra catástrofes, como secas e enchentes. Esse seguro, que precisa ser criado por projeto de lei, será gerido pelo setor privado, mas contará com recursos do governo. Também está em estudo uma forma de incentivar os produtores rurais a acumularem recursos em períodos de alta de preços.

- É uma espécie de previdência para os produtores - disse o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo.

Agricultura comercial terá R$50 bilhões

Na área de dívidas, o governo vai prorrogar por quatro anos os créditos obtidos pelos produtores para o custeio da safra 2005-2006. Mas o valor prorrogado vai depender do tipo de produto e da região. No caso da soja, por exemplo, a prorrogação será de 50% para as regiões Sul e Sudeste e de 80% para as demais.

A equipe econômica também concordou em prorrogar por cinco anos, com dois de carência, as parcelas de dívidas vencidas em 2005 e a vencer em 2006 de produtores que tiveram débitos securitizados ou inscritos em programas como Pesa e Recoop. Isso terá um custo de R$600 milhões. O Tesouro se comprometeu a suspender por 180 dias a cobrança judicial desses produtores, para que eles não sejam inscritos na dívida ativa.

Os R$60 bilhões para o plano de safra representam alta de 12,5% em relação a 2005. Destes, R$41,4 bilhões são para custeio e comercialização da agricultura comercial e R$8,6 bilhões, para investimentos. O restante é para a agricultura familiar.

Apesar de, nos bastidores, Rodrigues ter mostrado irritação com a falta de ação do governo em relação ao agronegócio e de ter ameaçado até deixar o cargo, ontem ele pareceu satisfeito:

- Quero dar meu reconhecimento à ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), ao ministro Guido Mantega (Fazenda), que tem sido um companheirão, e ao ministro Paulo Bernardo. Acho que o conjunto de medidas resolverá a imensa maioria dos problemas dos agricultores - disse Rodrigues, que negou ter ameaçado deixar o governo. - Estou aqui, firme na parada.

Mantega disse que o impacto da renúncia fiscal das medidas já estava previsto nas contas do governo.

O pacote também prevê alguns benefícios tributários. Haverá isenção de impostos na importação de matérias-primas desde que o produto final seja exportado - o sistema de drawback, que hoje só vale para produtos como algodão e carnes. E os ganhos de pessoas físicas com títulos do agronegócio terão isenção de IR.

Analistas ainda têm algumas críticas

Para o presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, Antônio Ernesto de Salvo, o pacote tem pontos positivos, mas algumas medidas poderiam ter sido mais abrangentes. Já André Pessoa, diretor da Agroconsult, teme que, por ser ano eleitoral, o pacote demore a ser aprovado no Congresso e acabe não beneficiando os agricultores na próxima safra. Com relação à prorrogação de dívidas, ele receia que, se o patamar do câmbio não mudar, os agricultores podem não recuperar a capacidade de pagamento. Segundo ele, o maior problema hoje é a perda de rentabilidade com a valorização do real em relação ao dólar, que já soma cerca de R$30 bilhões em dois anos.

O ponto alto do pacote, para Pessoa, foi o reconhecimento de que é preciso ter um programa de seguro agrícola amplo, geral e irrestrito. Mas ele acha os recursos previstos para 2006 (R$40 milhões) insuficientes: teriam de chegar a R$1 bilhão.