Título: UMA GUERRA SEM FIM PARA A COLÔMBIA
Autor: José Meirelles Passos
Fonte: O Globo, 26/05/2006, O Mundo, p. 27

Auxílio dos EUA não impede que narcotráfico lucre milhões no país

Apesar de ter investido US$12 bilhões no combate ao narcotráfico nos últimos seis anos - sendo US$4,5 bilhões doados pelos EUA - o governo da Colômbia continua perdendo essa guerra. No ano passado houve um aumento de 26% das áreas cultivadas com coca, e a produção de cocaína foi estimada em 700 toneladas.

Muito embora 800 militares americanos e 600 funcionários de empreiteiras da área de defesa, também dos EUA, venham auxiliando o país através do Plano Colômbia - inclusive com o treinamento de uma brigada antinarcóticos com 2.300 homens - as exportações, obviamente ilegais, daquele produto continuaram saindo do país sem problemas.

Farc lucram US$500 milhões anuais

Nada menos do que 70% dos cultivos de coca estão hoje em mãos dos guerrilheiros das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). O grupo estaria faturando US$500 milhões anuais com esse negócio e também com a venda de pasta de coca aos cartéis de narcotraficantes.

Anos atrás as Farc apenas cobravam um "imposto" aos produtores, além de um "pedágio" pelo transporte da mercadoria até pistas clandestinas ou embarcadouros em rios e na costa do Pacífico. "Hoje as Farc são as únicas compradoras de pasta de coca em várias áreas do país, consolidando o monopólio do negócio", diz o trecho de uma ação aberta num tribunal de Washington, pelo governo dos EUA.

Trata-se de um processo contra 50 chefes das Farc e também do grupo paramilitar Autodefesas Unidas de Colômbia (AUC), cuja extradição já foi solicitada à Colômbia. Segundo o documento de 49 páginas, desde 1985 as Farc teriam faturado - direta ou indiretamente - US$25 bilhões. Parte desse dinheiro teria como fonte o lucro de investimentos em imóveis.

Na ação judicial o governo americano solicita, como compensação, o confisco de bens da guerrilha que seriam equivalentes àquele total. O governo colombiano não fala oficialmente a respeito dos aspectos financeiros do narcotráfico. No entanto, reconhece que pelo menos uma parte dos lucros dos cartéis, dos guerrilheiros e dos paramilitares entra no país através de lavagem de dinheiro.

O Fundo Monetário Internacional (FMI), que inspeciona os livros contábeis do país, também tem uma estimativa do volume que entra na economia nacional - mas tampouco informa sobre o assunto, considerado tabu. O cálculo extra-oficial, no entanto, é que a Colômbia fatura o equivalente a 2,5% do seu PIB com o contrabando de cocaína e, em menor escala, de heroína - cerca de US$3 bilhões anuais.

- Não há um registro oficial e público desse item na nossa pauta de exportações, obviamente. Mas quem olhar com atenção o balanço anual de contas da nação verá que sempre aparece um item referente à entrada de dinheiro que em vez de ter como fonte alguma mercadoria diz apenas "outros" - disse ao GLOBO uma fonte do Ministério da Fazenda da Colômbia.

Confrontadas com o fato de que apesar do intenso processo de fumigação das lavouras de coca - que teria sido realizado em 133 mil hectares - a área de cultivo teve aumento de 38.600 hectares ano passado, chegando a um total de 144 mil hectares não fumigados, as autoridades colombianas dizem que isso, ironicamente, seria resultado do que definem como o sucesso de suas operações militares.

Guerrilha mudou estratégia

Ou seja: diante da movimentação mais intensa de tropas do Exército em várias áreas do país, as Farc mudaram de tática. Os guerrilheiros passaram a instruir os lavradores a estabelecerem cultivos menores, mais difíceis de serem detectados pelo governo. Os EUA, que participam desse combate - em termos de logística e supervisão - têm outra justificativa: descobriram que a atenção estava voltada apenas para áreas tradicionais de cultivo.

- O aumento no índice dos cultivos se deve basicamente ao fato de que em 2005 fizemos uma sondagem numa área mais extensa do território colombiano. Houve um aumento de 81% em relação ao território observado em 2004. Encontramos coca em lugares que antes não tínhamos olhado - admitiu John Walters, diretor do Escritório Nacional para a Política Antidroga, do Departamento de Estado.

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