Título: `POR QUE O SENHOR PERMANECEU EM SILÊNCIO?¿
Autor: Graça Magalhaes Ruether
Fonte: O Globo, 29/05/2006, O Mundo, p. 19

Em visita a Auschwitz, Papa Bento XVI pergunta onde Deus estava durante o horror nazista

BERLIM. Em seu último dia de visita à Polônia, o Papa Bento XVI alterou o programa e foi ontem ao campo nazista de concentração de Auschwitz-Birkenau, onde 1,5 milhão de pessoas foram mortas. Ele disse que era quase impossível, particularmente para um Papa alemão, falar ¿nesse lugar de horror¿:

¿ Faltam palavras. No fim, resta apenas um silêncio aterrador, um silêncio que é um pranto sofrido a Deus. Por que, Deus, o Senhor permaneceu em silêncio? Como pôde tolerar tudo isso? Onde estava Deus naqueles dias? Por que não se manifestou? Como pôde permitir essa matança sem limites, esse triunfo do mal?

Poloneses esperavam beatificação de João Paulo II

A visita foi posta no programa por iniciativa do próprio Papa. E o gesto de deixar o papamóvel e entrar a pé no campo, através do portão com a inscrição em alemão da frase cínica ¿Arbeit macht frei¿ (¿O trabalho liberta¿), foi simbólico. Durante a Segunda Guerra Mundial, Joseph Ratzinger foi membro da organização nazista Juventude de Hitler.

¿ Estou aqui como um filho do povo alemão, que foi usado como um instrumento da destruição ¿ disse.

Bento XVI tentou dar uma identidade aos milhões de mortos na ¿espiral de destruição da qual no final restaram apenas perdedores¿. Em seu primeiro discurso sobre o holocausto e a reconciliação, ele citou Edith Stein, a filósofa judia convertida ao catolicismo e que foi assassinada em Auschwitz.

Em frente à Parede da Morte, onde milhares de pessoas foram executadas, Bento XVI acendeu duas velas que recebeu de dois sobreviventes de Auschwitz, gesto que foi observado por 32 sobreviventes do campo, judeus, ciganos e poloneses. Depois, visitou a cela de Maximilian Kolbe, padre visto pela Igreja católica como um mártir por ter se oferecido para ser morto no lugar de um pai de família.

No fim, houve um ato litúrgico com a participação de representantes da comunidade judaica da Polônia, da associação dos ciganos e das igrejas protestante e ortodoxa.

Foi a primeira visita de Bento XVI a Auschwitz, mas a terceira de Ratzinger. Na Polônia, o Papa defendeu um processo rápido de beatificação de João Paulo II, mas mesmo assim causou decepção aos poloneses que contavam com um anúncio da beatificação do Papa morto.