Título: RECEITA PÁRA, EMPRESAS PERDEM
Autor: Ronaldo D'Ercole
Fonte: O Globo, 30/05/2006, Economia, p. 19

Greve de auditores traz prejuízos de US$ 750 milhões só na Zona Franca de Manaus

Perto de completar um mês, a greve dos auditores fiscais da Receita Federal ganha força, preocupa os empresários e espalha perdas em diversos setores da economia. Na Zona Franca de Manaus, os prejuízos desde o início da paralisação, em 2 de maio, já passam de US$ 750 milhões, segundo o Centro das Indústrias do Estado do Amazonas (Cieam). Fábricas de empresas como Siemens, Thomson (equipamentos eletrônicos) e LG/Philips (de cinescópios para televisores), entre outras, estão tendo de parar algumas linhas de produção e brigam na Justiça para liberar cargas (insumos e componentes) retidas na alfândega de Manaus.

O presidente da Cieam, Maurício Loureiro, diz que a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, deve receber hoje um levantamento detalhado da situação na Zona Franca, onde as empresas dependem dos auditores tanto para receber insumos como para liberar as mercadorias.

- O governo se mostrou preocupado com a situação - disse Loureiro, referindo-se ao contato do governador Eduardo Braga (PMDB) com a ministra, semana passada.

Apesar de a greve ter começado no início do mês, só semana passada o comando foi recebido por uma autoridade do governo. Depois de audiência com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, os sindicalistas foram encaminhados ao Planejamento e ainda aguardam uma audiência com o ministro Paulo Bernardo.

Porto de Santos pode cruzar os braços hoje

Mas a situação das empresas que dependem de insumos importados em outras regiões não é muito diferente da de Manaus.

- Até o momento, o que se verifica são paradas temporárias nas linhas de produção, por algumas horas. Mas, como os estoques estão diminuindo, haverá o momento em que as indústrias serão obrigadas a parar efetivamente - diz o presidente da Eletros (associação das indústrias de eletroeletrônicos), Paulo Saab.

O setor têxtil também sofre. Além de remanejar com freqüência os itens que fabrica para que suas linhas de produção não parem, conforme a disponibilidade dos insumos em estoque, a Paramont Têxteis enfrenta um problema adicional com a greve: todo o equipamento que importou para ampliar a capacidade da sua fábrica de Sapucaia do Sul (RS) está retido há duas semanas no Porto de Rio Grande.

- Todas as instalações estão prontas há dez dias e não temos as máquinas - queixa-se o diretor Financeiro da Paramont, João Moura.

A Linhas Bonfio S.A , que importa 80% de toda a sua matéria-prima, há duas semanas paralisou completamente sua fábrica de Três Lagoas (MS). E a unidade de Itaquaquecetuba opera com menos de 70% da capacidade, também por falta de fios de poliéster e viscose que importa da Ásia e dos Estados Unidos.

- O Porto de Santos já estava congestionado por causa da greve da Anvisa e agora nossos contêineres nem são mais desembarcados lá - disse Alfredo Bonduki, diretor da Bonfio, que prevê dificuldades ainda maiores se o Porto de Santos aderir à greve. - É uma situação lamentável. Parar portos, hoje, é parar o Brasil.

Os fabricantes de máquinas e equipamentos também estão em alerta. Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Antônio Carlos Germano Gomes, semana passada já havia grande preocupação entre as empresas que dependem de insumos importados:

- Se a greve não acabar logo, em dez ou 15 dias haverá um colapso.

Alexandre Ostrowieki, diretor da Multilaser, que produz e distribui equipamentos de impressão e informática, diz que 5% das suas linhas de produtos já estão em falta.

O diretor executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, lembra que em 2005 os mesmos auditores fizeram longa greve contra a criação da Super-Receita. E critica duramente a situação atual.

- É inadmissível o governo fazer greve - diz Castro. - Isso afeta muito a imagem do Brasil no exterior, pois gera insegurança sobre o cumprimento dos contratos.

O Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais (Unafisco) afirma que, na média nacional, 70% dos 7.644 auditores, ou seja, 5.351 servidores, aderiram ao movimento. E adverte que importantes postos da Receita ainda devem aderir à paralisação. Caso do Porto de Santos, que parou por 24 horas semana passada e decide hoje sobre nova paralisação, de 48 horas.

Segundo o Unafisco, os grevistas estão mantendo as atividades básicas em funcionamento, como a liberação de importação e exportação de medicamentos e produtos perecíveis. Muitas empresas e federações de indústrias estão conseguindo, via liminar, o rápido desembaraço de suas mercadorias.

A Receita e o Planejamento, diretamente envolvidos com os pleitos dos auditores, não quiseram comentar o movimento nem informar se serão abertas negociações.

COLABOROU Henrique Gomes Batista