Título: Dois treinos
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 01/06/2006, O País, p. 2

O presidente Lula fez ontem sua oferta mais audaciosa ao PMDB, mas tal movimento foi mais político que eleitoral. O que Lula busca mesmo é solidificar um aliança prévia com o PMDB para governar o país, se for reeleito. Tucanos e pefelistas oficializaram sua aliança num momento adverso: a dissensão interna tem aumentado e a economia voltou a soprar a favor de Lula.

Mas a campanha está só começando e os dois lados ainda enfrentarão fatos e imprevistos eleitorais que candidatos e partidos nunca podem controlar inteiramente.

Apesar da simpatia com que Quércia recebeu a oferta da vaga de vice na chapa de Lula e na de Aloizio Mercadante para governador de São Paulo, é pouco provável que isso aconteça e todos sabem por quê. O PMDB não tem unidade para aprovar uma coligação oficial com o PT nem com outro partido e seus caciques regionais não têm interesse nisso. Quanto a São Paulo, o que interessa mesmo ao PT é que Quércia seja candidato a governador, forçando a realização de um segundo turno entre Mercadante e o tucano José Serra. A compensação viria depois, no plano federal. Para Lula, é muito ruim a perspectiva, apontada pelas pesquisas de hoje, de Serra se eleger no primeiro turno. Se ele, Lula, tiver que enfrentar um segundo turno, estará no sal em São Paulo, sem palanque e com o PT derrotado em casa. Daí a importância de um segundo turno, ainda que o tucano leve (embora os petistas acreditem que Mercadante vá crescer e dar um aperto em Serra).

As duas ofertas podem ter sido um resumo combinado da conversa, que resvalou mesmo foi para o fechamento de alianças informais em boa parte dos estados e para a formação de uma sólida coalizão de governo para o eventual segundo mandato de Lula.

A solenidade tucano-pefelista confirmou o discurso de campanha de Alckmin, centrado nas denúncias e escândalos, na exploração de pontos fracos do presidente (omissão, desconhecimento de ilícitos etc.). Tinha energia oposicionista mas algumas ausências (Aécio Neves, Cesar Maia e Serra, por exemplo) só confirmaram o quanto anda ruim o clima na aliança. E não só entre tucanos e pefelistas mas entre pefelistas mesmo. Impressionante a violência da troca de petardos entre o senador ACM e o governador de São Paulo, Cláudio Lembo. Estes são daqueles elementos eleitorais que o candidato controla.

A principal aposta de curto prazo da oposição está na veiculação dos programas partidários do PSDB, do PFL e do PPS nos próximos dias. Os programas regionais do PSDB, exibidos esta semana, foram bem dirigidos e consistentes no ataque, sobretudo em São Paulo, onde a telinha foi dividida por Serra e Alckmin. Mas mesmo este trunfo, segundo a Consultoria Mosaico, pode agora ser neutralizado pelo bom resultado do PIB do primeiro trimestre divulgado ontem. Isso pode deixar Lula bastante fortalecido na travessia do período entre 10 e 30 de junho, no qual acontecerão as convenções partidárias e as alianças eleitorais estarão fechadas.

No Palácio, outra notícia recebida com reservado júbilo foi o complemento da pesquisa Datafolha, apresentando as razões dos eleitores para votar neste ou naquele candidato. Os de Lula apontaram os programas sociais (25%), o desempenho da economia (14%) e a impressão de que seu governo é voltado para o povo (14%) como razões principais para voltar nele. Para quem está no governo é fácil, fácil, reforçar tais percepções. Ainda mais quando a economia ajuda.

Os eleitores de Alckmin apontaram sua imagem pessoal (32%), o bom governo que fez em São Paulo (18%), propostas na área de saúde (8%), de educação (7%) e o fato de ser um candidato novo (6%), que pode mudar as coisas. Seu desafio agora é reforçar a percepção destes atributos.