Título: Crescimento com moderação
Autor: Flávia Oliveira/Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 01/06/2006, Economia, p. 23

PIB avançou 1,4% no primeiro trimestre com ajuda da indústria. Agropecuária encolheu

A queda dos juros básicos da economia, a melhora na renda dos trabalhadores e o aumento nos gastos do governo deram fôlego à economia brasileira no primeiro trimestre. O Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto de todas as riquezas produzidas pelo país) cresceu 1,4% na comparação com o último trimestre do ano passado, já descontados os efeitos sazonais, informou ontem o IBGE. É a maior taxa desde 2004. A alta do PIB confirmou a expectativa dos analistas de uma recuperação da economia, depois de um segundo semestre de crescimento pífio, que resultou numa expansão de apenas 2,3% no ano passado.

A expansão de 1,4% significa que a economia brasileira iniciou 2006 com uma taxa de crescimento anualizada de 5,7%. Frente ao primeiro trimestre de 2005, a alta do PIB foi de 3,4%. O avanço da economia veio principalmente da indústria, pelo lado da oferta, e dos investimentos, quando se analisa o PIB pela ótica do consumo. Com uma expansão de 12,6% da extrativa mineral e de 7% da construção civil, a indústria cresceu 5% na comparação com o primeiro trimestre de 2005 e registrou alta de 1,7% em relação aos três últimos meses do ano passado.

- Os juros estão caindo e o ano eleitoral também ajuda, porque sempre há gastos extras, como no caso da construção civil - disse Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais Trimestrais do IBGE, lembrando que o governo federal já executou metade das obras previstas na Operação Tapa-Buracos.

Em relatório divulgado ontem à noite, Octavio de Barros, diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, chamou a atenção para o fato de o PIB ter sido impulsionado mais pela oferta (produção industrial e investimentos) do que pela demanda (consumo das famílias): "Neste trimestre, ocorreu o inverso dos dois anteriores, com os dados da demanda crescendo menos do que os da oferta, sugerindo recomposição dos estoques, o que estaria por trás, por exemplo, do forte crescimento da indústria", informou o relatório.

Câmbio ajudou investimentos

Enquanto a indústria avança, a agropecuária registrou queda 0,5% frente ao primeiro trimestre de 2005 - foi a terceira seguida neste critério de comparação. O setor foi afetado por problemas climáticos e pela safra menor de produtos cuja colheita se concentra no início do ano, como arroz, algodão e amendoim. Além disso, a febre aftosa prejudicou a pecuária e a queda do dólar diminuiu a rentabilidade dos agricultores.

O câmbio valorizado também levou a uma alta de 15,9% das importações, taxa bem acima da expansão de 9,3% registrada pelas exportações. Com isso, pela primeira vez desde 2000, o setor externo teve um peso negativo no PIB.

- Desde o quarto trimestre de 2003, as importações não superavam as exportações. Mas, ao longo de 2003, assim como em 2004 e no ano passado, o setor externo teve contribuição positiva para o crescimento do PIB - afirmou Rebeca.

Na comparação com o último trimestre do ano passado, as importações aumentaram 11,6% - a maior taxa desde 1996. Isso explica o forte crescimento dos impostos sobre produtos (5,7% frente ao primeiro trimestre do ano passado). Os tributos sobre importação têm peso elevado e, com isso, os impostos cresceram mais do que o PIB.

O outro lado do efeito câmbio aparece nos investimentos. A chamada formação bruta de capital fixo (que inclui a construção civil mais a aquisição de máquinas e equipamentos) cresceu 9% frente ao primeiro trimestre do ano passado. Foi a maior alta desde 2004. Parte dessa expansão dos investimentos ocorreu via importação de máquinas e equipamentos, graças ao câmbio favorável. Também ajudou a queda dos juros, que aumentou o otimismo dos empresários. A taxa básica de juros ficou em média em 16,9% no primeiro trimestre, contra 18,7% no mesmo período de 2005.

A economista Giovanna Rocca, do Unibanco, destaca que os investimentos cresceram mais do que o consumo das famílias, o que indica a ausência de pressões inflacionárias na economia. Os gastos das famílias tiveram alta de 0,5% frente ao quarto trimestre do ano passado (com ajuste sazonal). Na comparação com os primeiros três meses de 2005, a expansão foi de 4%, na décima taxa positiva seguida.

- A massa salarial (soma de todos os rendimentos dos trabalhadores) cresceu 4,9% e as operações de crédito para pessoas físicas aumentaram 35%, ajudando a sustentar o consumo das famílias - explicou a técnica do IBGE.

O economista do Bradesco também considerou satisfatório o resultado do consumo das famílias no PIB, mesmo com a desaceleração em relação ao quarto trimestre de 2005, quando houve expansão de 1,2% frente ao terceiro. Ainda assim, segundo Octavio de Barros, o primeiro trimestre de 2006 foi o quarto seguido de crescimento no consumo das famílias, após seis outros trimestres consecutivos de alta interrompidos apenas por um trimestre de queda.

"Assim, nos últimos 11 trimestres, portanto há quase três anos, o crescimento médio do consumo das famílias foi de 0,9% ao trimestre, o que representou alta anualizada média de 3,8%", segundo o relatório do Bradesco. O movimento foi integralmente atribuído ao crescimento de emprego, renda e crédito.