Título: CRISE NA AGRICULTURA PODE IR ATÉ 2007
Autor: Regina Alvarez/Luiza Damé/Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 01/06/2006, Economia, p. 24

Perda de rentabilidade do setor reduziria plantio e safra no próximo ano

RIO, BELO HORIZONTE, BRASÍLIA e SÃO PAULO. O fraco desempenho da agropecuária no PIB do primeiro trimestre já acende a luz amarela para o setor em 2007. Analistas se preocupam com a perda de rentabilidade dos agricultores, que deve levar a uma redução da área plantada e da safra no ano que vem. Antônio Licha, da UFRJ, destaca que o setor está descapitalizado e com dificuldades para honrar seus financiamentos, o que implica falta de crédito para a próxima colheita.

- Os preços agrícolas no atacado caíram 12,5% nos últimos 12 meses. É uma grande perda de renda para o setor.

O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, disse ontem em Belo Horizonte que só não haverá um colapso em 2007 porque a produção será menor com a seca e a queda na renda, que culminou com a redução dramática, segundo ele, na safra.

- Se a safra fosse normal, seria um desastre. Haveria um refluxo da produção contra o produtor, que não tem onde estocar, que dirá escoar - disse Rodrigues, num desabafo em encontro com empresários do setor e prefeitos mineiros.

O ministro afirmou que, em 2005, estados do Sul foram mais afetados pela crise na agricultura e, agora, ela se estende ao Centro-Oeste.

A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) atribuiu a retração do setor no PIB "à grande queda de preços agropecuários". O assessor técnico da CNA, Getúlio Pernambuco, diz que a produção do setor este ano deve crescer em relação a 2005, mas isso não será suficiente para anular as perdas dos produtores.

- A maioria dos produtos agrícolas está sendo comercializada a preços que não cobrem os custos de produção.

Mantega e Rodrigues criam comissão para o setor

A CNA e o Centro de Estudos Avançados de Economia Aplicada (Cepea) da USP calculam que o PIB do setor, levando em conta as variações dos preços, caiu 0,58% em janeiro e fevereiro, na comparação com os dois últimos meses de 2005. Segundo o vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Cesário Ramalho, as exceções hoje são açúcar e álcool, além de laranja, que se beneficiam de condições favoráveis nos mercados mundiais. O pacote de ajuda do governo, diz Ramalho, atenua problemas, mas não deve garantir fôlego ao agronegócio.

- O pacote vai tirar o setor da UTI, mas não tem como engatarmos uma quarta marcha este ano - disse, lembrando que é de 1,2% a queda prevista para o PIB agrícola em 2006.

Em Brasília, a crise da agricultura foi discutida numa audiência pública na Câmara. No evento, os ministros da Fazenda, Guido Mantega, e da Agricultura decidiram formar uma comissão, junto com produtores e parlamentares, para adotar novas medidas para os produtores rurais.

- Temos um grande plano de safra e é preciso que ele consiga chegar no agricultor. Eliminar os obstáculos que, às vezes, ficam no caminho do crédito. A gente libera um volume de crédito, mas o agricultor não consegue sacar no banco. Muitas vezes o diabo mora nos detalhes - disse Mantega.