Título: Guerra de palavras
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 02/06/2006, O País, p. 2

Ataques e xingamentos estão na ordem do dia há alguns meses mas ontem os próprios candidatos Lula e Alckmin partiram para o duelo verbal direto, numa mostra do que será a campanha que está apenas começando. Ainda que a guerra verbal dê votos, o que é discutível, para o cientista político Fernando Abrucio ela só servirá à produção de um presidente mais fraco, seja ele qual for.

Já no café da manhã Alckmin chamou Lula de "abusado" por ter recebido Quércia no Planalto para propor uma aliança ao PMDB. Estivesse levando mais a sério a necessidade de separar, até onde for possível, o candidato e o presidente, Lula teria passado sem essa. O Alvorada também é um espaço público, mas como FH fazia ali suas articulações eleitorais, os tucanos não devem achar errado. Em Manaus foi Lula quem provocou, desafiando a oposição a mostrar cenas das CPIs na campanha. "Não tem problema", disse Lula. Alckmin rebateu chamando-o de cínico: "Como dizer que corrupção não tem problema?". E aproveitou para acusar o governo de praticar uma farra fiscal e cambial. O ministro Mantega entrou na roda dizendo que isso ocorreu no governo FH. Lula terminou o dia falando de políticos que só sabem xingar e precisam aprender a perder, como ele no passado. Subiu no salto alto, embora pregue o contrário.

Abrucio acha que a oposição tem mais a perder, ou menos a ganhar, com esse tipo de campanha.

- Essa é uma conduta inútil, até nociva ao país. Se em vez de três CPIs a oposição tivesse transferido parte da investigação ao Ministério Público e se esforçado para aprovar reformas - eleitoral, penal etc. - hoje poderia apresentar-se como reformadora, não como denunciadora. Os tucanos vivem dizendo que Lula não é estadista mas o Alckmin, que tem muitas virtudes, precisa mostrar que o é ainda na campanha. Devia evitar o bate-boca e chamar o debate das questões que importam, como a reforma da Previdência.

Para Abrucio, se o ensaio de ontem ditar o padrão da campanha, o eleito chegará lanhado e fraco à vitória, seja ele quem for. A seu ver, as hipóteses de resultado hoje plausíveis são três: vitória de Lula no primeiro turno; vitória apertada de Lula no segundo turno e vitória de Alckmin, apertada, no segundo turno. Em todas as situações, o eleito terá imensas dificuldades para governar e se sustentar no Congresso, equacionar as reformas necessárias e levar o país ao crescimento sustentável. Daí seu apoio à pregação do senador Jefferson Peres por algum tipo de pacto após o pleito.

A beligerância ajuda Lula, diz Abrucio. A conduta encarniçada dos partidos da oposição e do governo durante a crise ajudou a firmar na população a idéia de que os políticos são todos iguais, o que absolutamente não é verdade. Se a campanha seguir esse tom, reforçará ainda mais essa percepção. Acreditando que todos são iguais, os mais pobres votarão pensando apenas nos ganhos que tiveram com o governo Lula. Os que ganham até cinco salários-mínimos, lembra ele, são 73% da população.