Título: GRUPO FRANCO-SUÍÇO DESISTE DO LEILÃO DA VARIG
Autor: Erica Ribeiro e Geralda Doca
Fonte: O Globo, 02/06/2006, Economia, p. 29

Especialistas alertam para risco de cancelamento porque prazo não respeita o estabelecido na Lei de Falências

RIO e BRASÍLIA. Um dia depois de anunciar o interesse de comprar todos ativos da Varig (partes doméstica e internacional), a Azulis Capital, que representa um grupo franco-suíço que se apresentou como investidor, informou ontem que desistiu de participar do leilão, marcado para a próxima segunda-feira. O leilão, porém, pode acabar sendo anulado, alertam especialistas do setor aéreo.

Segundo o advogado Geraldo Vieira, qualquer cidadão, credor ou interessado na companhia poderá pedir o cancelamento do leilão, cujo prazo entre o anúncio e sua realização, de apenas cinco dias, está em desacordo com a Lei de Recuperação Judicial, a nova Lei de Falências. Seria necessário esticar o período de avaliação da companhia em pelo menos 25 dias.

Juiz responsável afirma que data será mantida

Ivone Saraiva, diretora-executiva da Azulis Capital, disse ontem que já estava tudo pronto para o acesso ao data-room (sala de informações) da Varig quando um executivo do grupo franco-suíço, cujo nome Ivone mantém em sigilo, avisou que sairia da disputa. Segundo ela, os investidores já tinham conhecimento de alguns números da Varig:

- A decisão foi logo no início da tarde, pouco antes de entrarmos no data-room. Tudo dependia de informações complementares que nosso cliente (o grupo investidor) estava levantando. Foi quando nos ligaram informando da desistência. Não estou autorizada a dizer o motivo nem o nome do investidor, porque esse grupo tem interesse em negócios no Brasil.

Já com relação à data do leilão, o artigo 142 da Lei de Falências define quanto tempo antes de sua realização o edital de venda dos ativos deve ser publicado no Diário da Justiça e em jornal de ampla circulação. No caso de bens móveis (na Varig, máquinas, equipamentos, aviões e balcões de atendimento), a publicação deve ocorrer no mínimo 15 dias do leilão. No caso de bens imóveis (terrenos e prédios), 30 dias. O objetivo é permitir que eventuais compradores tenham tempo de examinar o negócio, explicou Vieira.

No caso da Varig, o leilão ocorrerá apenas cinco dias após a abertura do data-room. A antecipação do edital foi uma estratégia para convencer a Justiça americana a conceder mais prazo à empresa e obter dinheiro para cobrir as necessidades de caixa da Varig. Na quarta-feira, a Corte de Falências de Nova York estendeu até o dia 13 uma liminar que proíbe empresas de leasing de arrestar aviões da Varig por falta de pagamento.

- A lei não abre espaço para esse tipo de decisão. Teoricamente, os credores poderão ser prejudicados - disse Vieira.

O juiz responsável pelo leilão, Luiz Roberto Ayoub, disse que a data está mantida e que não seguiu a lei ao pé da letra, "porque o Direito precisa ser interpretado à luz da realidade, que é a enorme dificuldade enfrentada pela empresa para continuar sobrevivendo".

Para o especialista Júlio Mandel, em tese o juiz teria de seguir o prazo previsto na lei. Mas ele ressaltou que, neste caso, há um interesse maior: a sobrevivência da Varig. Mas se o valor da venda for muito baixo o leilão poderá ser impugnado.

O presidente da Associação de Pilotos, Rodrigo Marocco, que integra o Trabalhadores do Grupo Varig (TGV), disse que os advogados da entidade decidirão hoje se entram com recurso na 8ª Vara Empresarial do Rio, que coordena o processo de recuperação judicial da companhia. Segundo ele, o TGV quer mais tempo para examinar as propostas e buscar investidores no mercado.

Ontem, apenas a Gol pagou o acesso ao data-room, no valor de R$60 mil. No primeiro dia a procura foi maior, com TAM, TAP e Ocean Air buscando dados. O único investidor cujo nome continua em sigilo é o representado pelo escritório de advocacia Ulhôa Canto, Rezende e Guerra, que se esconde por trás do sugestivo nome de Céu Azul. O data-room ficará aberto até domingo.