Título: GOL E TAM JÁ DOMINAM O MERCADO DE AVIAÇÃO
Autor: Geralda Doca
Fonte: O Globo, 04/06/2006, Economia, p. 37

As duas detêm 79% do setor. Pequenas companhias não estão conseguindo aumentar sua participação

BRASÍLIA. Capitalizadas e com dinheiro em caixa para fazer marketing agressivo, vender passagens mais baratas e trazer novos aviões, as companhias Gol e TAM já estão dominando o mercado da aviação brasileira e poderão engolir, no médio prazo, as empresas menores ¿ BRA, Ocean Air e Web Jet ¿ caso a Varig pare de voar. O alerta é de especialistas, que mostram que, enquanto o mercado cresce 20% ao mês em média, as aéreas de transporte regular de pequeno porte vêm perdendo espaço. Segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), enquanto a participação da Gol e da TAM nos vôos domésticos subiu de 73%, em janeiro, para 79% em abril, a da Varig caiu de 20% para 17% e a das pequenas, de 7% para 4%.

Os números mostram também que as pequenas estão operando no vermelho, enquanto decolam os lucros das duas campeãs no transporte de passageiros. De acordo com estatísticas da Anac, a BRA registrou no terceiro trimestre de 2005 (dados disponíveis mais recentes) prejuízo de R$4,3 milhões, que correspondeu a 9,7% da sua receita operacional. O resultado negativo da Ocean Air de R$13,3 milhões representou mais da metade das suas receitas no período. E a Web Jet teve um prejuízo colossal, que superou os ganhos da atividade-fim em R$6,8 milhões ou 106,2% das receitas operacionais.

A Varig também teve prejuízo de 3,7% do total das suas receitas operacionais no terceiro trimestre ¿ situação que vem se agravando. Já Gol e TAM tiveram lucros de R$140,8 milhões e R$117,5 milhões, respectivamente, o que representou 20,7% e 10,1% do total dos ganhos. O percentual é usado por economistas para analisar a eficiência das empresas.

Segundo o consultor Paulo Sampaio, as empresas menores são inviáveis economicamente. Apesar de ter trazido seis Fokker-100 em janeiro, a Ocean Air está patinando no mercado, com menos de 0,6% de participação. A BRA, que fez sucesso como empresa de charter e virou regular em outubro do ano passado, não conseguiu se firmar. Ao contrário, viu a sua fatia cair de 6,23% em janeiro e 4,85% em abril, acompanhada de queda também na ocupação de assentos. Com apenas uma freqüência diária entre Rio e Porto Alegre, a Web Jet responde por 0,01% do mercado.

Na avaliação de fontes do setor, a BRA terá que mudar de foco e voltar a fazer só vôos charter para não sumir do mercado. No caso da Ocean Air, uma saída seria comprar a Varig. Já a sobrevivência da Web Jet é considerada muito difícil, pois seu único avião faz apenas um vôo e fica ocioso durante o resto do dia. Para se aventurar no setor como regular é preciso uma frota de pelo menos cinco aeronaves, afirmam especialistas.

¿ Se a Varig sair do mercado, o rolo compressor (Gol e TAM) vai acabar com as outras ¿ disse Sampaio, acrescentando que as grandes são lucrativas e atraentes para o investidor de bolsa, o que as capitaliza.

¿ Já está havendo uma migração dos passageiros da Varig para a Gol e a TAM ¿ reforçou o professor da UFRJ Respício do Espírito Santo.

Os balcões da Varig nos aeroportos estão constantemente vazios durante a semana e a empresa está conseguindo vender bilhetes para viagens apenas a curtíssimo prazo. Mesmo tendo reduzido a oferta, com diminuição de freqüência e cancelamento de vôos, a Varig perdeu cinco pontos percentuais na taxa de ocupação entre abril de 2005 e abril deste ano, de 69% para 64%, o que é grave, explicou o professor. Na BRA, a queda na taxa de ocupação foi ainda maior e saiu de 83% para 74%, no mesmo período.

Segundo Respício, a principal barreira para as menores é o tamanho das outras, que têm maior frota e podem oferecer maior número de vôos. Não adianta, destacou, BRA e Ocean Air concorrerem se elas oferecem apenas uma freqüência semanal de um a três vôos em quase todas as linhas.

¿ Outra grande dificuldade é conquistar o passageiro ¿ disse o professor, acrescentando que preferência do usuário é voar numa empresa já conhecida e com credibilidade.

Nos aeroportos centrais, pequenas têm espaço certo

Além da restrição orçamentária para investir em ampliação de frota, base de apoio em aeroportos, contratação de funcionários e publicidade, falta às pequenas estratégia de negócio, com pesquisas de mercado e planos de crescimento no médio e longo prazos, dizem os especialistas. Mesmo com a decisão da Anac de fazer uma reserva de mercado nos aeroportos centrais do país para as pequenas, elas não têm fôlego para enfrentar a concorrência, com maior poder de negociação junto aos agentes de viagem.

¿ Não há dúvidas de que o mercado será dividido entre Gol e TAM ¿ disse Leila Almeida, analista de investimentos da Lopes Filho & Associados.

Embora várias empresas tenham concessão para operar, o mercado da aviação brasileira é historicamente concentrado, lembra ela. Porém, especialistas destacam a importância de se ter pelo menos três empresas de grande porte no mercado para estimular a concorrência e reduzir tarifas.

¿ Com um concorrente de peso a menos, os preços das tarifas devem subir no médio prazo ¿ acredita Sampaio.

¿ Mas o mercado acabará se acomodando e, se as companhias aumentarem muito seus preços, poderão sofrer restrição de demanda ¿ argumenta Carlos Albano, do Unibanco.