Título: TESOURO VAI RECOMPRAR US$4 BI EM TÍTULOS QUE VENCEM ENTRE 2007 E 2030
Autor: Martha Beck e Liane Thedin
Fonte: O Globo, 06/06/2006, Economia, p. 22

Com anúncio da operação, risco recuou 5% e dólar caiu 1,44%, para R$2,251

BRASÍLIA e RIO. O Tesouro Nacional anunciou ontem que vai recomprar US$4 bilhões em títulos que foram emitidos em dólares e em euros com vencimento entre 2007 e 2030. A medida servirá para alongar o perfil da dívida externa e permitirá que o governo tire do mercado alguns papéis que hoje distorcem a curva de juros do endividamento e obrigam o Tesouro a pagar mais na hora de emitir títulos no mercado internacional. Além disso, analistas viram a operação como um sinal ao mercado de que o governo está vigilante para reduzir o impacto da volatilidade recente, devido às expectativas de novas altas de juros nos Estados Unidos, nos ativos brasileiros.

O anúncio da recompra derrubou o risco-Brasil (diferença entre os juros pagos por uma cesta de títulos brasileiros negociados no exterior e os pagos pelos papéis dos EUA), que caiu 5,09% e encerrou o dia a 261 pontos centesimais. E blindou o mercado de câmbio contra um dia bastante negativo globalmente: o dólar fechou em queda de 1,44%, cotado a R$2,251, enquanto a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) despencou 3,17% (36.746 pontos), o Dow Jones, da Bolsa de Nova York, caiu 1,77% e o Nasdaq, 2,24%.

¿ A recompra foi uma boa notícia, já que o mercado está volátil e Tesouro e Banco Central vêm adotando posição ativa, dando liquidez ao mercado ¿ diz Ronaldo Guimarães, sócio da Cenário Investimentos. ¿ Mas, como o problema no mercado agora é global, o impacto no risco-Brasil não será potencializado por muito tempo.

Estrangeiros deixam Bolsa, mas saldo ainda é de R$1,7 bi

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse à agência Bloomberg News que essa operação vai estimular a confiança dos investidores no Brasil:

¿ As recompras ajudam a reduzir o risco do país e melhoram o perfil da dívida.

Para o economista Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management, a decisão foi correta porque o governo está tirando uma parcela das reservas internacionais, que estão em torno de US$63,5 bilhões, para reduzir dívidas caras:

¿ As reservas estão altas demais. E, com a medida, o governo também segura outros ativos, dá um sinal de que tem muita ¿bala¿ para gastar.

O economista da consultoria Tendências Guilherme Maia disse que, ao definir melhor a curva de juros, o governo dá mais transparência ao mercado e melhora a imagem do Brasil junto aos investidores estrangeiros.

O leilão de recompra começou ontem e só termina na quinta-feira. O resultado será divulgado na sexta-feira. Os títulos envolvidos na operação somam US$23 bilhões. Em fevereiro, o Tesouro trocou títulos Global 2030 ¿ que distorciam a curva de juros ¿ por Global 2034, num total de US$205 milhões, com um ganho financeiro de US$1,2 milhão.

No início do ano, o governo já tinha anunciado que faria em 2006 o resgate antecipado de US$20 bilhões de títulos com vencimento até 2010 e da dívida reestruturada (os bradies). Até agora, foram gastos US$11,7 bilhões. Além disso, no fim de 2005 o Tesouro pagou antecipadamente US$15,5 bilhões ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e US$2,6 bilhões ao Clube de Paris. Houve também a troca de C-Bonds, um dos tipos de bradies, por A-Bonds, e a primeira emissão soberana em reais no mercado externo.

No mercado financeiro, no início da tarde, o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Ben Bernanke, elevou a temperatura ao afirmar que a economia dos EUA está assumindo um ritmo mais lento de crescimento, mas que ainda é preciso atenção para manter a inflação sob controle. Ele disse que, se o núcleo de inflação continuar no nível atual, o índice ficará no topo da faixa que ele considera condizente com a estabilidade dos preços.

A turbulência global começou em 10 de maio, quando o Fed subiu os juros de 4,75% para 5% ao ano e sinalizou novas altas. Isso vem levando investidores a retirarem dinheiro de mercados emergentes, como o Brasil, para investir em papéis americanos, mais seguros. Em maio, o saldo de investimentos estrangeiros na Bovespa ficou negativo em R$ 1,5 bilhão, resultado de vendas de ações no valor de R$ 27 bilhões e de compras de R$25,5 bilhões. No ano, porém, o saldo está positivo em R$1,7 bilhão.

A participação dos estrangeiros no volume financeiro total subiu de 35,58% para 40,66% em maio, o maior patamar já registrado na Bovespa.

Mas essa turbulência não pesou na expectativa de inflação, segundo a pesquisa semanal ¿Focus¿, do Banco Central, com cerca de cem instituições financeiras. A estimativa para o IPCA recuou de 4,32% para 4,31%. A meta do governo para este ano é de 4,5%.

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