Título: CHORADEIRA E RECORDES
Autor: Lino Rodrigues
Fonte: O Globo, 07/06/2006, Economia, p. 21

Montadoras reclamam do câmbio e ameaçam demitir, mas exportação e vendas dão salto histórico

Ao mesmo tempo em que grandes montadoras, como a Volkswagen e a General Motors (GM), anunciam planos de demissão de trabalhadores em fábricas brasileiras, o setor automotivo apresentou em maio o maior volume de produção mensal da História no país. Desde agosto do ano passado, quando 230 mil veículos saíram das linhas de montagem, a produção não registrava números tão vistosos. Dados divulgados ontem pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) mostram que 245,2 mil veículos foram produzidos no mês passado, um salto de 20,1% sobre abril (204,1 mil) e novo recorde do setor.

Entre janeiro e maio, as montadoras acumulam 1,081 milhão de unidades produzidas, número 6,1% o maior que o do mesmo período de 2005 (1,018 milhão). Depois de um abril ruim devido à sucessão de feriados, as vendas de carros no mercado interno retomaram o fôlego.

No mês passado, o número de licenciamentos de automóveis zero quilômetro cresceu 25,1% ¿ 164 mil unidades foram comercializadas nas concessionárias. Esse número só perde para o de maio de 1997, quando 175 mil unidades foram vendidas.

GM e Volkswagen anunciam cortes

Mas a ironia do mês de maio ficou por conta do comportamento das exportações. Logo no início do mês, a Volkswagen creditou ao dólar fraco a necessidade de reduzir em 80 mil unidades o número de veículos que exporta anualmente, medida que levaria à demissão de quase 6.000 empregados nas fábricas brasileiras. No entanto, as vendas externas do setor naquele mês mostraram vigor surpreendente.

Também em maio a GM anunciou que demitiria quase mil empregados de sua fábrica em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, para se manter competitiva. Dirigentes da Anfavea foram, ainda, a Brasília reivindicar do governo medidas para aliviar os estragos do câmbio nas suas contas.

Por fim, os números divulgados ontem pela mesma Anfavea mostram que as montadoras faturaram US$1,058 bilhão com exportações em maio, que representou um salto de 16,7% ante o mês anterior e um novo recorde do setor.

Em abril, realmente houve uma queda de 9,4% nas vendas externas na comparação com março, mas nos cinco primeiros meses do ano os embarques de veículos ao exterior já renderam US$4,6 bilhões aos fabricantes, valor 8,6% maior que o registrado no mesmo período de 2005, de US$4,2 bilhões. Novamente uma marca sem precedentes na indústria.

¿ É o melhor resultado acumulado da História, o melhor mês, porém, com desaceleração bastante clara ¿ tentou atenuar o presidente da Anfavea, Rogelio Golfarb.

Vendas internas vão crescer 7,1% no ano

O executivo atribuiu os valores recordes ao fato de as empresas estarem ajustando os preços dos carros vendidos lá fora por causa do dólar, mas há uma redução nos volumes embarcados. Em relação a maio do ano passado, segundo Golfarb, houve uma queda de 3,2% no número de unidades exportadas.

O presidente da Anfavea disse estar preocupado com a diminuição da competitividade das exportações brasileiras devido à valorização do real, e que teme que o mercado interno não tenha fôlego para absorver o que deixar de ser vendido ao exterior. Segundo ele, as vendas externas representam hoje 33% do faturamento do setor e vêm apresentando taxas de crescimento menores.

¿ O câmbio não é mais o diferencial para exportar. Precisamos avaliar como trabalhar nossa competitividade para ela se manter ¿ disse Golfarb, referindo-se a medidas alternativas, como a maior oferta de crédito do BNDES às exportações de veículos, a custos menores, que o setor vem negociando com o governo.

Apesar das projeções de maior crescimento da economia, da expectativa de continuidade da redução nas taxas de juro, com a inflação convergindo para a meta, a Anfavea não alterou suas projeções para produção, vendas e exportações da indústria automobilística divulgadas no fim do ano passado. A entidade espera um incremento de 7,1% nas vendas internas de veículos, uma alta de 2,7% nas receitas com exportações e um salto de 4,5% na produção.

Mas os números da Anfavea em maio guardavam ainda uma outra surpresa: a participação de carros bicombustíveis (movidos a álcool e gasolina) no total de vendas do mês registrou ligeiro declínio: responderam por 76,3% do total, contra 76,8% em abril.