Título: BID VAI MUDAR A POLÍTICA DE CRÉDITO
Autor: Martha Beck
Fonte: O Globo, 07/06/2006, Economia, p. 23

Objetivo é financiar projetos para reduzir a pobreza

WASHINGTON. Ao descobrir, ao final de um estudo de campo, que embora tenha obtido estabilidade macroeconômica, a América Latina ainda não conseguiu o suficiente para resolver os problemas de quem vive na pobreza, o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luis Alberto Moreno, decidiu alterar a política da casa. A partir da próxima segunda-feira ¿ e pelo menos até 2011 ¿ a instituição dará mais atenção à derrubada dos obstáculos que impedem que a maioria dos latino-americanos possam melhorar a sua qualidade de vida.

¿ Creio que é hora de adotar um novo enfoque: menos macro e mais micro ¿ disse Moreno, ao anunciar o programa batizado como ¿Oportunidades para a Maioria¿.

A perspectiva é a de que o BID investirá até US$8 bilhões anuais em projetos que beneficiem diretamente a faixa da população que vive com até o equivalente a cerca de US$272 mensais (US$3.260 anuais). E esse grupo, como mostrou o estudo encomendado pelo banco, abrange 70% dos habitantes da América Latina e do Caribe e, por isso, está sendo definido pelo banco como a ¿base da pirâmide econômica¿. Ou seja: são 360 milhões de pessoas. Dessas, 115 milhões estão no Brasil.

¿ O que estamos vendo é que ser pobre acaba custando caro, não só porque a renda dessas pessoas é baixa mas por causa de oportunidades e energias perdidas ¿ disse.

Outra descoberta do BID é que, ironicamente, os pobres latino-americanos têm em mãos uma fortuna ¿ mas ela, em termos práticos, não vale nada, a menos que venha a ser colocada no mercado formal. Trata-se do que o banco define como ¿capital morto¿. Cálculo preliminar feito em 12 países mostrou que os bens dessa população somam US$1,3 trilhão. E a estimativa é de, ampliando esse levantamento e incluindo Brasil, Chile, Venezuela, Paraguai e alguns países centro-americanos, o total suba para US$2,5 trilhões.

Essa fortuna está imobilizada, fora do mercado porque 75,6% das propriedades rurais e 65% das casas não possuem registro legal. Sem contar que 91,7% das empresas ¿ micro e médias ¿ funcionam fora da economia formal. São 23 milhões de firmas na região.

¿ Nada menos que 65% das casas estão excluídas dos mercados imobiliários formais. Trinta milhões de famílias vivem em casas deficientes. Setenta milhões carecem de serviços de eletricidade confiáveis, 105 milhões não têm água potável, 153 milhões não têm saneamento, 90% dos microempresários não têm acesso a crédito, mais de 60% dos lares não têm telefone, só 15% têm acesso à internet. Chegou a hora de fazer por essa gente algo diferente do tradicional, financiar projetos específicos para suprir as suas necessidades básicas ¿ disse Moreno. (José Meirelles Passos, correspondente)