Título: POR QUE O PIB CRESCE POUCO
Autor: PAULO FRANCINI
Fonte: O Globo, 09/06/2006, Opinião, p. 7

OBrasil necessita com urgência de crescimento econômico mais elevado, como meio de incrementar a renda média da população e satisfazer às elevadas demandas sociais. Nos últimos dez anos, o mundo tem presenciado expansão econômica excepcional, países emergentes como China e Índia cresceram a taxas médias de 8,6% e 6,2% ao ano, respectivamente, enquanto o Brasil cresceu em média 2,4%.

A continuidade do processo de desenvolvimento de economias emergentes, como é o nosso caso, depende em sua essência do desempenho econômico da atividade industrial. Ao se considerar o crescimento econômico de uma amostra de 27 países no período de 1975 a 2002, verifica-se que 1% de expansão da indústria implica crescimento do PIB de 1,8%. No caso do setor de serviços e da agropecuária, o impacto no PIB é de 1,4% e 0,4%, nessa ordem.

Países hoje desenvolvidos, como os da Europa Ocidental, Estados Unidos e Japão, experimentaram um período no qual o intenso crescimento e a diversificação do setor industrial foram o motor do crescimento do PIB. Nesse período aumentou a participação da indústria no PIB, parcela significativa do emprego foi direcionada para a indústria e cresceu fortemente a produtividade dos trabalhadores, a balança comercial e o setor de serviços. Como resultado, assistiu-se ao aumento do PIB per capita desses países, o que é uma medida importante dos ganhos de padrão de vida da população. Crescimento não impulsionado pela indústria é possível, mas exige um setor de serviços dinâmico, intensivo em tecnologia e com forte inserção internacional, como é o caso da Índia, por exemplo.

No Brasil, a indústria tem registrado desempenho sofrível nos últimos 25 anos. Na década de 70, o crescimento médio anual foi de 9,30%. Na década seguinte, caiu para insignificantes 0,23%. Na década de 90, o crescimento industrial subiu para a média de 2,05% ao ano e, de 2000 a 2005, situou-se em 2,14%. A indústria perdeu seu dinamismo e não se constitui qualquer setor com capacidade de puxar o restante da economia, como a indústria fez até os anos 80.

O fraco dinamismo da indústria no Brasil é reflexo direto das restrições provocadas pelo ambiente em que ela está inserida. Entre as principais barreiras ao crescimento, pode-se destacar a elevada taxa de juros, a alta carga tributária, a taxa de câmbio volátil e sobrevalorizada por longos períodos, a escassez de crédito ao setor privado e o baixo investimento público.

Toda atividade econômica é no fundo uma arbitragem entre custo de capital e retorno financeiro. Há anos os juros no Brasil são extremamente elevados quando comparados com os de qualquer outro país, o que onera demasiadamente as operações de qualquer empresa e reprime novos investimentos.

A valorização da nossa moeda frente ao dólar para os níveis próximos de R$2 certamente trará conseqüências dramática para os setores produtivos. Apenas no período de maio de 2004 até o fim de abril de 2006, a moeda brasileira se valorizou 33%, a maior alta entre os países emergentes e desenvolvidos. Além do problema da valorização, a taxa de câmbio é bastante volátil, o que afeta negativamente o ambiente de negócios e também inibe potenciais investimentos.

Outro grande empecilho ao desenvolvimento está relacionado ao ônus que o setor público impõe ao setor privado brasileiro. De 1995 a 2004, o crescimento real médio dos gastos primários do governo federal foi de 5,5% ao ano, enquanto o da receita primária foi de 5,6%. Dados do Tesouro Nacional mostram que em 2005 o problema se agravou: a receita da União registrou crescimento real de 11,5%, quando comparada com a de 2004 (utilizando o IPCA como deflator), e as despesas subiram 10,9%. O Estado brasileiro gasta muito e gasta mal. A superação destes problemas exige reformas constitucionais abrangentes e mudanças na gestão dos recursos públicos.

Em conseqüência do crescimento do gasto público tem-se a alta incessante da carga tributária, que era de 24% no início dos anos 90 e no ano passado foi maior que 38%. Países com forte crescimento da renda per capita têm carga tributária abaixo de 25% do PIB. Em países latino-americanos, a tributação é da ordem de 20%.

A dívida líquida do setor público brasileiro é de cerca de 51% do PIB, enquanto o total do crédito bancário ao setor privado gira em torno de 30%. Na China e na Coréia, por exemplo, o crédito privado supera 100% do PIB. A redução do endividamento público é condição importante para o aumento do crédito privado e o declínio das taxas de juros ao tomador final. Por sua vez, os investimentos do governo há muitos anos perderam a relevância e se situam em aproximadamente 0,8% do PIB, taxa muito baixa considerando a carência de infra-estrutura adequada no Brasil.

Assim, para a indústria voltar a crescer e ajudar a alavancar o desenvolvimento, é necessário começar a criar condições propícias. Não há outra saída ao país que não seja a de viabilizar políticas que conciliem crescimento econômico, estabilidade monetária e uma eficiente gestão fiscal.

PAULO FRANCINI é diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).