Título: REFORMA UNIVERSITÁRIA CHEGA AO CONGRESSO
Autor: Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 09/06/2006, O País, p. 12

Lei enviada pelo governo tenta livrar instituições federais de cortes de verba e elevar qualificação de professores

BRASÍLIA. Após dez meses de debate interno no governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou ontem ao Congresso o projeto de lei da reforma universitária. O texto tem entre os principais objetivos livrar as universidades federais do risco de cortes orçamentários e ainda elevar as exigências mínimas de titulação de professores e de oferta de pós-graduação para o funcionamento de universidades públicas e privadas.

A proposta estabelece critérios para a redistribuição dos recursos entre as universidades federais. A idéia é condicionar parte dos repasses a indicadores como o número de estudantes, a produtividade em termos de pesquisa e patentes registradas e o desempenho nas avaliações oficiais.

O texto aumenta as exigências para o funcionamento de universidades, o que atinge em cheio o setor privado. Embora a Constituição diga que a atividade de pesquisa é obrigatória, grande parte das universidades particulares e mesmo algumas públicas não oferece nenhum curso de doutorado, o tipo de pós-graduação cuja finalidade maior é produzir novos conhecimentos. Pela proposta, para manter o status de universidade e ter autonomia para criar cursos e campus sem autorização específica do MEC, as instituições deverão criar pelo menos três cursos de mestrado em seis anos e um de doutorado, no prazo de oito anos. Pelo menos 25% dos professores deverão ser doutores, totalizando no mínimo 50% de mestres e doutores.

A proposta elaborada pelo Ministério da Educação (MEC) estava no Planalto desde julho do ano passado. Era a terceira versão do texto, após um ano e meio de debate com a comunidade acadêmica, sindicatos patronais, de empregados e movimentos sociais. O projeto dividia o governo e por isso demorou a ir para o Congresso.

Texto dá R$1 bilhão a mais para universidades

A quarta versão, encaminhada ontem, contém pontos em que a visão do MEC prevaleceu e outros em que o pleito do ministério não foi atendido. A principal vitória, do ponto de vista do MEC, foi garantir a subvinculação para as universidades federais de 75% dos recursos que devem obrigatoriamente ser aplicados em educação ¿ 18% da arrecadação com impostos federais. Isso evitaria cortes orçamentários, além de aumentar em cerca de R$1 bilhão os recursos disponíveis para as federais. O MEC não conseguiu, porém, repassar para o Ministério da Saúde despesas de cerca de R$1 bilhão com a manutenção dos hospitais universitários ¿ que prestam serviços de saúde à população, além de servir de hospitais-escola.

¿ O projeto de lei não busca o consenso, o que é impossível no ensino superior no mundo inteiro. O debate vai amadurecer no Congresso ¿ disse o ministro da Educação, Fernando Haddad.

O governo não tem pressa na votação da proposta, tanto que dispensou o pedido de urgência para a tramitação no Congresso. A polêmica proposta de cotas, com reserva de 50% das vagas para alunos do ensino médio na rede pública, desapareceu do texto. Haddad enfatizou que não se trata de um recuo, uma vez que outro projeto já aborda o assunto nos mesmos termos e foi aprovado nas comissões temáticas da Câmara, aguardando votação em plenário para seguir depois ao Senado.

Dirigentes das federais criticam o texto

A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) criticou o projeto e anunciou ontem, em encontro com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que apresentará seis emendas no Congresso. Os reitores, a exemplo do MEC, querem repassar para outras áreas do governo as despesas com hospitais universitários e maior autonomia financeira. O presidente da Andifes, Paulo Speller, disse que o projeto mantém o impedimento para que as instituições arrecadem dinheiro mediante convênios sem autorização do MEC, assim como para a reutilização, no ano seguinte, de recursos não-gastos até 31 de dezembro de cada ano. A Andifes pede também o fim da lista tríplice elaborada após eleição direta nas universidades e submetida ao presidente. A entidade quer que o mais votado seja automaticamente empossado.

Speller disse ter ficado satisfeito com o encontro com Lula, ao perceber que o governo estaria aberto a mexer no texto no Congresso.

¿ A proposta do governo não é fechada, é mais um documento básico para ser aperfeiçoado. Temíamos uma posição rígida do governo, mas o presidente Lula demonstrou estar aberto à discussão.