Título: Ata e desata
Autor: Míriam Leitão
Fonte: O Globo, 09/06/2006, Economia, p. 30

A inflação está abaixo da meta, os juros vão continuar caindo, a turbulência externa é transitória, a gasolina não vai aumentar e o crescimento econômico pode ser maior porque nem todo o efeito da queda dos juros foi passado para o nível de atividade. Essa coleção de notícias boas estava ontem na ata do Copom. Claro, continuou avisando que vai reduzir os juros com a tal da ¿parcimônia¿, mas nenhuma ata é perfeita. Numa reunião em São Paulo com economistas do mercado, o BC confirmou que trabalha com ¿um cenário benigno¿ para a economia.

Enquanto isso, na política, ontem foi mais um dia de pânico até que, à noite, o TSE emitiu o sinal de que fica tudo como dantes: a verticalização é pela metade, até que caia por inteiro na próxima eleição. A arguta pergunta de Tereza Cruvinel, ¿para que numa hora dessas?¿, não quis calar. O TSE deu o entendido por desentendido. Mas, enquanto não veio o alívio, os políticos começaram a olhar seus próprios interesses e se surpreenderam, na opinião de Amaury de Souza:

¿ Feitas as contas, PFL e PMDB estão juntos em 12 estados, mais do que as alianças entre PFL e PSDB, ou seja, faria mais sentido uma candidatura PMDB-PFL.

A quatro meses das eleições, a política ferve. O presidente do PT, Ricardo Berzoini, disse que o Partido dos Trabalhadores não ajudou a financiar o gasto de R$80 mil para preparar o vandalismo no Congresso. Era só mesmo o que faltava. Resta saber quanto o governo transfere para o MLST.

Tudo isso é política. Terreno pantanoso. Voltemos à economia. A ata de ontem do Copom mostrou que o Banco Central tem uma avaliação muito mais moderada do que vários outros economistas sobre o cenário econômico internacional. O Comitê acha que há ¿baixa probabilidade¿ de ocorrer ¿um cenário de deterioração significativa que comprometa as condições de financiamento da economia brasileira¿. Ou seja, a crise não será grande a ponto de faltarem dólares para o Brasil. E isso por dois motivos: a economia mundial continua crescendo e os nossos fundamentos externos estão sólidos. Um dado: o nosso superávit em transações correntes é hoje de US$12,8 bilhões.

A inflação continua em queda, disse o Banco Central, e ontem mesmo foi confirmado pelos fatos. O IPCA de maio foi até menor do que o previsto e já se esperava um número baixo. Deu 0,1%, levando o acumulado em 12 meses para 4,23%. Após a divulgação, já havia banco revendo a inflação do ano para 4%.

O petróleo está com um preço alto e, pior, volátil, avisou o BC. Mas, mesmo assim, ele não vê risco de os preços dos combustíveis subirem aqui no Brasil, e projeta 0% de aumento este ano. Para quem está concorrendo à reeleição, é uma maravilha! O Banco Central admite que a principal mudança em relação ao cenário avaliado na última reunião do Copom é o quadro externo, que está numa fase de ¿volatilidade expressiva¿, mas acha que é passageiro. Tomara seja.

A diretoria do Banco Central fez ontem uma das costumeiras reuniões com os economistas do mercado. Os diretores e o presidente disseram que ouviriam mais do que falariam. No que falaram, fizeram três pontos.

Primeiro, o nível de atividade está se recuperando. Na ata, eles haviam dito que normalmente demora um pouco para que a queda dos juros influencie o aumento do ritmo da economia. Que ainda nem todo o efeito ocorreu, dos quatro pontos percentuais de queda na taxa básica. Na reunião, disseram que o crescimento está sendo puxado pelo mercado interno, por consumo das famílias, do governo e investimento. Avisaram que o segundo trimestre vai dar a falsa impressão de uma desaceleração forte de crescimento, porque o segundo trimestre do ano passado foi bem forte e, quando for comparado trimestre contra trimestre, haverá um número fraco. Já no terceiro trimestre será o contrário; coisas da estatística. O fato concreto mesmo é que o país está crescendo mais do que no ano passado. O Ipea, como se viu, acredita em 3,8%.

Segundo, avisaram que a inflação está baixa, mas a deste ano parece mais baixa do que a do próximo ano. Pelo regime de metas de inflação, o Banco Central age com um horizonte mais largo. Ou seja, isso pode conter a queda dos juros. Mas alguns economistas que estavam no encontro continuam apostando em queda de 0,5 ponto percentual na próxima reunião.

Terceiro, a turbulência externa é transitória. O crescimento mundial será menor, haverá mais aversão ao risco, mesmo assim, isso não é considerado crise. Acham que está havendo uma convergência para um cenário normal, sem tanto aquecimento e liquidez como nos últimos anos.

Alguns economistas ponderaram que o nível de atividade vai bem, de fato, mas que é preciso separar o que é crescimento permanente do que é apenas efeito do aumento dos gastos públicos por razões eleitorais. Aliás, o assunto mais falado na reunião com o Banco Central foi exatamente a preocupação geral com o aumento dos gastos. O governo está aprovando aumentos que terão efeito permanente sobre as contas públicas.