Título: ATÉ 2010
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 13/06/2006, O País, p. 4

A disputa de 2010 continua influenciando a campanha tucana deste ano. Setores mais radicais do PFL, liderados pelo prefeito do Rio, Cesar Maia, se ofenderam com o ¿esquecimento¿ do governador de Minas Gerais, Aécio Neves, quando citou os partidos ¿democráticos¿ com os quais gostaria de fazer uma aliança política em torno de um projeto nacional.

Aécio citou ¿setores do PT¿ e PPS, PSB e PMDB, sem incluir na lista o PFL. Cesar Maia promete ¿chuvas e trovoadas¿ se o governador de Minas não se desculpar, mas mesmo que isso venha a acontecer, será mais por cortesia do que por vontade de ter o PFL como parceiro de sua caminhada rumo à Presidência em 2010.

Certamente Aécio deve ter lamentado muito mais não ter relacionado o PDT entre os ¿partidos democráticos¿ do que o ¿esquecimento¿ do PFL. O fato de não ter sido citado pelo governador de Minas não impediu que ontem o PDT selasse um acordo para apoiar sua reeleição, formando talvez o mais amplo arco político que será organizado nas próximas eleições, prenunciando o que será a corrida presidencial de 2010.

Na verdade, o que Aécio começa a montar é um cenário político idêntico ao que conseguiu montar em Minas desde sua primeira eleição, em 2002. Com esse amplo leque de apoios à esquerda, ele tentará neutralizar a força política que José Serra terá dentro do partido caso se confirme sua eleição para governador de São Paulo. Não foi por acaso que ele não citou o PFL, mas porque pretende dar à sua candidatura uma tonalidade mais próxima da social-democracia, para se colocar como a opção preferencial do PT caso o partido, como tudo indica, fique sem capacidade de lançar candidato à sucessão de Lula.

Se o senador Aloizio Mercadante se elegesse, certamente essa possibilidade de o PT vir a apoiar uma candidatura de Aécio iria por água abaixo. Mas também, com Serra derrotado em São Paulo, o governador de Minas não teria problemas dentro do PSDB para ser indicado o candidato do partido à Presidência. Em situação normal, porém, tanto Serra quanto Aécio serão eleitos em seus estados, transformando-se em potenciais a sucessores de Lula, e cada um terá que mostrar sua força política para ser o escolhido. Se já foi difícil a disputa interna entre Serra e Alckmin, mais difícil ainda será a briga entre os governadores dos dois maiores colégios eleitorais do país.

A capacidade de agregar apoios partidários às suas candidaturas será essencial para uma definição, e nesse campo Aécio Neves sai na frente, ou para se candidatar pelo PSDB dentro de um amplo espectro político, que poderia até mesmo contar com o PT, ou ter condições de sair candidato de um outro partido, como o PMDB, levando consigo esse arco partidário.

Esse, aliás, é o projeto prioritário do governador de Minas: passada a campanha, trabalhar para que PT e PSDB tenham um clima não radicalizado que permita não apenas acordos localizados para a aprovação de reformas estruturais que serão enviadas ao Congresso ¿ nova reforma da Previdência, reforma tributária, reforma política ¿ como, a longo prazo, permita a retomada do projeto de fazer uma aliança com o PT.

Por essas trapaças do destino, que na política são muito mais comuns do que imagina, o PFL nacional, que boicotou a candidatura de José Serra à Presidência em 2002, hoje preferia a candidatura Serra à do governador Geraldo Alckmin, e é visto como um aliado do ex-prefeito paulistano. Todas essas manobras de bastidores mostram apenas que a eleição presidencial de 2006, para os tucanos, já são favas contadas a favor de Lula. A única maneira de o candidato Geraldo Alckmin mobilizar um apoio mais decidido em Minas e em São Paulo seria abrir mão da possibilidade de reeleição, o que já havia sido conversado durante as negociações para a escolha do candidato tucano.

O governador Aécio Neves foi quem lançou a idéia de um compromisso entre os candidatos para encerrar a experiência da reeleição, ampliando o mandato presidencial para cinco anos. O presidente Lula chegou a ser sondado, e deu sinais de que aceitaria discutir a questão. Ele não perderia nada, pois poderia se recandidatar e ainda tinha a chance, que hoje parece enorme, de se reeleger para um mandato ainda maior do que o primeiro.

A manobra não ganhou corpo exatamente porque todos os mandatos teriam que ser ampliados, e houve uma reação grande. Hoje, o instituto da reeleição só beneficiaria, em tese, o ex-governador Geraldo Alckmin, caso eleito. Por isso, o que pedem é que ele se contente com um único mandato de quatro anos, abrindo mão da reeleição e se comprometendo a aumentar o próximo mandato para cinco anos.

Uma proposta quase indecente, que só faria diminuí-lo, nessa já difícil tentativa de vencer a corrida presidencial contra Lula. Tudo indica, porém, que se Lula confirmar seu favoritismo, a reforma política que será discutida incluirá o fim da reeleição e o aumento do mandato presidencial para cinco anos, a partir da eleição de 2010. Caso Alckmin consiga virar o jogo, mesmo sem o apoio explícito de Serra e Aécio, certamente não será ele quem acabará com a reeleição.