Título: Da Zona da Mata, 11 irmãos partiram para cortar cana em outras regiões
Autor: Leticia Lins
Fonte: O Globo, 18/06/2006, Economia, p. 30

Migração representa única oportunidade de trabalho formal para lavradores

SÃO BENEDITO DO SUL e MARAIAL (PE). Joana Leopoldina da Silva, 69 anos, trabalhou duro na enxada para criar 18 filhos. Dos 12 que sobreviveram, 11 deixaram o sítio Alto Bonito, no município de São Benedito do Sul, a 179 quilômetros de Recife. Partiram em busca de trabalho formal em estados como São Paulo, Mato Grosso do Sul e Bahia. Quatro fixaram residência nesses locais. Os demais vão e voltam, ao sabor das entressafras. Quando termina a moagem de cana em Pernambuco, viajam para os outros estados para trabalhar nos canaviais, onde desfrutam, segundo eles, da única chance de ter carteira assinada.

Acabada a colheita, retornam a São Benedito, com alguns trocados a mais no bolso, inclusive o FGTS. Na última semana, Joana estava com quatro filhos em casa. Três já moraram em São Paulo. O mais velho, Manuel Justino, tentou a vida no Sul, não gostou e retornou à área rural de uma cidade vizinha.

Dois de seus irmãos ¿ Benedito Justino (28 anos) e Amaro Justino (33) ¿ vivem em eterno vai-e-vem. O primeiro começou pelos municípios vizinhos, até que o trabalho nos engenhos escasseou. Resolveu ir para a Bahia, onde ficou por quatro anos cortando cana. Em 2002 voltou e no ano seguinte foi para São Paulo. Contratado por uma prestadora de serviço, trabalhou para três usinas, sempre registrado.

¿ Dava para tirar mais dinheiro do que cá, mas a despesa também era muito grande e ainda enviava dinheiro para a família. Ficava sem quase nada e decidi voltar.

O irmão, Amaro Justino, já foi cinco vezes a São Paulo e uma à Bahia. Diz que não encontra emprego fixo na área rural de Pernambuco. Só biscate ou trabalho clandestino.

Em Maraial ¿ a 159 quilômetros da capital ¿ quase todo cortador de cana tem uma experiência migratória. Severino da Silva Santos, 30 anos, cortou cana em Mato Grosso do Sul no ano passado. Retornou em setembro para a safra açucareira em Pernambuco. Afirma que ¿lá no Sul¿ um lavrador fatura entre R$350 e R$370 a mais do que ¿os fichados¿ (com carteira assinada) recebem em Pernambuco.

Segundo o secretário de Política Salarial da Federação de Trabalhadores Rurais de Pernambuco, José Rodrigues, um cortador ganha R$355 no estado. Mas tem que cortar três toneladas de cana por dia. Como o terreno da Zona da Mata é acidentado, os lavradores não conseguem cortar tanto quanto nos campos planos de São Paulo ou Rio de Janeiro.