Título: CATALUNHA VOTA PARA DECIDIR SOBRE AUTONOMIA
Autor: Priscila Guilayn
Fonte: O Globo, 18/06/2006, O Mundo, p. 35

Referendo sobre Estatuto que aumenta independência de região espanhola deve terminar com aprovação do `sim¿

MADRI. Já aprovado pelo Parlamento espanhol, o novo Estatuto catalão passa hoje pela apreciação popular. Num referendo, os catalães dirão se estão ou não de acordo com o texto constitucional que amplia a autonomia da Catalunha. Segundo uma pesquisa do Centro de Investigações Sociológicas (subordinado ao Ministério da Presidência, equivalente à Casa Civil, no Brasil), a participação deverá ser de 55,1% e o ¿sim¿ deverá ganhar com 74,8% dos votos.

Depois de cerca de dois anos com o Estatuto estampado diariamente em todos os jornais, existe um receio de que uma alta abstenção reflita o esgotamento e o desinteresse de grande parte da população catalã a respeito deste assunto.

¿ Pode ser que as pessoas tenham ficado cansadas. O processo de elaboração deste Estatuto acabou se prolongando demais, gerou conflitos, e isso pode ter distanciado a população. Os políticos, neste sentido, foram pouco inteligentes. Acredito que a participação será parecida à de 1979: 59% ¿ afirma Agustí Colomines, um dos porta-vozes da plataforma Estatut Jo Sí (Estatuto Eu Sim), fundada por intelectuais catalães, da qual já fazem parte mais de 1.600 pessoas.

Sistema fiscal e de justiça fortalecidos

O novo estatuto será mais generoso com a Catalunha que os anteriores de 1932 e 1979. Um dos principais pontos do novo documento se refere à ampliação do seu sistema fiscal, atribuindo à região a gestão de boa parte dos impostos recolhidos. Também será criado um Tribunal Superior de Justiça (última instância jurídica para processos iniciados na Catalunha).

¿ Um ponto muito importante é que o preâmbulo do Estatuto diz que Catalunha é uma nação. É a primeira vez que um documento jurídico espanhol reconhece uma nação, como é Catalunha, dentro da Espanha. Além disso, iguala a duas línguas (castelhano e catalão) ¿ afirma Colomines, historiador e diretor da Organização das Nações Unidas para Ciência, Educação e Cultura (Unesco) na Catalunha.

Mas se existe a campanha pelo ¿sim¿, apoiada pelo governo de Madri, também existe a pelo ¿não¿. E contra o novo Estatuto estão duas forças políticas completamente contrárias. De um lado, está o conservador Partido Popular (PP), na oposição ao governo. Do outo lado, está o nacionalista Esquerda Republicana da Catalunha (ERC). Ambos partidos vêm trabalhando contra a aprovação do documento. O PP, em sua ferrenha campanha contra a negociação do governo socialista com os nacionalistas, chegou a relacionar a aprovação do Estatuto catalão com o cessar-fogo anunciado pelo grupo separatista basco ETA. Ambos os passos ¿ tanto o Estatuto como um possível diálogo com ETA ¿ significam, na análise do PP, um perigo para o que chama de unidade espanhola.

Se o PP acha que Espanha está dando demais para os catalães, a insatisfação dos nacionalistas republicanos é, no entanto, porque consideram que com este Estatuto estão recebendo menos do que deveriam.

Governo catalão queria mais autonomia

O ERC, que governa a Catalunha em aliança com outros dois partidos de esquerda, ansiava por mais autonomia, o que seria um passo maior em direção à desejada independência. O presidente do ERC, Josep Lluís Carod-Rovira, conclamou os catalães a não deixarem de reivindicar a independência, pois assim Catalunha continuará avançando em direção à soberania:

¿ Para alguns, conseguir o Estatuto é um ponto final. Mas para nós é um ponto e vírgula.

Embora o ERC faça campanha pelo ¿não¿, o Estatuto está sendo apoiado por outros grupos independentistas. Militantes do também nacionalista Convergência e União estenderam uma bandeira catalã de 50 metros de comprimento pela Plaça Catalunya, em Barcelona, com um enorme ¿Sí¿ estampado. Favorável a este documento, o escritor Jordi Cabré, de 32 anos, afirma:

¿ A independência, sonhada pela nossa geração, passa inevitavelmente pelo passo à frente que este Estatuto representa.

Colomines opina:

¿ Eu sou independentista, não sou de nenhum partido político, e voto ¿sim¿. Na Catalunha existem independentistas em diferentes partidos ou que, simplesmente, não são de partido algum. O ERC, que começou fazendo campanha pelo voto nulo e acabou pedindo o ¿não¿ à população, representa apenas uma parte dos independentistas. E eles, agora mesmo e por conta disso, se igualaram ao PP.