Título: UM NOVO IMPASSE PRÉ-ELEITORAL
Autor: Demétrio Weber e Isabel Braga
Fonte: O Globo, 22/06/2006, O País, p. 3

Presidente do TSE diz que reajuste para servidor já está proibido e governo adia MP

Opresidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio de Mello, abriu ontem nova polêmica no meio jurídico e no Executivo ao dar uma interpretação da lei eleitoral que levanta suspeitas de ilegalidade nos reajustes salariais concedidos pelo governo a servidores. Marco Aurélio disse que a lei proíbe reajustes acima da inflação a menos de 180 dias da eleição, mesmo que o aumento seja específico para uma categoria ou decorra da reestruturação de carreiras. As declarações fizeram o governo suspender a edição de uma medida provisória, que seria assinada ontem, dando aumento para servidores.

Apesar de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrar tranqüilidade quanto à interpretação, o Planalto suspendeu temporariamente a edição de outras cinco medidas provisórias que pretendem concluir o plano de carreira de mais de 1,3 milhão de funcionários. A que seria assinada ontem beneficia 256 mil servidores de INSS, Inmetro, Fiocruz e IBGE. As outras atendem militares, Polícia Federal e Receita, entre outras carreiras.

A nova confusão suscitada pelo presidente do TSE teve origem em decisão tomada anteontem à noite pelo tribunal. Ao responder a consulta do deputado Átila Lins (PMDB-MA), o plenário do TSE entendeu que nenhum governo pode dar aos servidores aumento de salários acima da inflação nos 180 dias antes da eleição e até a posse dos eleitos. A dúvida era se o prazo seria de 180 ou 90 dias.

Segundo colegas de Marco Aurélio ouvidos pelo GLOBO, a consulta tratava especificamente do prazo de revisões gerais, deixando de fora aumentos para categorias específicas ou decorrentes de reestruturações de carreira. Para Marco Aurélio, porém, a regra vale para todo reajuste:

¿ Mais importante que o aspecto formal é o conteúdo. O que a lei veda é a possibilidade de se cooptarem eleitores mediante bondades. E essas bondades só são lembradas em época de eleições ¿ afirmou o ministro, antes da posse da nova ministra do Supremo Tribunal Federal, Carmen Lúcia Antunes Rocha.

Ministros discordam da interpretação

Para um ministro do TSE que pediu para não ser identificado, a decisão tratava exclusivamente do prazo para reajustes gerais e reafirmava que aumentos para categorias específicas ou mediante alteração no plano de cargos são proibidos apenas 90 dias antes da eleição (30 de junho).

O ministro José Gerardo Grossi, do TSE, teve o mesmo entendimento. Informado sobre o teor das declarações de Marco Aurélio, Grossi afirmou:

¿ Não é o que está escrito na lei.

É com base nessa resolução que o governo e o PT sustentam a legalidade da medida provisória de 31 de maio. O advogado do PT no TSE, Márcio Silva, alegou que a resolução 21.054, de abril de 2002, que diferencia os dois tipos de aumento, garante a ação do governo.

O ex-ministro do TSE José Eduardo Alckmin destaca que, na decisão de anteontem, o tribunal tratou apenas de datas.

¿ Não houve manifestação dos ministros sobre o significado do que seja a revisão geral das remuneração. Já há decisão antiga do TSE de que é possível conceder aumentos para uma categoria específica, de passivos que não foram pagos, por exemplo (no período eleitoral) ¿ disse Alckmin.

Os advogados do PFL estão analisando se a concessão dos aumentos setoriais pode ser, na verdade, uma maneira que o governo encontrou de burlar a legislação eleitoral.

Fazer para uma carreira específica é uma coisa, mas o governo está dando aumento a várias categorias ¿ disse o advogado do PFL, Admar Gonzaga.

No PSDB, os advogados também apontam a possibilidade de entrar com representação jurídica contra o aumento, mas alguns temem um efeito político negativo na campanha.