Título: PROMESSA DE DISTRIBUIR RENDA
Autor: Ilimar Franco e Soraya Aggege
Fonte: O Globo, 25/06/2006, O País, p. 3

Lula dirá que, se reeleito, vai aprofundar programas sociais sem mudar política econômica

Opresidente Luiz Inácio Lula da Silva elegeu a distribuição de renda como principal prioridade de seu segundo mandato na Presidência da República, caso seja reeleito, e vai prometer aos eleitores aprofundar programas e projetos voltados para a promoção social e econômica dos mais pobres. Este foi o tom do discurso preparado para a convenção de ontem do PT, com a promessa de fazer ¿distribuição de renda para que haja crescimento¿. Em busca da reeleição, a proposta de Lula é espantar o fantasma da ingovernabilidade e reafirmar que, se eleito, fará um governo de coalizão em que o PT compartilhará com outros partidos, entre os quais o PMDB, a responsabilidade de administrar o país ¿ e os cargos no governo.

Nos 19 programas que o presidente Lula terá no horário de propaganda eleitoral na televisão e no rádio, ele reafirmará a manutenção e a ampliação das políticas de distribuição de renda: aumento real do salário-mínimo, redução dos preços dos alimentos da cesta básica, maiores possibilidades de crédito para o consumo popular, financiamento da pequena propriedade e a agricultura familiar.

A crença do presidente Lula é que, ao se comprometer com o combate às desigualdades sociais, estará criando um ambiente favorável à realização do segundo compromisso que assumiu em seu discurso: o do ¿crescimento acelerado com estabilidade¿.

Ao mesmo tempo que promete crescimento, Lula quer afastar especulações de que daria uma guinada à esquerda com políticas, sobretudo na área econômica, baseadas no voluntarismo. Por isso a promessa de Lula de que não se afastará, no caso de um segundo mandato, de um governo baseado na ¿responsabilidade fiscal para manter a estabilidade¿.

O presidente não iria abordar o escândalo do mensalão nem a crise ética no PT e no governo. Mas a linha do seu discurso é uma resposta, na medida que ele promete fazer um governo de coalizão e se empenhar na aprovação de uma reforma política que fortaleça os partidos, mantendo a verticalização e instituindo a fidelidade partidária e o financiamento público de campanhas eleitorais.

Para afastar medo da ingovernabilidade

Lula procura afastar o fantasma de que seu segundo mandato poderia ser um caos, como prevê a oposição. Mesmo assim, é grande a preocupação entre petistas e aliados com a política de alianças que será montada para garantir a governabilidade, caso ele seja reeleito. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), teme que se repita o dilema do mandato atual, no qual o PT ocupa 75% dos cargos e tem apenas 25% dos votos da base parlamentar governista.

¿ Com o favoritismo eleitoral, sinto que é grande a tentação para reproduzir, num segundo mandato, o descompasso entre o eixo do poder e o eixo da governabilidade ¿ diz Aldo.

Para o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), a questão da governabilidade será também determinada pela forma como se der a reeleição, se ocorrer:

¿ Se o presidente se reeleger no primeiro turno, terá condições de cooptar segmentos do PSDB. Alguns tucanos tenderão a se aproximar para se colocar como alternativas para as eleições de 2010, quando Lula não será mais candidato.

A presença do PMDB reduzirá o espaço do PT e outros aliados, o que deve gerar tensões políticas. Diferentemente do que ocorreu no primeiro mandato, a histórica divisão entre os monetaristas e os desenvolvimentistas sobre a política econômica ocorrerá numa escala menor, diz o senador Aloizio Mercadante (PT-SP).

¿ A situação econômica do país é mais confortável do que há quatro anos e a margem de manobra da equipe econômica é maior. Isso resultará em menos tensão. Mas persistirá como grande tarefa do próximo governo melhorar a relação entre a dívida e o PIB. É necessário manter o compromisso com o ajuste fiscal ¿ avalia Mercadante, crítico da rigorosa política do ex-ministro Antonio Palocci.

O programa de governo não está pronto, mas o PT tem consenso: a política econômica conservadora, que chamou de ¿transitória¿ e acabou aplicada em todo o governo Lula, se repetirá num eventual segundo mandato. A lucratividade dos bancos, por exemplo, que o PT admite ter sido excessiva, ficará por conta do mercado. Segundo o presidente do PT, Ricardo Berzoini, mudanças mais significativas, como a redução dos juros e dos lucros bancários, só acontecerão se a sociedade usar brechas como incentivos para ampliar a concorrência:

¿ Não adotaremos políticas intervencionistas contra os bancos.

O presidente do PT admitiu que os bancos tiveram lucros excessivos durante o governo petista e que houve um crescimento, atingindo o patamar de 30% no último ano. Ele pondera, no entanto, que isso aconteceu mais em função das fusões e concentrações de bancos. E afirma que o governo poderá no segundo mandato ser mais eficiente, facilitando concorrências.

¿ É muito importante a ação do governo, mas sem voluntarismos. Há uma ordem jurídica no país. Mas uma prevenção contra a cartelização, por exemplo, será bem vinda no próximo governo ¿ disse Berzoini.

Outra fórmula que o PT pretende ampliar será a das cooperativas de crédito, que serão gradativamente mais liberalizadas, e da redução do custo do crédito nos bancos oficiais, também de maneira gradual.

¿ É claro que o governo vai atuar, mas a sociedade terá que agir junto, não aceitando abusos ¿ disse.

Berzoini argumenta que as divergências que o PT tinha sobre a política econômica estão praticamente zeradas. As alterações para um segundo mandato serão apenas para adaptações do programa de Palocci.

¿ Não faremos mudanças de linha na política econômica e sim um maior aproveitamento. Digamos que saímos de uma UTI, fomos para a internação hospitalar e agora faremos o tratamento doméstico, em casa ¿ diz Berzoini, ressaltando que o PT considera a fórmula de Palocci correta, necessitando apenas de equações nas ¿doses¿ utilizadas.

De acordo com a proposta petista, o Banco Central continuará sem autonomia. A redução da taxa de juros será apresentada como um ¿desejo¿, definiu Berzoini:

¿ A redução da taxa de juros deve acontecer gradativamente. Mas esse é um desejo que precisa ser fundamentado em análise econômica.