Título: ESTUDO SOBRE A ECONOMIA SUBTERRÂNEA
Autor: Alessandro Soler
Fonte: O Globo, 25/06/2006, Rio, p. 17

Instituto contrata FGV para elaborar avaliação trimestral da informalidade

A necessidade de estudar detalhadamente a extensão da informalidade no país levou o Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco) a contratar a Fundação Getúlio Vargas para elaborar um estudo permanente, que começa a ser publicado periodicamente ainda este ano, sobre a economia subterrânea. Serão cruzados dados desde 1995 para uma avaliação trimestral da evolução da informalidade. O estudo ficará a cargo do pesquisador Aloísio Campello, do Ibre.

¿ A informalidade tem implicações mais profundas do que parece. Trata-se de uma cadeia que sustenta um verdadeiro Estado pirata, com propinas, corrupção, mortes por disputas entre quadrilhas de contrabandistas e financiamento de campanhas de políticos que contribuem para a manutenção do status quo ¿ diz Emerson Capaz, presidente do Instituto Etco. ¿ Um exemplo da força do Estado pirata é o (megacontrabandista) Lao Kim Chong, que tinha uma banca de 15 dos melhores advogados e quase conseguiu hábeas-corpus no Supremo para se livrar da cadeia.

Emerson reconhece que prender camelô é ineficiente:

¿ É enxugar gelo. Tem que atacar a logística e ter em mente que a pirataria e o contrabando têm quatro pilares: alta carga tributária, Justiça lenta, burocracia e impunidade. Além disso, há consumidores, com surpreendente destaque para os de classe média e alta, ávidos por comprar e imersos numa frouxidão de valores.

`É uma espécie de busca tortuosa por cidadania¿

Professora da Escola Brasileira de Administração Pública da FGV, Sylvia Vergara tem outras ponderações sobre as causas da informalidade.

¿ É importante não se esquecer das pressões de uma sociedade consumista, que apela o tempo todo para a compra de bens. Ninguém quer ficar à margem. Uma pessoa de renda baixa tem lá seu celular, sua TV, seu DVD. Como é que ela não se põe à margem? Consumindo piratas. E faz gato da TV a cabo. É uma espécie de busca tortuosa por cidadania ¿ diz.

Para ela, os exemplos que vêm dos governantes não ajudam a interromper o ciclo:

¿ As pessoas pensam: ¿Ah, se eles podem roubar, sem punição, por que eu não posso?¿ Não se pode nem falar mais em marginalidade para esse tipo de comportamento. É cada vez mais a regra.

Para o sociólogo Inácio Cano, professor da Uerj, é fácil, para quem tem renda para consumir, condenar o uso de produtos piratas:

¿ As pessoas não têm acesso a emprego com carteira assinada. Isso é artigo em extinção. Se lhe derem essa opção, a maioria vai preferir ter acesso a isso e aos direitos, mesmo ganhando até um pouco menos. Recorrer à informalidade é o dia-a-dia de 20% a 25% da população, que moram em favelas, sem contrato, endereço, sem receber entregas, sofrendo discriminação, sem pagar impostos ¿ diz o professor.

O sociólogo defende a proliferação de programas que estimulem a adesão de consumidores de baixa renda.

¿ Que se expandam os programas de eletricidade, água, TV a cabo para os pobres. Em troca de pagar, há direito a assistência técnica. É preciso que o mercado se aproxime da renda das pessoas para conter a informalidade. As empresas, inclusive de grife, poderiam fazer linhas populares que tivessem a sua marca, para facilitar o acesso do consumidor de baixa renda.

Entidade apóia lançamento de linha popular por grifes

Nesse ponto, Cano encontra apoio até em representantes da indústria pirateada.

¿ Toda a conscientização e toda a fiscalização não serão eficazes se a indústria não se comprometer a criar linhas de produtos mais populares ¿ alerta Alexandre Cruz, do Fórum Contra a Pirataria. ¿ No fundo, todo mundo quer ter o produto original. Só precisa de meios para isso.