Título: VANTAGENS E RISCOS
Autor: LUIZ ANTONIO MAIA ESPÍNOLA DE LEMOS
Fonte: O Globo, 26/06/2006, Opinião, p. 7

Apesar da descoberta de importantes reservas de hidrocarbonetos em outros estados como Espírito Santo, Bahia e São Paulo, o Estado do Rio de Janeiro mantém a sua hegemonia no setor petrolífero no país, com a concentração de cerca de 80% da produção brasileira. O Rio tem também um importante papel no mercado de gás natural, com significativas reservas na Bacia de Campos e potenciais reservas na Bacia de Santos, na zona de abrangência do estado, além de um extenso ramal de distribuição de gás e de diversas termelétricas. O Estado do Rio é independente em relação ao resto do país e muito se falou que a crise boliviana pouco afetaria a região, que possui a maior frota de veículos movidos a gás natural veicular (GNV), uma vez que o estado é auto-suficiente nesta matéria-prima.

No entanto, com relação ao gás natural, é essencial que exista um planejamento de médio e longo prazos, principalmente devido a sua crescente importância na matriz energética brasileira ¿ o que é uma tendência mundial. Como blindagem a crises externas, existe sempre a alternativa de investimento em gás natural liquefeito (GNL), com a construção de plantas de regaseificação, e o estado, por sua posição geográfica, justifica, logisticamente, investimentos dessa natureza.

Duas outras alternativas, ainda não existentes no país, mas difundidas no exterior, são o armazenamento de gás em cavernas e a tecnologia do gas-to-liquid (GTL) que transforma o gás natural em combustíveis líquidos como o diesel ou para uso em célula combustível. O grande benefício da primeira alternativa, isto é, o armazenamento do gás, que dependerá de sua viabilidade econômica, é a possibilidade de criar um estoque estratégico desse combustível, suavizando, com isso, impactos nesse ramo da indústria resultantes de disputas envolvendo gasodutos, ou aumentos elevados da commodity por situações internacionais.

Ao longo dos últimos anos, assistimos a um verdadeiro boom de investimentos no estado e percebemos o retorno da importância da participação do Rio de Janeiro na economia brasileira, a reboque da indústria de petróleo e gás. Como exemplo, podem ser destacadas fábricas como a da Rio Polímeros, em Duque de Caxias, e novos projetos como a refinaria da Petrobras em Itaboraí, plantas de regaseificação para investimentos em GNL e até o desenvolvimento da indústria siderúrgica em Itaguaí, com projetos de Thyssen, Vale do Rio Doce e CSN, além da expansão do Porto de Sepetiba. Ademais, a indústria naval fluminense, depois de anos estagnada, também está sendo reestruturada e tem um futuro promissor.

Obviamente, as altas dos preços do petróleo no mercado mundial influenciam e viabilizam tais investimentos, principalmente por companhias independentes. Isso nos leva a acreditar que assistiremos a uma competição cada vez maior nas próximas Rodadas de Licitações da Agência Nacional do Petróleo (ANP).

Por outro lado, talvez falte ainda ao estado uma participação mais ativa no programa de fontes alternativas, principalmente quando se fala de biocombustível e álcool. Não podemos nos esquecer do potencial aqui existente, em especial no Noroeste Fluminense, para o desenvolvimento dessas indústrias. Sabemos que a região já foi grande produtora de cana, mas, infelizmente, perdeu muito espaço para São Paulo nas últimas décadas.

Um outro ponto crucial a ser discutido para permitir uma continuação do crescimento das atividades de petróleo e gás no estado é o regime tributário aplicado às operações de extração e produção de hidrocarbonetos. Dentre os incentivos fiscais hoje em vigor, o instrumento mais relevante para o desenvolvimento das indústrias fluminense e nacional é o regime aduaneiro especial de exportação e importação, o Repetro, que concede suspensão total dos impostos federais incidentes na importação de alguns bens destinados às atividades de pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás natural.

Nesse cenário, os estados também possuem fundamental importância para a efetivação do Repetro, uma vez que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) tem o potencial de onerar significativamente as operações de importação. Entretanto, o Estado do Rio de Janeiro deu um passo atrás nesse esforço conjunto ao editar, em 2002, a Lei Valentim, indo de encontro a um convênio, antes firmado entre todos os estados da federação, que desonerava de ICMS os bens abarcados pelo Repetro.

Caso essa lei, que vem sendo objeto de questionamento judicial por diversas empresas, continue vigorando, o Estado do Rio de Janeiro pode vir a perder grandes investimentos para outros estados como o Espírito Santo e São Paulo, que mantêm sua legislação tributária em conformidade com o Repetro.

Em suma, o Estado do Rio de Janeiro vem promovendo o desenvolvimento da indústria de petróleo e gás natural. Porém, para que possa permanecer na vanguarda nacional nesse setor, não basta deter as reservas. É de fundamental importância que o governo continue implementando os programas de fomento da indústria e que não se omita em incentivar a implementação de novas tecnologias e a utilização de energias alternativas. Somente dessa forma, e não através de aumento do impacto tributário, é que o estado conseguirá ampliar a base industrial e proporcionar o crescimento da oferta de empregos, que permitirá ao Rio consolidar papel de liderança no cenário econômico nacional.

LUIZ ANTONIO MAIA ESPÍNOLA DE LEMOS é advogado.

N. da R.: Excepcionalmente não é publicado hoje o artigo de Paulo Guedes.