Título: TSE: RIGOR E AMBIGÜIDADE
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 27/06/2006, O País, p. 2

Depois da redemocratização, nenhuma campanha eleitoral se deparou, como a deste ano, com tanta indefinição e confusão quanto às regras. Contribuiu o Congresso ao aprovar, faltando menos de um ano para o pleito, a chamada mini-reforma eleitoral. Contribui o TSE quando faz esclarecimentos incompletos sobre sua aplicação e adota comportamentos erráticos. Contribui o sistema de reeleição, que não foi bem regulamentado em 1998.

No espaço elástico entre o que é permitido e o que é proibido, alguns tribunais regionais eleitorais estão tomando iniciativas que podem piorar as coisas. Alguns TREs estão propondo aos partidos um acordo de cavalheiros que lhes permitiria obter aplicação mais branda das normas. TREs não podem interpretar a lei nem baixar normas. Devem zelar pela correta aplicação das instruções do TSE. Mas como este tem baixado normas imprecisas e agido de modo errático, abre espaço para isso.

Já foi um fiasco, embora tenha sido correto, o recuo na tentativa de radicalizar a interpretação da verticalização, semanas atrás. Agora temos um aparente desentendimento interno sobre a legalidade ou não dos aumentos concedidos pelo governo a servidores do Executivo, bem como do acordo que beneficia os do próprio Judiciário. O presidente do TSE, ministro Marco Aurélio, censurou o primeiro, concordou com o segundo e depois passou a considerar este também proibido pela lei. Outros ministros discordam. Ontem mesmo o ministro José Gerardo Grossi dizia que o TSE ainda não se pronunciou oficialmente sobre o assunto.

Em relação às regras da campanha propriamente dita, há dúvidas que precisam ser cabalmente respondidas. Principalmente sobre o significado de vagas expressões da recente lei, como os tais "eventos assemelhados", no artigo que trata de outdoors.

O comportamento do presidente-candidato está sendo debatido como não foi em 1998, e é bom que o seja. É recomendável que, numa eleição mais conflituosa como esta, o governo tome precauções, não se limitando a seguir a cartilha preparada pelo ex-presidente Fernando Henrique em 1998, com base no pouco que a emenda da reeleição e a legislação infra-constitucional dizia a respeito. No ambiente político envenenado de hoje, muito do que foi então admitido agora seria tido como delito eleitoral. Se a reeleição não acabar, o novo Congresso terá que providenciar uma regulamentação decente.

O que os ministros Tarso Genro (Relações Institucionais) e Márcio Thomaz Bastos (Justiça) buscam no encontro de hoje com o ministro Marco Aurélio é o aval da Justiça Eleitoral a um código de conduta que terá de ser mais rígido que o de FH, embora a lei seja imprecisa. Uma vacina contra as acusações de uso da máquina, que justas ou não, serão lançadas contra Lula. Enquanto ele não era oficialmente candidato, desfrutou ao máximo da possibilidade de se comunicar diretamente com o eleitorado em lançamentos e inaugurações. Mas esta fase acaba no dia 30, e dali em diante estará sujeito aos rigores da lei, à marcação dos adversários e também às ambivalências do TSE. É positivo que o tribunal endureça na fiscalização, tentando garantir o mínimo de eqüidade num pleito desequilibrado pela permissão da reeleição. Mas para isso é necessário que ele seja preciso, coerente e claro ao exarar suas instruções.