Título: O DESAFIO DE LULA
Autor:
Fonte: O Globo, 27/06/2006, Opinião, p. 6

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva formalizou na convenção do PT o que todos há tempos já sabiam - o lançamento da campanha para a reeleição - e apresentou uma plataforma de governo para o segundo mandato. Como previsto, o agora candidato irá à luta eleitoral com um discurso centrado na comparação entre esses últimos três anos e meio e o período dos dois mandatos anteriores, da era FH. Há margem para intensa discussão sobre a validade de certos confrontos de estatísticas e de fatos feitos por Lula no sábado, a serem repetidos e provavelmente ampliados no decorrer da campanha. Será grande o bate-boca em torno desse campeonato de eficiência.

O presidente repetiu, ainda, a desculpa de praxe dos petistas para o bombardeio da oposição por causa do mensalão. A palavra "calúnia" voltou a ser repetida como se o próprio Lula não houvesse pedido desculpas pelo escândalo e se declarado traído. Como não se pede perdão e se apontam traições por fatos inverídicos, os petistas já poderiam dispensar a opinião pública de ouvir essa cantilena. Não há justificativas que resistam ao resultado da CPI dos Correios e à denúncia encaminhada pela procuradoria Geral da República ao Supremo contra mensaleiros.

O candidato à reeleição destacou duas metas estratégicas para o eventual segundo mandato: melhorar a qualidade da educação e tornar mais eficientes os gastos públicos. De forma surpreendente Lula reconheceu que se o Estado continuar a desperdiçar dinheiro público a já escorchante carga tributária de 38% do PIB aumentará ainda mais. Surpreende porque para pôr em prática o que pregou na convenção o presidente terá de ir em sentido contrário ao rumo que tomou seu governo desde a queda do ministro Antonio Palocci e a ascensão de uma corrente petista pouco preocupada com a responsabilidade fiscal.

A expressão dessa mudança de eixo de poder tem sido a aceleração dos gastos de custeio, com aumentos temerários das despesas com o funcionalismo público engatilhados e um substancial reajuste do salário-mínimo, com impactos desestabilizadores na Previdência e, por decorrência, em toda a contabilidade pública. Inclui-se nessa conta a ampliação pouco cuidadosa dos gastos ditos sociais.

O candidato Lula lançou sério desafio para si mesmo.

Promessas de campanha forçam Lula a rever gastos públicos