Título: JUSTIÇA CRIA NOVOS ENTRAVES PARA COMPRA DA VARIG
Autor: Geralda Doca, Martha Beck e Erica Ribeiro
Fonte: O Globo, 27/06/2006, Economia, p. 23

TRF diz que Anac tem poder de polícia e pode exigir da Volo prova de capital nacional. Dinheiro de leilão seria da União

BRASÍLIA e RIO. Duas decisões judiciais anunciadas ontem impõem novas dificuldades à concretização da mais nova oferta de compra da Varig pela VarigLog. Uma delas, anunciada à noite pelo Tribunal Regional Federal (1ª região), atesta que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) tem "poder de polícia" e pode portanto exigir da Volo do Brasil documentos para comprovar a origem do capital e o patrimônio dos sócios, a fim de saber se 80% do capital da VarigLog, ex-subsidiária da Varig, estão nas mãos de brasileiros, como determina a lei. A outra, da 3ª Vara Federal de Execução Fiscal do Rio de Janeiro, diz que o dinheiro arrecadado em leilão de venda da Varig deverá pagar créditos tributários com a União.

Na madrugada de sábado, a Anac aprovou a venda da VarigLog para a Volo do Brasil e abriu caminho para a ex-subsidiária de transporte de cargas da Varig comprar a empresa aérea. Para dar o aval à operação, o Departamento Jurídico da Anac, com respaldo da Casa Civil, convenceu a diretoria colegiada da agência de que não cabia ao órgão regulador comprovar a origem do capital, mas apenas a divisão societária final.

Com o entendimento do TRF, o parecer da Anac sobre a venda da VarigLog para a Volo do Brasil pode ser questionado e servir, por exemplo, de argumento para o Sindicato Nacional das Empresas Aéreas (Snea), que alega ter pedido vista ao processo de análise da operação e não ter podido opinar sobre ele, diante da decisão da Anac de sábado.

Além disso, procuradores da Fazenda Nacional e do INSS obtiveram na Justiça do Rio liminar, em 14 de junho, determinando que os recursos pagos na compra da Varig sejam destinados à quitação de dívidas tributárias e previdenciárias da empresa com a União. Isso significa que a oferta de US$495 milhões (R$1,103 bilhão) feita pela VarigLog pode ser abocanhada pelo governo, a quem a Varig deve R$3,5 bilhões. Os recursos para o caixa operacional, que começaram a ser depositados pela VarigLog na conta da Varig, não são objeto da liminar.

Pela Nova Lei de Falências, as dívidas trabalhistas deveriam ter prioridade no acerto de contas da Varig com seus credores. Em seguida, viriam débitos com garantia real, feitos com bancos, por exemplo, e só depois os tributários. Mas o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, explicou que o juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara Empresarial, não exigiu que a empresa apresentasse certidão negativa de débitos (que garante que o contribuinte está em dia com as obrigações tributárias) antes de autorizar o plano de recuperação.

- Queremos que o dinheiro que está sendo depositado por conta do leilão seja usado preferencialmente para o pagamento de créditos tributários - disse Adams.

Ontem a Justiça do Rio deu prazo, até amanhã, para a VarigLog explicar com mais detalhes a proposta de compra da Varig. O pedido foi feito pelos advogados da Varig para que os credores e o administrador judicial tenham mais tempo para estudar a oferta. Segundo o administrador judicial da Varig Luiz Roberto Fiori, diretor da consultoria Deloitte, um dos pontos em discussão na proposta da VarigLog diz respeito à continuidade da antiga Varig, que, no plano de recuperação judicial aprovado pelos credores, fica com a dívida passada e continua em recuperação judicial. Fiori disse que a continuidade da Varig antiga é importante no processo e que a empresa, após o leilão, não poderá existir só no CNPJ.

Mesmo sem ter o aval da Justiça quanto à viabilidade de sua proposta, a direção da VarigLog emprestou ontem R$8 milhões à Varig para cobrir hoje despesas correntes, entre elas combustível e dívidas com empresas de leasing,. O valor foi garantido por um contrato de empréstimo e nota promissória emitida pela Varig. Segundo Fiori, a empresa poderá receber injeções diárias de recursos da VarigLog, para retomar vôos suspensos, até o limite de US$20 milhões, até a realização de um novo leilão. No domingo, fontes da Anac disseram que a VarigLog já tinha depositado US$20 milhões.

Empresa promete preservar empregos

Se amanhã a proposta for considerada viável pelos administradores e pela Justiça, será necessário antes avaliar se a oferta da VarigLog muda em algum ponto o plano de recuperação judicial aprovado pelos credores.

- Se a proposta da VarigLog alterar o plano de recuperação atual haverá nova assembléia de credores. É quase certo uma assembléia, a não ser que a VarigLog altere sua proposta para que fique em linha com o plano de recuperação atual. A tentativa de venda é uma decisão judicial. Esperamos que seja o mais breve possível - disse Fiori.

Pela proposta da VarigLog que consta dos autos do processo, a empresa oferece a sobrevivência da Varig antiga com preservação de ativos não-operacionais, participação de 5% da Varig antiga na nova Varig, mesmo percentual de participação oferecido aos empregados, além da preservação de empregos para a operação e admissão conforme o crescimento da companhia. Fiori afirmou que acredita agora em um desfecho favorável e bastante próximo.