Título: TODOS TÊM DIREITOS IGUAIS NA REPÚBLICA DEMOCRÁTICA¿
Autor: Demétrio Weber
Fonte: O Globo, 30/06/2006, O País, p. 13

A íntegra do manifesto contra diversos dispositivos do projeto de lei de cotas e do Estatuto da Igualdade Racial:

¿O princípio da igualdade política e jurídica dos cidadãos é um fundamento essencial da República e um dos alicerces sobre o qual repousa a Constituição brasileira. Este princípio encontra-se ameaçado de extinção por diversos dispositivos dos projetos de lei de Cotas (PL 73/1999) e do Estatuto da Igualdade Racial (PL 3.198/2000) que logo serão submetidos a uma decisão final no Congresso Nacional.

¿O projeto de lei de cotas torna compulsória a reserva de vagas para negros e indígenas nas instituições federais de ensino superior. O chamado Estatuto da Igualdade Racial implanta uma classificação racial oficial dos cidadãos brasileiros, estabelece cotas raciais no serviço público e cria privilégios nas relações comerciais com o poder público para empresas privadas que utilizem cotas raciais na contratação de funcionários. Se forem aprovados, a nação brasileira passará a definir os direitos das pessoas com base na tonalidade da sua pele, pela `raça¿. A história já condenou dolorosamente estas tentativas.

¿Os defensores desses projetos argumentam que as cotas raciais constituem política compensatória para amenizar as desigualdades sociais. O argumento é conhecido: temos um passado de escravidão que levou a população de origem africana a níveis de renda e condições de vida precárias. O preconceito e a discriminação contribuem para que esta situação pouco se altere. Em decorrência disso, haveria a necessidade de políticas sociais que compensassem os que foram prejudicados no passado, ou que herdaram situações desvantajosas. Essas políticas, ainda que reconhecidamente imperfeitas, se justificariam porque viriam a corrigir um mal maior.

¿Esta análise não é realista nem sustentável e tememos as possíveis conseqüências das cotas raciais. Transformam classificações estatísticas gerais (como as do IBGE) em identidades e direitos individuais contra o preceito da igualdade de todos perante a lei. A adoção de identidades raciais não deve ser imposta e regulada pelo Estado. Políticas dirigidas a grupos `raciais¿ estanques em nome da justiça social não eliminam o racismo e podem até produzir o efeito contrário, dando respaldo legal ao conceito de raça, e possibilitando o acirramento do conflito e da intolerância. A verdade amplamente reconhecida é que o principal caminho para o combate à exclusão social é a construção de serviços públicos universais de qualidade nos setores de educação, saúde e previdência, em especial a criação de empregos. Essas metas só poderão ser alcançadas pelo esforço comum de cidadãos de todos os tons de pele contra privilégios odiosos que limitam o alcance do princípio republicano da igualdade política e jurídica.

¿A invenção de raças oficiais tem tudo para semear esse perigoso tipo de racismo, como demonstram exemplos históricos e contemporâneos. E ainda bloquear o caminho para a resolução real dos problemas de desigualdades.

¿Qual Brasil queremos? Almejamos um Brasil no qual ninguém seja discriminado, de forma positiva ou negativa, pela sua cor, pelo seu sexo, sua vida íntima e sua religião; onde todos tenham acesso a todos os serviços públicos; que se valorize a diversidade como um processo vivaz e integrante do caminho de toda a humanidade para um futuro onde a palavra felicidade não seja um sonho. Enfim, que todos sejam valorizados pelo que são e pelo que conseguem fazer. Nosso sonho é o de Martin Luther King, que lutou para viver numa nação onde as pessoas não seriam avaliadas pela cor de sua pele, mas pela força de seu caráter.

¿Nos dirigimos ao Congresso Nacional, seus deputados e senadores, pedindo-lhes que recusem o PL 73/1999 (PL das Cotas) e o PL 3.198/2000 (PL do Estatuto da Igualdade Racial) em nome da República Democrática.

Rio de Janeiro, 30 de maio de 2006¿

Adel Daher Filho - sindicalista / Adilson Mariano - vereador / Alberto Aggio - professor / Alberto de Mello e Souza - professor / Almir da Silva Lima - jornalista / Amandio Gomes - professor / André Campos - professor / André Côrtes de Oliveira - professor / Ana Teresa Venancio - antropóloga / Anna Veronica Mautner - psicanalista / Antonio Carlos Jucá de Sampaio - professor / Antonio Cícero - poeta / Antonio Marques Cardoso (Ferreirinha) - operário / Aurélio Carlos Marques de Moura / Bernardo Kocher - professor / Bernardo Sorj - professor / Bila Sorj - professora / Bolivar Lamounier - cientista político / Cacilda da Silva Machado - professora / Caetano Veloso - compositor / Carlos Costa Ribeiro - professor / Claudia Travassos - pesquisadora / Cláudia Wasserman - professora / Celia Maria Marinho de Azevedo - historiadora / Célia Tavares - professora / Cyro Borges Jr. - professor / Darcy Fontoura de Almeida - professor / Demétrio Magnoli - sociólogo / Dilene Nascimento - historiadora / Domingos de Leers Guimaraens - artista visual / Dominichi Miranda de Sá - pesquisadora / Egberto Gaspar de Moura - professor / Elvira Carvajal - professora / Eunice R. Durham - professora / Fabiano Gontijo - professor / Fernanda Martins - pesquisadora / Fernando Roberto de Freitas Almeida - professor / Ferreira Gullar - poeta / Francisco Martinho - professor / George de Cerqueira Leite Zarur - professor / Gilberto Hochman - cientista político / Gilberto Velho - professor / Gilda Portugal - professora / Gilson Schwartz - economista / Giselda Brito - professora / Gláucia Villas Boas - professora / Guita Debert - professora / Helena Lewin - professora / Hercidia Mara Facuri Coelho - pró-reitora / Hugo Rogélio Suppo - professor / Icléia Thiesen -professora / Isabel Lustosa - historiadora / João Amado - professor / João Leão Sattamini Netto - economista / John Michael Norvell - professor / José Augusto Drummond - cientista político / José Carlos Miranda - movimento negro / José Roberto Ferreira Militão - advogado / José Roberto Pinto de Góes - professor / Josué Pereira da Silva - professor / Kátia Maciel / Kenneth Rochel de Camargo Jr. - professor / Laiana Lannes de Oliveira - professora / Lena Lavinas - professora / Lilia Moritz Schwarcz - professora/ Lucia Lippi Oliveira - socióloga / Lúcia Schmidt - professora / Luciana da Cunha Oliveira - professora / Luiz Alphonsus de Guimaraens - artista plástico / Luiz Fernando Almeida Pereira - professor / Luiz Fernando Dias Duarte - professor / Luiz Werneck Vianna - professor / Madel T. Luz - professora / Magali Romero Sá - historiadora / Manolo Florentino - professor / Marcos Chor Maio - sociólogo / Maria Alice Resende de Carvalho - socióloga / Maria Conceição Pinto de Góes / Maria Hermínia Tavares de Almeida - professora / Maria Sylvia de Carvalho Franco - professora / Mariza Peirano - professora / Mirian Goldenberg - professora / Moacyr Góes - diretor de cinema e teatro / Mônica Grin - professora / Monique Franco - professora / Nisia Trindade Lima - socióloga / Oliveiros S. Ferreira - professor / Paulo Kramer - professor / Peter Fry - professor / Priscilla Mouta Marques - professora / Ronaldo Vainfas - professor / Renata da Costa Vaz - sindicalista / Renato Lessa - professor / Ricardo Ventura Santos - professor / Rita de Cássia Fazzi - professora / Roberto Romano - professor / Roney Cytrynowicz - historiador / Roque Ferreira - sindicalista / Serge Goulart -diretório nacional do PT / Sergio Danilo Pena - professor / Silvana Santiago - historiadora / Silvia Figueiroa - historiadora / Simon Schwartzman - sociólogo / Ubiratan Iorio - professor / Uliana Dias Campos Ferlim - professora / Vicente Palermo / Wanderley Guilherme dos Santos - cientista político / Yvonne Maggie - professora / Zelito Vianna - cineasta.