Título: SINAIS DE VIDA
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 01/07/2006, O País, p. 4
O crescimento da candidatura do tucano Geraldo Alckmin nas pesquisas eleitorais do Datafolha e do Vox Populi dá credibilidade à tese de que quanto mais conhecido pelo eleitorado, mais sua situação melhorará. O que parecia uma desculpa para postergar a crise política que se formava enquanto Alckmin patinava na casa dos 20% das preferências, sem dar mostras de que teria fôlego para se confrontar com Lula, agora passa a ser verdade científica, o que dará fôlego e sossego para os responsáveis por sua campanha trabalharem sem grandes pressões políticas até o começo da propaganda eleitoral gratuita no radio e na televisão em 15 de agosto.
O fato é que o candidato ¿Geraldo¿ parece ser um personagem midiático de grande penetração no gosto do eleitor médio, mesmo que o político Geraldo Alckmin pareça insosso no contato pessoal. Como a campanha eleitoral que há muito tempo se pratica no país é dominada pela imagem, é nesse campo que vai ser disputada a preferência do eleitor.
O ¿Lulinha Paz e Amor¿ nasceu dessa constatação do marqueteiro Duda Mendonça, que aparou a barba do operário Lula e, para seu grande deleite, tirou-o do macacão de fábrica para os ternos Armani, amenizando sua imagem rude e transformando-o na opção do eleitorado que buscava uma mudança no quadro politico.
Hoje, a situação de Lula é inversa: ele representa o ¿status quo¿, e une contra si todos os que continuam querendo uma mudança. Mas, mantendo a política econômica que tanto combatia, Lula tirou da agenda a possibilidade de mudanças radicais, que ele prometia e não cumpriu.
Essa ruptura hoje faz parte da plataforma de candidatos ligados a siglas mais alternativas, como era o PT antes de chegar ao poder. A principal delas é o PSOL, saído da costela petista e que tem na senadora Heloísa Helena uma candidata a presidente com capacidade de determinar os rumos dessa eleição.
Acho difícil que ela chegue ao segundo turno, como afirmou depois de ver confirmado nas pesquisas um índice de cerca de 6%, que pode chegar a dois dígitos no Sul do país. Mas a senadora certamente crescerá durante a campanha, no papel de mulher batalhadora que se insurge contra a hipocrisia na política, uma ex-insider cujas denúncias ganham força exatamente por essa condição.
Diante de um candidato à reeleição que está literalmente dividindo o país entre ricos e pobres, entre o sul-maravilha e o nordeste, a tarefa do candidato ¿Geraldo¿ é mostrar que tem mais capacidade administrativa que Lula, mas não desdenhará dos pobres, que Lula quer sob sua reserva de mercado com os programas sociais acelerados em pleno ano eleitoral.
Não é à toa que a propaganda que apresentou formalmente ao eleitorado nacional insistiu não apenas na sua infância pobre, mas sobretudo no fato de ser médico. Nas comunidades mais pobres, nos grotões do país, o médico que se dedica aos pobres acaba um politico bem aceito.
A pesquisa Datafolha mostra bem que a disputa está polarizada entre eleitores de classes sociais, de escolaridades diferentes e, sobretudo, por regiões. Lula tem 52% das intenções de voto entre os eleitores com apenas o ensino fundamental, e Alckmin fica com 23%. Mas entre os com ensino superior, o tucano vence por 42% a 31%.
O petista dá um banho de 54% a 20% entre eleitores das classes D e E, enquanto nas classes A e B Alckmin ganha apertado, de 39% a 34%. Os analistas da coligação PSDB/PFL acreditam que, com o decorrer da campanha, com Lula apelando para o populismo e Alckmin se mostrando competitivo, essa diferença a favor do tucano aumentará. O maior problema de Alckmin está realmente no nordeste, onde Lula o vence por 64% a 17%.
Além de ter que ampliar sua vantagem no Sul, onde vence por 37% a 30%, Alckmin terá que reduzir a desvantagem que tem no Nordeste, e para isso será fundamental a atuação de líderes regionais como o presidente do PSDB, Tasso Jereissati, no Ceará, Antonio Carlos Magalhães, do PFL, na Bahia, os pernambucanos do PFL e do PMDB unidos, e Heráclito Fortes (PFL) no Piauí. Com o crescimento de sua candidatura, é previsível que essas lideranças nordestinas se empenhem mais, reduzindo a diferença a favor de Lula.
Outra mudança a favor de Alckmin é o empenho do presidente Lula em atrapalhar a candidatura de dois tucanos até agora favoritos incontestáveis: José Serra em São Paulo e Aécio Neves em Minas. Pelo menos no caso de Minas, a adesão do PMDB à candidatura do PT, estimulada pessoalmente por Lula, é um rompimento da trégua política que governador e presidente vinham mantendo.
Havia um acordo não declarado em torno da candidatura de Aécio Neves, uma espécie de conformismo oficial com a inevitabilidade de sua reeleição, que dava ao governo, em troca, uma ponte com a oposição.
Mas a adesão de Lula à candidatura do ex-governador Newton Cardoso ao Senado, desbancando o candidato de Aécio, o ex-presidente Itamar Franco, certamente colocará essas duas importantes lideranças mineiras na campanha de Alckmin, quando estavam claramente neutros, ou a favor de Lula.
Também em São Paulo a entrada em cena de Orestes Quércia para disputar o governo do estado a pedido do presidente Lula mostra para Serra que não é bom negócio para ele se omitir na campanha presidencial.
As pesquisas mostram que apesar de Lula continuar podendo vencer no primeiro turno, essa possibilidade está bastante reduzida: ele tem 54% dos votos válidos, apenas três pontos percentuais acima do mínimo necessário. A redução dos votos nulos e em branco de 11% para 7%, o aumento dos que ainda não sabem de 7% para 9% e o potencial de crescimento de candidatos como Heloísa Helena e Cristovam Buarque, indicam tendências que levam a disputa para o segundo turno.