Título: Mais protegidos
Autor: Miriam Leitao
Fonte: O Globo, 01/07/2006, Economia, p. 22

A reunião do Fed esta semana produziu, num primeiro momento, um clima de alívio. Mesmo os que acham que os juros continuarão subindo nos Estados Unidos, não confiam mais em cenário de altas que cheguem a 6% de juros. A instabilidade ainda não acabou, mas já se pode constatar que o Brasil passou melhor que outros países pelas semanas de turbulência. Esta semana teve até uma melhora na classificação de risco, enquanto a Turquia fazia seu segundo aumento de taxa de juros desde que a crise começou.

A Turquia não chegou a ser rebaixada, mas a Standard & Poor¿s piorou a perspectiva de sua classificação de risco. Mudou de positiva para estável. Eles estão um degrau piores que a gente.

¿ As agências estão preocupadas com o caso específico da Turquia mas, felizmente, hoje parece que não há mais tanta preocupação com o contágio para os outros países. Isso fica claro quando o rating do Brasil melhora e o da Turquia piora na mesma semana ¿ comenta o economista Ricardo Amorim, do WestLB.

Um documento do Bradesco enviado a seus clientes esta semana afirma que o mercado está diferenciando os países. Melhor para nós. Em outros momentos, quando o mundo entrava em crise, era normal que problemas num país acabassem piorando as condições nos outros. Crise num país emergente significa um investidor mais cauteloso. Porém, os números recentes mostram que o mercado está passando a olhar caso a caso quando se trata desse tipo de país.

O fato de o Brasil ter feito ajuste na conta corrente, de ter melhorado seus números externos, tem ajudado muito no momento. Ainda assim, os analistas do Bradesco ressaltam que ¿o Brasil, por ter mercados líquidos, acaba sendo mesmo uma porta de saída para investidores interessados em reduzir sua exposição a essa classe de ativos¿. Ou seja, às vezes os números brasileiros pioram não por aumento do pessimismo, mas pela liquidez dos ativos brasileiros. O banco acredita que, depois de passado o primeiro momento de susto, os investidores começam a fazer uma seleção mais criteriosa para separar o joio do trigo, preservando os países com melhores fundamentos.

O primeiro gráfico abaixo, por exemplo, mostra a variação do risco desde o início da crise (usando a média de abril) até seu ponto máximo em cada país. O risco-país da Turquia deu um salto de 78,8%, o da África do Sul também subiu muito: 59,9%. O Brasil, que costumava sofrer bastante em épocas de volatilidade, piorou menos, por causa dos fundamentos mais sólidos, sustenta o Departamento Econômico do Bradesco.

A Turquia e a África do Sul são dois países que estão com números muito ruins nas suas contas. A previsão do FMI para o déficit em conta corrente é de que chegue a 4,8% do PIB este ano, para o caso da África do Sul, e a 6,9% de déficit na Turquia. O dólar, que subiu um pouco no Brasil neste começo do ano, chegou a disparar na Turquia e a moeda precisou ser defendida pelo Banco Central com duas altas de juros e venda de moeda americana no mercado. A África do Sul também subiu os juros. Enquanto isso, por aqui, eles caíram e a expectativa é de que continuem caindo.

O déficit em conta corrente tem deixado mais voláteis também as moedas dos países, como é possível ver no outro gráfico. Quando um país tem superávit em conta corrente, é menos atingido. Porém, o Bradesco chama a atenção para o fato de que, na bolsa, não houve diferenciação entre os mercados. O Brasil sofreu o mesmo que outros países com piores indicadores.

Ontem, as bolsas voltaram a ficar mais instáveis depois de uma quinta-feira muito boa. Passado o primeiro momento de otimismo, começou a cair a ficha de que o Fed não afastou o risco de novas altas de juros por lá em agosto. Há dois anos, no fim de junho de 2004, quando eles subiram pela primeira vez, o mercado dizia que seriam 18 altas nos juros. A de ontem foi a 17ª. Se estiverem certos...